terça-feira, 1 de outubro de 2013

Autobiografia na Música - Língua de Trapo - Capítulo 56 - Por Luiz Domingues


E diante daquela agenda frenética, não havia nem tempo para absorver uma perda, como tivéramos com o Fernando. Dois dias depois, e já estávamos novamente no palco do Teatro da Fundação Getúlio Vargas, para reiniciar a temporada com duas semanas naquele espaço. Foi no dia 1° de dezembro de 1983, uma quinta-feira. O público foi diminuto, mas nem abalamo-nos, pois sabíamos que nos dias subsequentes, tal panorama mudaria, naturalmente. Apenas cinquenta pessoas compareceram.
 
E o Paulo Elias, acumulou algumas funções do Fernando Marconi, como ator também, pois além de músico, o Fernando possuía um lado performático importante nas encenações. Já no dia seguinte, cento e vinte pessoas pagaram ingresso para assistir-nos em uma sexta-feira, ao comprovar a nossa expectativa em torno do aumento progressivo dessa marca, e convenhamos, em pouco mais de quinze dias, havíamos cumprido dezessete shows, fator que só artistas popularescos, como as duplas sertanejas realizam hoje em dia, e talvez nem mesmo tais artistas populares.

No sábado, tivemos um evento extra no período da tarde. Tratou-se de um show ao vivo, a ser realizado em uma praça pública, localizada na Vila Califórnia, zona leste de São Paulo. Para quem não conhece a cidade de São Paulo, explico que fica próxima a bairros como : Vila Alpina; Parque São Lucas e Vila Ema, bairros tradicionais que cercam-na. Nesse show, produção da prefeitura de São Paulo, tivemos apoio logístico; um equipamento digno e esse contato gratuito (o cachet foi pago pela prefeitura, logicamente) com um tipo de público não acostumado a assistir-nos em teatros, foi muito gratificante. Lembro-me que foi a primeira vez em que ouvi a expressão : "Show de Choque", que servia exatamente para designar um tipo de apresentação daquele porte, onde não há condições para realizar-se o soundcheck, e o tempo é limitado. Com isso, o artista executa um repertório curto, e de preferência com músicas mais agitadas, para causar uma impressão impactante, a aproveitar o pouco espaço que tem para mostrar o trabalho. Dessa forma, ao buscar um impacto rápido e contundente, estimula o público que mal o conhece, a desejar conhecê-lo, e com isso, angariar possíveis novos fãs que o seguirão em shows completos, pelos teatros. Fora isso, o prazer em tocar para um público carente de opções culturais, é muito gratificante. Mesmo por não conhecer o seu trabalho, dá para ver no semblante das pessoas, o deslumbramento por esse contato impensável normalmente, para eles, que ficam excluídos da cultura cara que pratica-se neste país, por diversos motivos, mas não desviarei o foco da narrativa para falar disso. Esse show ocorreu na tarde de 3 de dezembro de 1983, na Praça da Paz,  perante um público com cerca de trezentas pessoas aproximadamente. Foi um sucesso e o público respondeu com entusiasmo excessivo até, pois foi difícil voltarmos ao ônibus que a prefeitura viabilizou-nos para o transporte na ida e na volta, e os seguranças tiveram um trabalho bom para ajudar-nos nesse deslocamento do palco até o carro. Dentro do ônibus, o Pituco e o Laert fizeram uma brincadeira com os fãs, que cercavam-nos a caçar autógrafos, ao deixá-los confusos, pois não perceberam ser uma performance, e diante do semblante atônito deles, nós da banda ficamos à mercê de uma crise de riso, que durou muito tempo, e ainda rendeu muita risada no camarim da GV, na mesma noite. E sim, fizemos o show noturno no teatro, normalmente, com bom público a marcar a presença de quatrocentas e cinquenta pagantes, e no dia seguinte, o domingo, encerramos a temporada na GV, com cerca de quatrocentos pagantes. Aliás, como o Laert falava nos shows : -"não vendemos ingressos ! Trocamos ingressos do show por dinheiro, o que é bem diferente"...
Continua...

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