quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Autobiografia na Música - Pedra - Capítulo 174 - Por Luiz Domingues

Passado o ótimo show ocorrido no Sesc Belenzinho, nós tivemos logo a seguir uma entrevista para um Blog com muitos acessos, mas completamente fora da nossa realidade. 
Foi o seguinte tal situação: Através de uma rede social chamada "LinkedIn", eu fui abordado por uma garota bem jovem que ao verificar as minhas postagens regulares por ali, apresentou-se como dona de um Blog sobre música, centrado mais no Pop-Rock daquela atualidade, a enfocar a carreira de bandas jovens e algumas, muito jovens, por sinal e espectro natural dessa mocinha. 
Portanto, sob uma primeira avaliação, eu não avaliei ser conveniente para nós, mas ela foi muito simpática na abordagem e propôs inicialmente uma entrevista individual comigo. Como essa entrevista comigo repercutiu bem, a render inclusive, muito mais comentários do que as postagens regulares sobre bandas "teenagers" que ela costumava enfocar, ficou mais confortável para o Pedra ser retratado em seu espaço.
Quando eu abordei os meus colegas, eles demonstraram um nítido ceticismo, ao notarem que o Blog, apesar de apresentar um bonito lay-out, era conduzido por uma menina tão jovem. Tive que pressioná-los para responderem o questionário, pois ficara clara a desmotivação da parte deles (honra seja feita, com exceção do Rodrigo que foi rápido e solícito para responder). 
Esse tipo de postura chateava-me, pois desde os primórdios da minha carreira, eu sempre atendi bem qualquer interlocutor, ao não importar-me se fosse um jornalista a representar um órgão mainstream de primeira grandeza ou um garoto imberbe e responsável por um fanzine com lay-out manuscrito e reproduzido em cópias xerox de má qualidade de impressão. 
Mas não é todo mundo que pensa sim e talvez isso explique o motivo pelo qual eu representei o Pedra em entrevistas concedidas para órgãos pequenos, inclusive programas muito precários de TV de Internet e a minha postura foi sempre igual, como se estivesse em um talk-show da Rede Globo, a ser assistido por cem milhões de pessoas. 
Por fim, consegui reunir as respostas dos rapazes e a entrevista foi publicada no Blog Maah Music, um Blog jovem, sim, mas bem intencionado e conduzido pela Marina, uma garota novinha que adora música e tem os seus leitores & seguidores.

Eis o Link para ler tal entrevista:
http://estilloetendencias.blogspot.com.br/2013/02/entrevista-exclusividade-com-banda-pedra.html#comment-form 

E para piorar a situação, o micro embalo que tivemos no final de 2012 e pareceu estar a confirmar-se no início de 2013, após o show do Sesc Belenzinho, esteve a se esvair na realidade, quando novamente deparamo-nos com falta de perspectivas imediatas a seguir. 
Foi mais um período tenso a iniciar-se, infelizmente no interno da banda, até que uma luz apareceu no fim do túnel, quando um produtor chamado: Helton Ribeiro, tradicionalmente focado no mundo do Blues & Jazz, enviou-nos um convite para tocarmos em uma das mais tradicionais casas de shows voltados para esse universo, de São Paulo, chamada: "Bourbon Street". 
Tal casa costumava há muitos anos, apresentar artistas internacionais dessa seara, mais do Blues, é bem verdade, e ali, até o super star, B.B. King, já havia apresentado-se e se não me engano, mais de uma vez.
O Helton era editor de uma revista chamada: “Blues'n Jazz” e uma vez por mês, realizava uma festa da revista nessa casa, geralmente a programar duas atrações para prover uma jornada dupla, mas nos últimos tempos ele estava a adotar uma estratégia diferente, ao abrir espaço também para bandas de Rock, pois segundo ele mesmo afirmara, o seu projeto estava desgastado, mesmo dentro de uma casa focada nesse universo e dessa forma, a expansão para outros espectros artísticos foi uma tentativa de oxigenar a sua celebração mensal. 
Tudo bem, já que foi assim, aceitamos tocar, mesmo ao sabermos que o Bourbon Street não era exatamente uma casa adequada para uma apresentação nossa, em tese. 
Ficamos contentes por saber que teríamos uma ótima companhia na jornada dupla, com os amigos do The Suman Brothers Band, uma banda sensacional e formada por pessoas da melhor qualidade. E ainda por cima, o grande Diogo Oliveira havia recém entrado na formação dessa banda, para torná-la ainda mais encorpada e criativa. Portanto, tocar com essa banda amiga e excelente, musicalmente a falar, seria ótimo, é claro. 
No dia do show, nós levamos o nosso backline quase completo e não teria sido necessário na medida em que a casa possuía um bom equipamento para disponibilizar. 
Essa foi uma questão que estava a cansar-me na banda, pois não obstante o fato de achar corretíssimo o artista apresentar-se sempre da melhor maneira possível, por outro lado, não mensurava-se na prática o quanto os sacrifícios inúteis que essa predisposição causava-nos. 
Portanto, na minha ótica, a política de sempre mobilizar um exército para cada apresentação, a envolver utilizar um backline exagerado e equipe técnica com profissionais a serem pagos, sufocava-nos, diante da escassez de oportunidades de agenda e sobretudo pelos cachês tímidos que recebíamos, geralmente, que não suportavam a carga de uma despesa que não cabia para uma banda não alojada no mainstream e que gerasse auto sustentação mínima. 
Mesmo ao considerar que profissionais de alto gabarito como Wagner Molina e Renato Sprada, acostumados a ganharem cachês de um patamar de artistas mainstream, não importavam-se em trabalhar em nosso favor, com cachês reduzidos e eventualmente até gratuitamente, nós não sentíamo-nos bem em não oferecer-lhes nada, mas mesmo a se pensar em porções modestas, para nós pesava no nosso parco orçamento. 
Bem, análise gerencial a parte, chegamos ao Bourbon Street e o problema para se providenciar vaga de estacionamento já causou-nos o cansaço emocional típico de ter que levar backline pesado em carros particulares. 
Uma vez lá dentro da casa, fomos bem recebidos pelos dois técnicos fixos do estabelecimento, mas o restante dos funcionários pareceram não ter muita predisposição para serem solícitos. 
Arrumamos o palco e quando Sprada & Molina chegaram, ambos tiveram algumas dificuldades para lidar com os respectivos técnicos da casa, que não estavam muito acostumados a lidarem com artistas que levavam os seus técnicos próprios. Mas ultra experientes, ambos, foram a relevar o clima não favorável e assim fizemos o soundcheck.
Eu conhecia o gerente geral da casa, um rapaz sensacional chamado: Pietro Buccaran, que eu conhecera por meio de uma situação não musical, pois nós dois interagíamos em uma ação de voluntariado para uma instituição e lá, como haviam pessoas de diversas camadas sociais e profissões, quando ele viu-me cabeludo, logo deduziu que eu tinha alguma relação com a música e então apresentou-se a dizer ser o gerente do Bourbon Street e estar acostumado a lidar com shows de Blues e Jazz, mas também Rock'n' Roll. 
Nesse ínterim, eu já havia falado com ele sobre o trabalho do Pedra e d'Os Kurandeiros e até ofertado-lhe material das duas bandas, mas ele explicou-me que não cuidava da parte artística, mas sim da gerência geral e que poderia apenas falar com o diretor artístico da casa. 
O tempo passou e através de uma terceira persona foi que conseguimos uma colocação para essa casa, mas Pietro disse-me que seria bom e abriria a porta para outras oportunidades ali, fora da festa da Revista Blues’n Jazz. 
Após o soundcheck, Pietro e a sua esposa Claudyana, que também era funcionária da casa (e eu a conhecia do Instituto que frequentávamos, também), chegaram e convidaram-nos a jantar. 
A casa foi a lotar e ficamos a observar a movimentação. Muitos fãs do Pedra, além de parentes e amigos dos componentes estavam a chegarem, mas o grande grosso desse público, foi formado pelo público habitue da casa e a faixa etária se mostrou alta. 
Particularmente eu fiquei em dúvida se esse tipo de público maduro, mais a caminhar para a terceira idade e apreciadores de Jazz & Blues, interessar-se-ia pela nossa música autoral e longe de seu espectro natural de predileções. Eu já havia enfrentado plateias inadequadas na minha carreira, muitas vezes em trabalhos anteriores, portanto isso não assustava-me, mas por outro lado, fiquei com esse questionamento interno, sobre a eficácia de se fazer esse show, como estratégia por captação de simpatia de um público novo e normalmente desinteressado em um universo em que vivíamos e como agravante, ao termos a questão do sacrifício logístico e monetário para montar um palco com backline próprio, além de levar equipe própria. 
Chegou a hora e a casa estava bem cheia, algo surpreendente para uma quarta-feira, mas segundo apuramos, dentro da normalidade do estabelecimento. Saímos à rua para ver esse movimento e quando tentamos voltar pela entrada de serviço da cozinha da casa, que dava acesso ao camarim, fomos impedidos pelo segurança e tivemos que enfrentar a longa fila da entrada principal. 
Ali, pudemos constatar que a casa adotava um procedimento antipático de cadastrar os seus clientes. Sei que tal metodologia adotada por algumas casas noturnas minimiza eventuais calotes a que são submetidas, mas pelo ponto de vista do cliente, ser obrigado a enfrentar um interrogatório e a fornecer dados pessoais, realmente irrita quem quer apenas entrar em uma casa noturna para assistir um show musical, jantar e conversar com os amigos, portanto, não sei dimensionar o que foi pior: a longa espera para chegarmos até a atendente ou o interrogatório. Acredito que o conjunto da obra foi abominável.
Começou o show do The Suman Brothers Band e o Victor Suman pediu para usar o meu Rickenbacker, que eu emprestei na hora, naturalmente, amigo que ele é. 
Eu já havia visto a banda em ação como trio, quando o trio interagira com Os Kurandeiros em um show em conjunto que fizéramos em 2012 e havia ficado impressionado com a sua categoria. 
Versados no Blues,; Rock'n' Roll, R'n'B, Soul Music, Folk e mais uma série de influências boas, a banda era super azeitada ao vivo. Agora como quarteto, a contar com Diogo Oliveira agregado como o segundo guitarrista da banda, a se configurar como um super reforço, a banda ficara ainda melhor, mais encorpada e com uma força expressiva incrível. Gostei muito do show deles, ao assistir pela coxia minúscula ali existente, que dava acesso ao camarim. 
Pedra em ação no Bourbon Street de São Paulo, no dia 17 de abril de 2013. Fotos: Grace Lagôa
Chegou a nossa vez e nós começamos o nosso show com muita energia, a parecer estarmos na mesma forma dos shows anteriores. 
Mas logo nas primeiras músicas, começamos a receber recados do produtor do show, para abaixarmos o volume, pois o gerente da casa, estava incomodado. Não referia-se ao Pietro, pois este por ser um conhecido meu, tenho certeza de que ele mesmo teria aparecido na coxia para fazer a solicitação pessoalmente. 
Deve ter sido uma reclamação do diretor artístico da casa. Os recados continuaram, mesmo depois de termos abaixado os amplificadores e pedido pelo microfone ao Renato Sprada, para amenizar a pressão do PA. 
Apesar de reduzirmos o volume, os pedidos prosseguiram e foram a aumentar no seu tom e nessa escalada, foram a ganhar uma aura de irritação, como se nós estivéssemos a fazer pirraça infantojuvenil em não atender os seus apelos, mas pelo contrário, nós havíamos reduzido o volume para um patamar que já estava quase desagradável para nós em cima do palco, a prejudicar a nossa performance.  
Pedra no Bourbon Street em 2013. Primeira foto de Grace Lagôa e segunda, de Bolívia & Cátia 
E foram a ficarem mais tensas as solicitações, pois chegara-se em um ponto em que já houveram ameaças explícitas do tipo: -"vocês nunca mais tocarão aqui" e outras bravatas destemperadas. 
Quanto a "nunca mais tocar ali", isso não preocupava-me nem um pouco, pois desde o início eu achara inadequado o Pedra apresentar-se em uma casa noturna com orientação temática bem longe da nossa realidade. Eu só ficaria chateado pelo amigo Pietro que era (é) extremamente gentil e certamente ficaria constrangido pela confusão e animosidade gerada. 
Todavia, tal situação culminou em não ocorrer, pois um ano depois, nós fomos convidados novamente e desta feita o show aconteceria de forma muito mais amena. 
Enfim, após o término do espetáculo e mesmo com essa tensão, houve um bom contingente de pessoas que estiveram ali para ver o Pedra, pois aplausos e gritos de pedido de bis ocorreram e até um coro de: "Pedra, Pedra” foi entoado, talvez a irritar o neurastênico senhor que pressionara o Helton a pressionar-nos por conseguinte.                    
Pedra no Bourbon Street em São Paulo, 17 de abril de 2013. Foto: Grace Lagôa
Como última ocorrência dessa noite, houve uma desavença terrível com os seguranças e funcionários da limpeza e copa & cozinha que pressionaram-nos com muita truculência para desmontarmos logo o nosso equipamento e o levarmos para os nossos carros. 
Destrataram o Ivan Scaterzini, que reagiu e um clima de quase briga instaurou-se ali. Tentei achar o Pietro para intervir, mas os ânimos acalmaram-se e nós conseguimos tirar as nossas coisas e abandonarmos a casa. 
Uma senhora, funcionária da casa que cuidava do camarim, portara-se de uma forma extremamente arrogante e assim desrespeitou-nos com falas grosseiras e descabidas. 
Ao elaborar um "raio x" da situação e por ter um razoável conhecimento de como funcionam casas noturnas em geral, esteve claro ali que tais funcionários estavam nervosos e apreensivos para que saíssemos o quanto antes do estabelecimento a fim de encerrarem o expediente e dessa forma, serem dispensados para voltarem imediatamente para as suas respectivas residências. 
Entendo a questão de estarem cansados e sobretudo pelo fato de serem trabalhadores humildes e que fatalmente ao morarem em bairros distantes da periferia, ficavam desesperados pela perspectiva de perderem a última condução da madrugada. 
Até solidarizo-me com eles, pela vida dura que tem, porém em contrapartida, nada, eu disse nada, justificou o fato de terem destratado-nos daquela forma. Se fossem mais perspicazes e não a raciocinarem como trogloditas, teriam oferecido ajuda para agilizar o processo. 
No caso dos seguranças, homens fortes que eram, teriam ajudado muito, mas a musculatura dessas pessoas era inversamente proporcional à sua massa encefálica, portanto, preferiram intimidar-nos pela força, a nos causar medo e não a usá-lo em solidariedade. 
Enfim, foi o ápice para uma noite de aborrecimentos múltiplos.
Dia 17 de abril de 2013, no Bourbon Street em São Paulo, com cerca de duzentas pessoas na plateia.
Aqui, um vídeo com a apresentação no Bourbon Street que eu descrevi. Filmado pelo famoso casal Bolívia & Cátia, dois fotógrafos e film-makers famosos por retratarem inúmeros shows em São Paulo. Eis o Link para assistir no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=b0KOkn-G4uM 

Tal acontecimento levava-nos de volta ao clássico questionamento: valia a pena tocar em lugares inadequados?

Continua...

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