domingo, 28 de dezembro de 2014

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 219 - Por Luiz Domingues


O que criamos como a configurar as intervenções nos shows, foi apenas três performances. Na entrada do show, uma locução em "off" ; no meio do show, uma atuação com atores a interagir com a banda; e na parte final, uma performance do poeta, Julio Revoredo, mais uma vez disfarçado, com uma caracterização enigmática.  A intervenção do meio, mostra-se parecida com a que usáramos em 1984. A diferença, foi que ao invés de uma simulação de perseguição de um estranho refugiado na bateria do Zé Luiz, a ideia seria desta feita, simular um sequestro relâmpago.

Atores entrariam com certa contundência, munidos com armas de brinquedo, e "sequestrariam" o vocalista Fran Alves, para que pudéssemos tocar o número instrumental, "18 Horas", sem a sua presença no palco. A participação do Julio Revoredo também seria simples.

Seria em torno de apenas uma entrada em cena, durante a execução de uma música, onde ele andaria pelo palco, sem maiores explicações ao público, e sairia, de forma inusitada ao manter-se incólume. Apenas uma intervenção para confundir o público, e assim usar um pouco do conceito do Teatro do Absurdo, nada demais, mas sempre passível em criar-se um frisson extra na plateia. 

Desde o final de agosto, estávamos a trabalhar forte no quesito divulgação do disco, simultaneamente aos preparativos do show de lançamento do novo disco. Em 28 de agosto de 1985, participamos ao vivo do programa :"Panorama", uma revista cultural muito boa, produzida pela TV Cultura de São Paulo. 
Participar do "Panorama", era naquela época uma meta cobiçada por qualquer artista, pois representava um sinal de "status" aparecer nesse programa, e certamente rendia bons frutos ao participante. A nossa participação foi realizada a tocar ao vivo, com direito a uma micro entrevista. Chegamos cedo aos estúdios da TV Cultura, e passamos o som dignamente. Apesar de termos escolhido para uma das músicas, um tema bem pesado ("Segredos"), conseguimos tocar com razoável conforto, ao considerar-se a contenção de volume que foi solicitada dentro de um estúdio de TV. A outra canção, seria "Um Minuto Além", definitivamente a eleita como mais conveniente para apresentações na TV, doravante, ao pensarmos no novo álbum que lançávamos naquele momento. Então, quando o programa entrou no ar, esperamos o sinal dos técnicos, e tocamos "Segredos", com muita energia.

Quando encerramos, a apresentadora / entrevistadora, Paula Dip, foi muito simpática para conosco, mas infelizmente estava mal preparada pela sua produção, pois não tinha perguntas pertinentes em sua ficha, para formular-nos. Ao desejar ser descontraída, insistiu em perguntar-nos sobre sermos ou não, "metaleiros", e ao exagerar em gesticular-nos o famigerado gesto do "malocchio", aquele ridículo sinal manual a insinuar chifres, mediante a sua origem medieval, achou que agradar-nos-ia com aquela sinalização. Eu mesmo respondi, com simpatia, é claro, mas neguei que tivéssemos relação com aquela cultura metálica.

Disse-lhe que éramos uma banda de Rock, e as nossas letras evocavam ideais humanistas, com teor social em tese, mas ela insistiu naquela caricatura, ao tecer comentários sobre o comprimento de nossas respectivas cabeleiras, nossas roupas etc. Enfim, falamos sobre o novo álbum, e um pouco sobre a Baratos Afins, onde o Rubens enalteceu o Luiz Calanca pelos seus esforços em prol do Rock etc. Quando a conversa encerrou-se, fomos convidados a tocar o segundo número, mas o tempo da TV urgia, e pelo monitor, vimos que mal a música havia saído da sua introdução, e os caracteres do programa já estavam a subir, ao denotar que o programa estava a encerrar-se. Questão de segundos, vimos que saiu do ar, e assim paramos de tocar, naturalmente.

No cômputo geral, apesar das queixas que teci acima, foi uma ótima apresentação. Ao analisar o vídeo, na atualidade (2014), acho que a banda estava muito afiada.



O Link acima direciona para o vídeo citado, no You Tube


Certamente que a canção : "Segredos" não foi nem de longe uma música minimamente adequada a conter um apelo Pop, e que justificasse portanto, a sua execução na TV, mas naquele momento, em torno da perspectiva em querermos mostrar as músicas novas do novo disco, descartávamos normalmente, "Crisis (Maya)", por ser instrumental, portanto, qualquer uma das outras cinco opções, estaria disponível, em tese.

Logo notamos que no ambiente avesso ao Rock que era a TV, a escolha natural sempre recairia sobre, "Um Minuto Além", mas na possibilidade em exibir-se mais de uma, todas as outras quatro opções, eram pesadas em demasia.  Dessa forma, tocar uma música como, "Segredos" no programa "Panorama", foi natural para nós, mas ao enxergar tal estratégia hoje em dia, foi muito paradoxal que na entrevista, a banda colocasse-se como uma banda palatável para o público em geral, quando na verdade, é claro que não o  era, e aquela pauleira toda, mais assustava e estigmatizava-nos, do que oferecia-nos dividendos. Outro paradoxo foi em termos buscado o caminho do peso, mas ao mesmo tempo, negar a conexão com o Heavy-Metal em voga. Essa confusão de identidade também ajudou a confundir o público, certamente  Falo isso com toda a isenção, e a usar de sinceridade, no alto da experiência adquirida, nos dias atuais. Mais uma razão para repensar o rumo da banda na época, e de fato, estávamos com um disco recém lançado, mas tínhamos dúvidas sobre o (mau) passo dado...

Mais compromissos de TV estavam agendados para os próximos dias...


Continua...

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