sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Autobiografia na Música - Pedra - Capítulo 175 - Por Luiz Domingues

Luiz Domingues em ação com o Pedra no Bourbon Street de São Paulo em 2013. Foto: Bolívia & Cátia

Depois do show do Bourbon Street, as atenções voltaram-se para gravarmos uma nova safra de canções, finalmente, e finalizar enfim o disco cuja gravação fora iniciada em 2009 e interrompida em 2011. 
Mas antes disso, uma nova solicitação de entrevista para um Blog de Rock surgiu. Tratou-se do Blog Rock Imortal, gerido pelo mesmo editor do Blog Planet Polêmica, em que eu era colaborador desde 2011. Tal boa entrevista, ainda que bem curta, saiu publicada em maio de 2013, portanto, um pouco antes da banda entrar em estúdio para finalizar a gravação do disco empacado.
Eis o Link para lê-la:
http://rockimortal.blogspot.com.br/2013/05/entrevista-com-banda-pedra_8.html
               Pedra no Bourbon Street em 2013. Foto: Grace Lagôa
Foi no mês de junho que o Xando mobilizou-se para abrir uma brecha no seu estúdio em relação aos clientes que usavam-no e assim ele reservou algumas datas para nós podermos realizar esse esforço de gravação. Nessa altura, tínhamos muitas músicas novas para gravar e sob um dado instante, chegou-se a cogitar o lançamento de um álbum duplo, tamanha a quantidade de músicas compostas e a maioria delas já arranjadas e prontas para gravar. 
Da parte do Xando, ele queria aproveitar algumas que compusera no hiato que o Pedra teve em 2011. Uma chamava-se: "Furos nos Sapatos", um Hard-Rock bastante vigoroso e que segundo dizia-nos, a sua letra continha um grande significado pessoal para ele. 
Sinceramente, eu nunca soube a razão por esse apreço especial em relação a essa letra, mas o próprio Ivan confirmou-me isso várias vezes, embora nunca contaram-me a real motivação disso. 
Portanto, deixo o convite ao ouvinte, que use a sua imaginação para tentar buscar a razão disso ou aguardemos que o Xando venha a público um dia e esclareça essa questão. 
Uma outra música que ele demonstrava ter muito apreço pessoal, chamava-se: "Queimarás no Inferno". Gostei de ouvir a gravação que ele fizera com Ivan e Marcião Gonçalves a comandar o baixo, em 2011. Mas claro que quando começamos a ensaiar, eu criei a minha própria linha. 
Acho até que a linha de baixo do Marcião é melhor que a minha, mas não teria cabimento subtrair-lhe as suas ideias, portanto, quando a gravei, coloquei a minha identidade, aliás, foi o mesmo caso de "Furos nos Sapatos", que ele também havia gravado antes, provavelmente como material da banda que fundaram, o “Mulad Trem”. 
Agora que o Pedra havia voltado à ativa, o Xando quis reaproveitar tais canções para o nosso trabalho e de fato, elas continham um potencial e muita qualidade para encaixarem-se na nossa obra.
Acima, a versão solo de Xando Zupo para "Queimarás no Inferno", lançada em 2016 
Eis o link para ouvir tal música no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=wSuBJZ-ffcw

Todavia, "Queimarás no Inferno" foi descartada na época, e recentemente (2016), o Xando a lançou em caráter solo, com Ivan Scartezini na bateria e agora a acrescentar-se convidados especiais, caso do saxofonista superb, André Knobl, o histórico Rocker, Norton Lagôa no baixo, e Fernando Janson no vocal. 
Havia uma terceira música nessas mesmas condições, mas o Xando, após alguns ensaios, a suprimiu do repertório, ao alegando ter dúvida de que ela contivesse uma paridade igual às demais do Pedra.  
"Não há Nenhuma Paz", canção descartada para o repertório do Pedra, mas que o Xando lançou em caráter de carreira solo em 2016.
Eis o link para escutar essa música no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=VqtgxO6xI9I
De fato, se trata de uma canção híbrida, a se assemelhar a um Hard-Rock acelerado, quase no limiar do Heavy-Metal e que em sua parte "C", mudava completamente. Justamente essa parte era a que eu mais gostava, por ser bastante próxima do R'n'B sessentista, portanto, haveria de abrir um campo excepcional para o baixo “swingar" fortemente com o meu lado "Motown" a impelir-me para esse desfecho. 
Uma pena, portanto, que ele tenha resolvido descartá-la, pelo aspecto musical, pois pelo teor da letra, essa, e a anterior que eu citei "Queimarás no Inferno, também, são absolutamente antagônicas aos meus ideais pessoais pelo aspecto da temática de suas letras.
As duas canções que ele lançou agora em 2016, são ótimas, super bem tocadas e arranjadas, com excepcionais participações e áudio exemplar. Posso até afirmar que as aprecio e é verdade, pelo aspecto meramente musical, mas o teor das letras, a mentalidade expressa, e até o título de ambas, em caráter explícito a afirmar com todas as letras a expectativa de vida sob o ângulo do desolador colapso humano, desagradam-me frontalmente, portanto, ao pensar por esse prisma, ainda bem que não entraram no disco do Pedra e eu não esteja envolvido com tais mensagens desagradáveis para o meu gosto.
Haviam duas canções que foram oriundas da safra de 2009/2010, mas que apesar de bastante ensaiadas, não foram gravadas na época, portanto a ficarem engavetadas. Uma chamava-se: "Segunda-Feira", e a outra, "Luz da Nova Canção". 
Essa "Segunda-Feira" parece um R'n'B mais modernoso, anos noventa para frente, e detém muito do estilo do “Jamiroquai”. Eu gostava de tocá-la, pelo sabor funkeado que possuía. 
E "Luz da Nova Canção", que eu reputo ser uma das mais belas canções que o Rodrigo já compôs na sua carreira e considere-se que ao comparar com o que ele fez para o Sidharta, Patrulha do Espaço e para o próprio Pedra, realmente é inacreditável a qualidade de sua criação. 
Uma balada fortemente influenciada pelo R'n'B cinquenta/sessentista, com toque “Beatle” acentuado, trata-se de uma canção que emociona e se fosse composta por Ray Charles, teria sido muito natural, também.
Rodrigo não só compôs uma pequena obra-prima, como a arranjou nos "conformes" das tradições vintage, portanto, teve tudo para ser uma das melhores faixas do disco e ao vivo, já estava incorporada no set list dos shows, desde a volta da banda em 2012, a arrancar elogios rasgados das pessoas. 
A letra é do parceiro e amigo, Cezar de Mercês, que brindou-nos com uma poesia à altura da canção. Gosto muito das imagens inspiradas dessa letra e a frase de onde extraiu-se o título da música, é, ao meu ver, muito inspiradora: "Luz da Nova Canção". Chega a ser profético, para quem liga-se em esoterismo.
               Luiz Domingues & Rodrigo Hid nos idos de 1996
Outra canção que demorou para decidirmos gravar, foi "Abstrato Concreto". Essa música tem uma longa história. 
Quando o projeto do Sidharta começou a avançar, ainda em 1997, tal canção foi a primeira que surgiu no esforço para dar início ao trabalho de criação dessa banda. Foi uma canção que eu compus ao violão, ao levá-la à apreciação dos colegas, para as primeiras reuniões de criação. 
Começamos a ensaiá-la em uma primeira abordagem que eu a imaginara, com forte influência de Soul Music sessentista. Tanto foi assim, que antes de ganhar letra e deter um título oficial, ela foi apelidada entre nós como: "Jackson Five", a fazer alusão ao estilo dessa grande banda negra norte-americana. 
Nós a ensaiamos assim por alguns meses, mas ao percebermos que não estava cem por cento da maneira que a desejávamos, nós radicalizamos, ao fazermos uma mudança drástica na sua estrutura.
 O Rodrigo acrescentou uma cadência harmônica antes inexistente e sugeriu que usássemos uma letra escrita pelo seu pai, Tufi Hid, nos idos de 1974, chamada: "Abstrato Concreto". 
            Rodrigo & Tufi Hid: Talento que passa de pai para filho
Apreciamos as mudanças e a letra, a estabelecer um jogo de palavras muito interessante e de certa forma a evocar a loucura como percepção, ou seja, foi algo muito a ver com os anos setenta e encaixara-se como uma luva para o nosso projeto que buscava fortemente os signos retrô para o trabalho dessa banda. 
Com tais mudanças, a música ficou a parecer muito mais com o estilo dos Beatles, doravante, a se tornar muito bonita. 
O Sidharta fundiu-se à Patrulha do Espaço, mas no momento crucial, das vinte e duas músicas que levamos conosco para serem aproveitadas pela Patrulha do Espaço, dez ficaram de fora dos planos iniciais, e essa foi uma delas. 
Foi quando da volta do Pedra em 2012, que o Rodrigo sugeriu a incorporação dessa canção que era nossa em parceria e a contar com a letra do seu pai. Eu aceitei a ideia na hora. 
O Rodrigo fez uma terceira modificação na sua concepção e ela ficou muito parecida com o trabalho d'O Terço, que agradou-me muito e aos demais também, sob uma primeira impressão. 
Mas o tempo foi a passar e o Xando esboçou mudar de ideia. Aquela feição Prog-Rock que a canção ganhara, incomodava-o e quando ela já estava para ser descartada, o Rodrigo teve um novo lampejo de criatividade e começou a improvisar um piano ultra R'n'B sessentista, mediante um balanço incrível e daí surgiu o formato de “Abstrato Concreto” como foi gravada, enfim, e que tem o estilo do Joe Cocker, e se ele, Cocker, a tivesse conhecido, fatalmente a incluiria nos seus discos do final dos anos sessenta/início dos setenta, creio eu. 
A se parecer uma canção do LP ”Mad Dogs and the English Men", só faltou mesmo a voz do Cocker a conduzi-la, com aquela rouquidão e dramaticidade, à beira de um ataque epilético.
Outra canção que o Rodrigo mostrou-nos, pareceu-nos um Blues-Rock sob uma primeira instância. Nós a arranjamos nesses termos, mas com o decorrer dos ensaios, uma parte "C" foi incorporada e aquele “looping” criado ficou tão impressionantemente progressivo e esotérico, que tornou-se um som a relembrar o “Yes”. Tornou-se belíssima, e recebeu o nome de: "Siga o Sol".
A mudar o rumo da narrativa, digo que quisera eu ter arrumado para o Pedra uma entrevista no Programa do Jô Soares, ou no Altas Horas do Serginho Groisman, em plena Rede Globo. Isso foi tentado, aliás, quando eu consegui o apoio da produtora musical, Cida Ayres, a minha velha amiga dos tempos do Língua de Trapo, em ação empreendida em 2010, mas que não redundou em sucesso, infelizmente, e nem assim eu fiquei com ressentimento da Cida que eu sei que esforçou-se para ajudar e eu sei que não teve culpa alguma pelo fracasso na tentativa. E se não logramos êxito, não seria o caso de apontar "culpados". 
Portanto, se nos últimos tempos eu só arrumara uma entrevista na rádio CBN e entrevistas em Blogs de pouca expressão midiática, dei o meu máximo ali, não por preguiça, mas pelo fato de esbarrar em barreiras intransponíveis naquela altura dos acontecimentos. 
A contrapartida mais realista e que nunca entrara na pauta do dia, seria o caso do Pedra adaptar-se à uma nova situação e encarar o mundo mais obscuro da música profissional, mas a banda abriria mão de a cada show transportar de forma penosa um backline exagerado, como se fosse apresentar-se no Festival Rock in Rio?
Abriria mão de não contratar roadies, e assim enfrentar a simplicidade dos seus próprios músicos carregarem e montarem os seus equipamentos? Aceitaria tocar em bares com palquinhos minúsculos e sem estrutura de som e iluminação adequadas? Poderia cumprir  shows onde estivesse sem técnicos de alto padrão como Carneiro, Sprada & Molina? 
Abriria mão de contratar equipes de filmagem para todo show? Em suma, houveram inúmeros aspectos que amarraram o Pedra e mudanças profundas deveriam terem sido cogitadas ao meu ver, mas nada disso veio à baila e sobrou apenas a insatisfação pelos resultados pífios que essa banda gerava, diametralmente opostos à sua qualidade artística. E essa avaliação não era justa na minha visão. 
Diante desse quadro pesado de insatisfação, sem perspectivas de shows em vista, a se gerar uma gravação de disco emperrada e a avançar dessa forma sobre os ombros de um componente apenas, Zupo, tal responsabilidade de dirigir a gravação, o clima interno observado ao final de 2013 foi muito semelhante ao do período de 2010, que culminou com o fim da banda em 2011 e assim confirmara a minha suspeita de que a perspectiva de uma volta sob expectativa mais amena, foi mera retórica, pois ao se chegar no gargalo estrutural dessa banda, a velha tensão voltaria. 
A diferença foi que nesse instante eu não enxergava mais como a banda poderia sobreviver artisticamente, visto que essa tensão estava a sobrepujar a criação, ao contrário de 2010, momento em que eu considerei que a obra superaria as insatisfações pessoais. 
E por perder a minha tenacidade, que sem dúvida alguma foi o combustível vital da minha carreira, desde 1976 e da qual orgulhava-me muito, um sinal amarelo se acendeu, lastimavelmente. 
Assim encerrou-se o ano de 2013, com tensão no ar e isso só não estava a minar-me mais intensamente, pois a minha vida estava dividida naquele instante e nos outros trabalhos que eu mantinha em paralelo, o clima se mostrava bem amistoso e com alegrias, portanto, a tensão no Pedra não detinha carga total sobre minha vida naquele instante. 
Infelizmente, aquele impasse estava a massacrar o Xando, que só mantinha o Pedra na sua vida naquele instante e eu lamento muito isso pelo aspecto humano e também a considerar que a despeito de ninguém merecer isso, eu acrescento que muito menos o Xando, pela boa pessoa que ele é. Nesse aspecto, eu solidarizava-me com ele, embora não concordasse com a visão forjada sobre tal diagnóstico mau avaliado da situação.
Rodrigo detinha um outro tema progressivo à disposição, este também muito bom, mas que desdobrava-se em uma canção Pop, o que foi inusitado. 
Tal ideia da parte dele foi uma que ele desejou ter gravado em um disco solo que planejara lançar em 2004, assim que deixou a Patrulha do Espaço, mas como ele entrou no Pedra logo a seguir, tal projeto engavetou-se. 
Foi objeto de muitas discussões, pois o Xando oferecia enorme resistência para gravá-la, ao alegar que apesar de teoricamente não fosse contra temas progressivos, por outro lado o achava inviável comercialmente, em pleno 2013, ao se conceber tal peça cheia de partes e enorme em sua metragem, com uma introdução cheia de virtuosismos. 
Ao raciocinar como um produtor de gravadora major, ele teve razão, mas como o que fazíamos ali era arte e não produto de consumo para colocar na gôndola de um supermercado, eu e Rodrigo, principalmente insistimos em incluí-la no álbum. Todavia, apesar das resistências inerentes, ela culminou em ser gravada, embora tenha sido descartada assim quando o álbum virtual foi lançado, infelizmente. 
Chico Teixeira, um bom artista folk, a atuar como compositor, cantor e instrumentista
Outra canção que o Rodrigo tinha em mãos e na verdade estava gravada desde 2010, chamava-se: "A Cara da Gente". Tratava-se de uma canção com forte apelo Folk e marca Beatle acentuada. 
Eu gostava da canção, do arranjo e da linha de baixo que eu criei. Mas houve uma forte rejeição de um companheiro, desde que a canção fora gravada em 2010. O Rodrigo a apreciava muito e a letra fora escrita pelo seu amigo, Chico Teixeira, filho do compositor Renato Teixeira. 
O Xando não gostava da letra e também não apreciava a canção. No quesito das letras, o Xando adotava postura de mão de ferro e ao se basear em tais avaliações que estabelecia, se não passasse em cem por cento do seu crivo e entenda-se isso não como um critério literário, mas muito mais por uma questão de linguagem, baseada em seus signos oitentistas, onde as referências mais recorrentes de seu imaginário eram Lobão e Cazuza, dificilmente ele aceitava letras vindas de outros membros, onde não identificasse tais similaridades com o seu espectro de entendimento, emoção e meio de expressão. 
E no caso dessa letra do Chico Teixeira, ele não a aceitara e portanto, a sua intenção foi clara de não incluí-la de forma alguma no álbum e somente pela insistência do Rodrigo que a bancava e com o meu apoio, ela foi a permanecer até que na guilhotina final, fosse descartada.
Foi o mesmo caso de uma canção gravada também em 2010 e que ficara ótima, a se revelar como um Hard-Rock "zeppelineano", cheio de climas, com muito órgão Hammond, a se parecer uma peça do álbum Led Zeppelin III, pronta para explodir. 
Tratou-se de uma canção composta pelo próprio Xando e seu arranjo ficara ótimo e a gravação, idem. Mas ele tentara escrever uma letra para fechá-la e pelo menos cinco tentativas redundaram em fracasso, com ele mesmo a descartá-las. 
Eu sou escritor, mas não sou poeta, embora já tenha escrito letras para trabalhos anteriores, inclusive gravados oficialmente, caso de discos d'A Chave do Sol e da Patrulha do Espaço. A minha predileção é por escrever crônicas, resenhas & matérias de cunho jornalístico, eminentemente, mas ao observar que tal música corria o risco de ser descartada pela falta de uma letra, eu pedi uma gravação da canção e mediante a melodia entoada pelo Rodrigo, escrevi uma letra para ela. 
Tal canção passou a chamar-se: "Ultrapasso" e detinha um forte apelo libertário, a questionar as convenções da sociedade, mas sem ficar piegas e/ou panfletária, na minha ótica. Lembrava-me de certa forma o mesmo teor da música: "Homem Carbono" da Patrulha do Espaço, pelo caráter de libelo, mas creio ter ficado imune à pieguice, assim como "Homem Carbono". Infelizmente essa também foi descartada pelo colega, que alegou não ter gostado da interpretação do Rodrigo quando este gravou a voz oficial. 
Espero que um dia se reconsidere e que seja lançada no futuro, pois trata-se de uma bela canção e não merece morrer engavetada. Mesmo que se descarte a voz do Rodrigo, também a minha letra e esta seja lançada com uma outra versão.  
Houveram também muitas vinhetas, que sinalizavam ideias a serem desenvolvidas como músicas, igualmente. Com o tempo a passar, chegamos à conclusão de que tais vinhetas poderiam serem gravadas nesse formato mesmo. 
Uma delas, parece um Country-Rock/Folk, bem no estilo sulista (ao referir-me aos Estados Unidos da América, que fique claro), da Sheryl Crow, com forte apelo Pop também. 
Apreciamos muito gravá-la e ela conteria apenas uma linha vocal que repetiria a palavra onomatopaica: "Xi", a fazer uma brincadeira com as duas línguas, português e inglês, ao simular "She". 
Ficou muito boa essa gravação e eu lamento que tenha sido  descartada na hora de se fechar o repertório base do disco. Espero que seja lançada um dia. Mantém uma duração ínfima, a ser tratada como vinheta, mesmo. O seu balanço é sensacional e o arranjo a destacar um slide bem de caipira norte-americano, é ótimo.
Uma outra vinheta foi uma ideia que o Rodrigo havia trazido para a banda desenvolver uma música no estilo do Funk-Rock setentista. Tal esboço inicial ele desenvolvera para compor uma música com o saudoso cantor/ator/letrista e compositor, Paulo de Tharso, ex-companheiro do Xando na banda "Big Balls". No entanto, como não se concretizou tal intento, com essa parceria entre ambos, Rodrigo trouxe a ideia para nós. Contudo, após poucas tentativas, um outro colega alegou não tê-la apreciado por ser “clichê” demais em sua avaliação. 
Mas eu não conformei-me com esse descarte assim tão despropositado e sob uma ocasião posterior, a sugeri como vinheta, a introduzir-se uma locução ao estilo dos seriados policiais norte-americanos de TV dos anos setenta e nesse sentido, o tema criado pelo Rodrigo aos teclados ficou perfeito, pois se parece mesmo com um tema de abertura de seriados como: “Kojak”, “Baretta”, “Starsky & Hutch” e tantos outros setentistas, a usar e abusar do Funk-Rock cheio de balanço, para se garantir um clima de urbanidade total.
Eu mesmo gravei a locução, ao aproveitar o fato de deter uma voz muito grave, ao estilo dos locutores de rádio de antigamente, com aquela impostação formal de teor grandiloquente de outrora etc.
Outra vinheta que estava cotada para entrar no disco, foi uma brincadeira remota que havíamos gravado em um ensaio, em 2009 ou 2010, não lembro-me ao certo. 
Tal ideia surgiu quando falávamos sobre a extrema ruindade das bandas oriundas da cena "indie" quando de brincadeira e improviso total, o Xando inventou um riff grotesco a evocar o Punk-Rock e todos foram atrás, a tocarmos cada um, o pior possível para imitar a incapacidade atroz desses seguidores eternos de Malcolm Mclaren, e para intensificar o sentimento, o Xando improvisou uma letra absurda em inglês. 
Isso motivou o ultrajante título de: "Dad's Cum" e eu prefiro não traduzir, mas quem entende inglês pode deduzir pelo título aviltante, a infame intenção em que isso se revestiu.
Por muito tempo, a ideia dessa gravação de ensaio tosca, sem tratamento sonoro algum e com todo mundo a tocar mal de propósito, seria que fosse lançada como um single de internet, para causar um rebuliço. 
Teria sido algo muito inusitado, pois os fãs da banda não entenderiam o propósito disso, mas nas entrelinhas, teria sido uma forma de ironizar a formação de opinião dos marqueteiros, há décadas a incensarem bandas horríveis que fazem esse tipo de som, como se isso contivesse relevância artística. Seria uma forma divertida para desmascarar a desfaçatez desses malditos inescrupulosos, pois o que diriam diante de algo que geralmente afirmavam ser o "o novo grito da moda?" Se nos massacrassem ou se exaltassem-nos, seria a queda da máscara desses crápulas, pelas duas hipóteses, aliás. 
Claro que ríamos muito ao ouvirmos essa peça horrorosa e a ideia de lançar na internet pareceu um ato artístico corajoso até, mas no calor dos acontecimentos, ponderamos também que sem apoio por trás, mesmo ao precipitarmos que algumas máscaras caíssem, o poder mainstream trataria de abafar o caso, e o nosso "manifesto" teria o efeito de um mísero "traque", diante da bomba atômica que gostaríamos que fosse detonada. 
Contudo, quando o disco começou a ser finalizado em junho de 2013, com a banda a entrar em estúdio para gravar a nova leva de canções, a ideia de lançar "Dad's Cum", com aquela gravação tosca de ensaio em meio a canções sérias e bem gravadas, ganhou força novamente. 
Quando o disco foi lançado em 2015, tal abominação não constava do repertório inserido nele. De fato, com a banda desmantelada e a lançar o disco sem alarde, não fez sentido ter essa peça para causar provocações e se tivesse entrado no bojo, não seria entendida por ninguém, a passar a pecha de uma manifestação extremamente tola. Portanto, foi bom não incluí-la, nessas novas circunstâncias.
Sobre o início das gravações da bateria, lembro-me que ocorreram bem no início das manifestações de rua de 2013. Todos estavam eufóricos com as imagens que vinham da TV e nos intervalos da gravação, corríamos para vermos as notícias que não paravam de mostrar cenas absurdas vindas de São Paulo, Rio e Brasília, principalmente. 
A Internet também estava a abundar de notícias e o mundo parecia estar a virar de cabeça para baixo. Tudo bem, o simulacro que motivou essa manifestação, aparentemente não foi só pelos vinte centavos do aumento da passagem dos ônibus e metrô em São Paulo, mas ao espalhar-se, denotou apenas uma suposta insatisfação generalizada. 
Todos da banda estavam eufóricos, menos eu que via com tristeza tais cenas, por que aos meus olhos estava patente que haviam manipulações claras a insuflar a massa e o que pareceu ser a "legítima demonstração de insatisfação do povo brasileiro", na minha ótica ao verificar aquela cambada de vândalos a quebrar tudo, ficara óbvio que informação e contrainformação digladiavam-se nas mesas dos marqueteiros e o povo, mais uma vez estava a fazer papel de palhaço ao ser usado sem parcimônia, na chamada idiotia útil.
Dessa forma eu calei-me, é claro, para não fazer-me mal compreendido pelos colegas. Nesse calor dos acontecimentos, ao parecer que o mundo viraria de cabeça para baixo naquela noite inicial das "manifestações", surgiu a ideia de que o nosso disco teria semelhança com essa "revolução", pelo fato dele estar a ser preparado desde 2009, com direito a interrupção e portanto, a ser conduzido de uma forma muita caótica em sua concepção. 
Daí, a palavra "Fuzuê" surgiu, e o Xando a adorou. Não tenho nada contra o conceito e o nome, mas o que eu achei daquela manifestação popular inicial, continuo a considerar hoje em dia, ou seja, foi a óbvia constatação que setores ultra radicais manipularam a opinião pública na tentativa de perpetrar uma revolta forjada, portanto, o mundo a virar de cabeça para baixo como pensavam, não viraria absolutamente nada, exatamente como eu imaginei na hora, mas a guardar a minha opinião internamente para não ser estigmatizado como um "chato" e até mesmo "incauto", visto que até tentativa de incendiar o Palácio do Planalto ocorreu naquela noite, com transmissão ao vivo pela mídia, ou seja, tudo bem combinadinho por quem quis fazer "o circo pegar fogo ao vivo. Calei-me ante tal situação aviltante e culminou em "água", como diz-se no jogo de batalha naval, portanto, ao indagarem-me se eu não percebia que algo muito grande estava a acontecer, talvez a querer denotar estupefação diante de algo tão "gritante" e ao verem-me com semblante triste ao invés de estar eufórico, de certa forma mostrara como a minha sintonia com essa banda não existia mais e talvez nunca tenha existido, na essência.
O tempo passou, vieram mais manifestações, mais barulho, mais Black Bloc e a ameaça de que o mundo iria explodir a cada novo raiar do sol só denotou em golpe sujo a se respaldar em pedaladas... 
Mas o tal fuzuê no país não concretizou-se, apenas tudo culminou em um presumível golpe branco com muita manipulação midiática e digo com tristeza que infelizmente, nem o nosso Fuzuê aconteceu, igualmente.
Continua...

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