terça-feira, 10 de julho de 2012

Autobiografia na Música - Boca do Céu - Capítulo 11 - Por Luiz Domingues

Em 1977, a cidade de São Paulo fervilhava com shows. Essa dinâmica vinha desde antes, pois em 1976, houvera várias maratonas de Rock que prosseguiram em 1977, por exemplo.

Foi em alguma noite de maio de 1977, cujo dia correto não recordo-me, que eu; Wilton Rentero e Laert Sarrumor fomos ao Tuca (Teatro da Universidade Católica - PUC), para assistirmos um show dos Novos Baianos. O show foi eletrizante do primeiro ao último segundo, como era a praxe daquela banda sensacional.
Na primeira parte, eles tocavam os temas mais acústicos com ritmos brasileiros e na segunda parte, ficava só a sessão elétrica no palco, a que chamavam de "A Cor do Som". Era como se fosse uma banda dentro da outra, mas logo a seguir, o ex-baixista dos Novos Baianos, Dadi, tratou de usar o nome para fundar uma outra banda com o mesmo nome e a história todo mundo conhece. Nessa hora, a veia Rocker deles explodia, literalmente, pois Pepeu; Jorginho e Didi, os três irmãos, simplesmente destruíam seus instrumentos para humilhar rockers radicais, que desdenhavam dos Novos Baianos por conta do preconceito pelo fato deles não serem cem por cento Rock'n Roll (supostamente), e ter esse lado brasileiro bem acentuado.


Lembro que o Wilton conseguiu a palheta do Pepeu na última música, e o quanto ficou eufórico por tal conquista. Aí o Laert Sarrumor tinha que ir embora, e eu e Wilton Rentero resolvemos ludibriar os seguranças do teatro, e tentar assim ficarmos para assistir a sessão maldita, gratuitamente. Naquela época, eram comuns as sessões duplas de shows de Rock, com o primeiro show às 21:00 h, e a segunda sessão à meia-noite, daí a alcunha: "Sessão Maldita". Conseguimos burlar a segurança, subir ao palco, e ao fingirmos estarmos a pedir autógrafos dos componentes dos Novos Baianos, aguardamos uma oportunidade e quando apareceu uma brecha, entramos coxia adentro, e escondemo-nos nos camarins do Tuca.
Foi uma experiência lúdica, pois o Paulinho Boca de Cantor e a Baby Consuelo ao invés de ficarem bravos com a nossa invasão, solidarizaram-se e acobertaram-nos, ao deixar-nos no camarim, sob a instrução de voltarmos à plateia, assim que o show da meia-noite estivesse para começar. Lembro da Baby a brincar conosco, daquele seu jeito despachado, quando disse alguma coisa do tipo : -"Olha os dois malucos aí, estão assustados... relaxa aí, bicho, pode ficar aí numa boa, e assistir a sessão maldita..."

Estávamos de fato assustados por estarmos a burlar a segurança do teatro, mas muito mais, na verdade, emocionados por estarmos nos camarins dos Novos Baianos, vendo-os pessoalmente em um momento pós-show, e a preparar-se para o segundo show; a movimentação dos roadies e técnicos a realizar reparos, e checar o equipamento etc. Aquilo foi por demais lúdico para dois garotos sonhadores com apenas de 17 anos de idade. Então, pouco antes de abrir-se as portas para o público da sessão maldita, um roadie conduziu-nos à platéia, e assistimos novamente aquele petardo chamado, "Novos Baianos"... 

Na saída, por volta das duas horas da manhã, não tínhamos outra alternativa a não ser descer a Rua Monte Alegre, até a Av. General Olímpio da Silveira, e esperar um ônibus para a zona leste, onde eu iria para o bairro do Tatuapé, e ele, Wilton Rentero, para Engenheiro Goulart, adiante da Penha. Mas não éramos somente nós... haviam nesse comboio, pelo menos cerca de cem freaks que tinham o mesmo objetivo. Chegamos ao ponto, enquanto esperávamos a linha Penha / Lapa, eis que surge um pequeno comboio formado por viaturas da polícia militar. Com a truculência que era-lhes peculiar naqueles tempos de ditadura, chegaram a enquadrar todo mundo. Fomos revistados; humilhados e os que portavam drogas, apanharam muito. E naqueles tempos de AI-5, eles poderiam mesmo fazer isso a seu bel-prazer. O sargentão parecia alucinado, e queria colocar todo mundo dentro de um ônibus e prender. Mas por uma sorte inesperada, resolveu enquadrar só os que portavam drogas (ao meu lado, havia um hippie desconhecido e que estava com pelo menos trinta comprimidos de “Mandrix” em sua bolsa, a tratar-se de uma droga popular na época).



Então, após um sermão moralista de ultra direita, a exortar-nos a tomar cuidado; cortar o cabelo; e pensarmos em "Deus; família, e Brasil", deixou-nos em paz, finalmente. Foi uma experiência que durou uns trinta minutos, mas que pareceu-nos horas...

Continua...

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