quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 188 - Por Luiz Domingues


Em relação à sessão de fotos que citei no capítulo anterior, na verdade, essa sessão foi um desdobramento de outra sessão feita dias antes. Explico : de fato, o Luiz Calanca havia providenciado uma sessão de fotos promocionais para a divulgação do novo disco. Mandou-nos então para um estúdio fotográfico localizado no bairro das Perdizes, na zona oeste de São Paulo. 

O nome do fotógrafo, era Tirteu, e recordo-me que a sessão fora tranquila, com bastante liberdade para a banda opinar etc. 

Entretanto, por uma infelicidade estética qualquer, as fotos ficaram um tanto quanto lúgubres. Não foi falha técnica, pois o fotógrafo era profissional, a dispor de grandes máquinas, e equipamento de iluminação adequado, fundo infinito etc. Mas o Luiz não aprovou as fotos e ao prever problemas quando as enviasse para jornais e revistas, em anexo ao material de divulgação do disco, temeu pela não publicação, e assim prejudicar os nossos interesses em comum. 
Particularmente, considero as fotos dessa sessão, boas, a conter climas interessantes. São de fato um tanto quanto "carrancudas", porém o som d'A Chave do Sol nessa época, principalmente ao considerar-se o repertório do novo disco, de fato evocara uma certa aura sombria. Não havia muito cabimento em que fossem coloridas (de fato, a sessão foi toda realizada em preto e branco), com semblantes descontraídos e sorrisos abertos da pare dos componentes da banda. Entretanto, o Luiz foi o produtor geral do disco e a sua palavra teve peso definitivo no veto. 

Desta forma, ele convocou uma nova sessão, desta feita com essa fotógrafa que eu também citei anteriormente, cujo estúdio localizava-se no bairro do Paraíso, zona sul de São Paulo. Para início de conversa, o estúdio dela era totalmente improvisado, sem a estrutura profissional que o estúdio anterior oferecia. Apesar de ser uma pessoa amável, e que  recebeu-nos muito bem, demonstrou não ter noção do que faria conosco, como estratégia de enquadramentos. Pior ainda, no afã em ser agradável para conosco,  ligou o som, e colocou "Rock", para entrarmos no clima, e assi prover que nós soltássemo-nos nas posturas faciais e corporais, no entanto, "Rock" no conceito dela, ou seja, dessa forma constituiu-se de um festival com sons tenebrosos, oriundos de bandas da cena estética do  Pós-Punk, que ela julgou que gostávamos, por ser a última moda na casa noturna "Madame Satã", ou similares. Aquele mal estar instaurou-se, até que o Zé Luiz tomou a dianteira e  pediu-lhe educadamente para desligar o som, pois considerara que relaxaríamos mais, ao fotografarmos no silêncio. Infelizmente, a sessão estava desconfortável, tanto pela ausência de um fundo infinito minimamente condizente com o espaço de enquadramento, quanto na inabilidade dela para dirigir a sessão. Então, incomodada pela ineficácia da sessão, que estava proeminente, ela sugeriu externas. Aquela decisão de sua parte, já irritou-me pessoalmente, pois detesto sessão de fotos em externas, normalmente.

E para piorar o panorama, estávamos sem uma ambientação interessante que justificasse uma sessão externa. Se ao menos estivéssemos alocados em um tremendo lugar charmoso, e que corroborasse tal esforço, mas simplesmente sair-se à rua, e tirar fotos a caminhar na calçada de uma via normal de bairro, com residências; comércio; placas de trânsito, e semáforos, o que acrescentaria ? Abordagem urbana ? Poxa, nesse caso, existem incontáveis lugares mais significativos em São Paulo para tal mote, do que uma rua residencial normal do bairro do Paraíso. Bem, a verdade é que ela estava perdida, e essa ideia de sair à rua deve ter sido a melhor solução que teve para tentar salvar a sessão... 

Então, tiramos algumas fotos sentados em uma garagem aberta que existia na sua residência, que mais pareceu um banco de reservas de estádio de futebol. Para piorar as coisas, ela sugeriu alguns clicks em um terreno baldio do outro lado da rua. Tratou-se de um terreno baldio, onde recentemente uma série de casas haviam sido demolidas, para dar lugar a um prédio residencial. Então, ela teve a proeza em irritar-me duplamente, pois além de detestar externas, eu odeio ainda mais fotos tiradas em ambientes decadentes; sob escombros; ruínas; sujeira; devastação, etc.

Sob protesto, lá estou eu em tais fotos, a usar um terno de cetim ultra setentista, a brilhar sob o sol das onze da manhã de um dia de abril de 1985, e a pisar em um entulho asqueroso e barrento, amontoado, e a espera de uma caçamba de lixo, naturalmente.... tudo a ver com o espírito do Rock, não é mesmo ? Infelizmente, acho essas fotos horríveis, mas elas ilustraram várias matérias, e algumas foram reaproveitadas pelo Luiz, quando ele lançou o álbum na versão em CD, no início dos anos 2000. Bem, não demos sorte nessas duas sessões de fotos, mas ainda acho a primeira sessão (feita em abril), apesar de lúgubre, muito melhor, e algumas fotos dessa sessão também foram publicadas em alguns veículos. 

Tirante tudo isso, acho que faltou direção visual para a banda, no quesito figurino, principalmente. Em relação à primeira sessão, como ocorreu em um dia de temperatura mais baixa, usamos roupas casuais do cotidiano, porém mais pesadas, condizentes com o frio do dia. Sendo assim, acho que apesar da casualidade informal geral, vestimo-nos melhor nessa sessão, com blazer, casacões de lã etc. Um pecado cometido foi a troca de acessórios entre nós, típico amadorismo de quem não é do ramo fotográfico, e nem preocupa-se com um detalhe : se mais de uma foto for publicada na imprensa, corre-se o risco daquele acessório compartilhado, ser visto a ser usado por mais de um componente da banda, e assim denotar amadorismo, ou no mínimo, uma caráter prosaico no trato da imagem, enquanto artista. 

Então, cometemos esse deslize, pois existem fotos publicadas com o Rubens a usar um chapéu acrescido de uma echarpe de seda, mas em outras, eu mesmo o uso, e existe também fotos com o Fran Alves, com o dito cujo em sua cabeça. No caso da segunda sessão, combinamos em levar figurino de show. Todavia, esbarramos em conceitos não bem delineados nessa aspecto, pois o Zé Luiz, de última hora, achou interessante fotografar sem camisa, apesar de estar a usar uma calça vermelha de curvim, bem condizente com a indumentária de bandas de Heavy-Metal oitentistas. Eu, Luiz com aquele terno de cetim ultra setentista, como se fosse tocar com o Humble Pie em 1973, e o Fran também a insistir em deixar-se fotografar sem camisa. Ora, faltou um direcionamento que buscasse uma maior linearidade, pois daquele jeito, pareceu que éramos convidados de uma festa a fantasia, e com cada a apresentar um personagem distinto.

Esse tipo de disparidade visual em uma sessão de fotos já arruinaria a sessão por si só, mas para piorar, a fotógrafa não tinha estrutura, e demonstrava falta de criatividade total para lidar conosco. Em suma... fotos promocionais que havíamos feito com um fotógrafo de bairro, sem nenhuma experiência em torno de uma perspectiva a abranger o conceito do mundo artístico, em 1984, foram muito melhores...

Bem, não foi só esse erro que cometemos em relação à parte visual desse disco novo. Quando falar mais da capa, esmiuçarei um pouco mais esse assunto, que redundou em frustração, infelizmente.



Continua...

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