sábado, 2 de agosto de 2014

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 156 - Por Luiz Domingues


O passeio sugerido foi o de subirmos ao Pão de Açúcar... apesar de ser um passeio trivial para turistas, foi bastante divertido para todos, menos Chico Dias, que pareceu ter entrado em um processo ainda mais intenso em termos de profunda contrariedade. 

Nada o demovia de seu mau humor crônico, e de fato, a oportunidade de estar no Rio; ter tocado em um evento onde estivemos relacionados aos maiores nomes do Rock da ocasião, e em uma casa de shows badalada como era o Circo Voador, pareceu não ter sensibilizado-o. Portanto, passear no dia seguinte pelo Rio, é que não o seduziria, mas infelizmente não tivemos essa percepção naquele momento. 

Para quem conhece bem o Rio, ou pelo menos já fez esse passeio, sabe que faz parte da estratégia de consumo, para arrancar dinheiro de turistas, uma artimanha quase secreta, que é praxe ali no bondinho do Pão de Açúcar. Assim que desce-se do bondinho, já lá naquela altura enorme, as pessoas geralmente estão à mercê do torpor mental, misto de medo pela subida e êxtase pela paisagem inacreditável. Então, nem percebem, mas são amplamente fotografadas. Alguns minutos depois, vendedores abordam-lhes, com pratos de porcelana em mãos, onde o destaque é a sua foto pregada neles, como adorno... 

Normalmente as pessoas são clicadas com aquela expressão facial de estupefação de turistas incautos, e encantam-se com tal "lembrancinha" do passeio, ao pagar uma pequena fortuna pela quinquilharia. O Chico Dias estava com uma expressão de tédio, indisfarçável na foto, e que simbolizava bem o seu estado de espírito na ocasião. Claro que não compramos as nossas respectivas fotos cotadas nos pratos, a peso de ouro, e com a malandragem local a achar que éramos argentinos pelo tamanho de nossos respectivos cabelos, mas hoje em dia, claro que eu gostaria de tê-las para publicar aqui nos capítulos da minha autobiografia...

Bem, com a tarde a findar-se, resolvemos voltar para São Paulo, enfim. Já no trajeto dos ônibus urbanos que usamos nessa tarde inteira, o Chico Dias aproveitou para "dormir" (literalmente), durante o percurso, a demonstrar o seu completo desinteresse pelo passeio. Hoje para a minha compreensão, fica claro que ele estava totalmente arrependido por ter entrado na banda; mudado-se para São Paulo, e nenhum progresso da banda, que era claro para todos, parecia seduzi-lo. Depois do traumático evento vivido por ele e a sua namorada, uma semana antes desse show no Rio de Janeiro, parece que o seu pouco comprometimento com a banda, tratou por zerar a cota... 

Ainda não percebíamos que tratava-se de um processo irreversível, portanto tínhamos esperanças de que ele realinhasse-se, e que aquele momento seria passageiro. Assim foi o nosso final de semana no Rio, em outubro de 1984.

Mas nossa agenda estava em expansão, e já no dia 23, uma terça-feira, tínhamos um compromisso firmado de última hora, e que foi muito interessante, a ser realizado em São Paulo. Ao contrário daquela semana terrível em que descrevi o show da danceteria Tífon, e a saga de Chico Dias e a sua namorada, este novo final de semana no Rio, começou bem, com contatos na sexta-feira, com direito a muitas histórias pitorescas que vivemos dentro do turbilhão do BR-Rock oitentista; passou pelo nosso bom show, apesar da chuva, e encerrou-se em um esforço coletivo para promover uma terapia ocupacional para o Chico Dias, infelizmente, infrutífera. O show ocorreu no dia 20 de outubro de 1984, um sábado chuvoso no Rio de Janeiro. Cerca de quatrocentos pessoas estiveram presentes (parece bom, mas para o tamanho do Circo Voador, foi realmente pouca gente...).


Continua... 

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