domingo, 31 de maio de 2015

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 305 - Por Luiz Domingues


Os Inocentes não era uma banda abonada, apesar do Punk-Rock ser a raiz primordial de toda a estética oitentista na crista da onda (e tal banda, um de seus principais expoentes no país), pois os seus componentes eram rapazes de origem simples, e apesar de estarem sedimentados com agenda cheia e a ganhar dinheiro, não tinham ainda instrumentos de alto nível para enfrentar uma gravação profissional.

Não sei quanto aos seus álbuns anteriores, e provavelmente suponho que tenham arrumado instrumentos importados para gravar, mas agora, a gravar pela Warner, em um estúdio de maior categoria como o Mosh, naturalmente estavam a ser pressionados pela gravadora para dar um jeito nessa situação. Mesmo sendo uma banda de Punk-Rock, e onde a preocupação com timbres e performances instrumentais eram quase nulas, em tese, ao gravar através de uma gravadora major, a situação seria diferente.

Nesses termos, recorreram à nós d'A Chave do Sol, para tomar tal providência e assim, de pronto ficamos felizes por poder auxiliar os amigos, ao emprestar a guitarra do Rubens e o meu baixo, para que o Clemente e o Ronaldo pudessem contar com esses instrumentos na gravação.

Em retribuição, o Clemente nos disse que a Warner estava a oferecer à eles, uma verba para locar instrumentos de alto padrão e claro que ele poderia ter ficado quieto e embolsado tal verba, visto que nós emprestamos prazerosamente, em título de amizade. Entretanto, Mas ele repassou-nos o dinheiro, que aliás, era uma taxa alta, que nos surpreendeu e nos deixou ainda mais ansiosos por adentrar uma companhia desse porte, com tantas mordomias oferecidas aos seus artistas, como observamos nas entrelinhas. E graças à essa troca de gentilezas, Os Inocentes puderam gravar com maior qualidade sonora, o seu disco pela Warner.

Ao ir além, o Clemente tentou nos ajudar ainda mais incisivamente, e nesse ponto, eu tenho boas histórias para contar a respeito dessas sessões de gravação d'Os Inocentes. 

Além de nos dar a possibilidade de ganhar um dinheiro extra, de forma inesperada, o Clemente quis ser ainda mais incisivo no seu esforço de cooperação para conosco, pois nos convidou a assistir as sessões de gravação do álbum, no estúdio Mosh. Claro que tínhamos a noção de que estúdio não é lugar para confraternizações, tampouco festas e /ou reuniões descontraídas, promovidas entre amigos. Sabíamos de antemão de que se fizéssemos de fato tais visitas, teriam que ser muito rápidas, sob um caráter bastante discreto. Mas estrategicamente o Clemente queria muito nos ajudar, e mesmo ao saber que tal presença poderia atrapalhar o processo de gravação de seu próprio disco, ele insistiu que aparecêssemos, pois seria vital nos aproximarmos dos produtores, da gravadora, Liminha e Peninha, que acompanhariam as sessões, certamente.

Claro que aceitamos tal convite e mesmo imbuídos da prerrogativa da discrição a ser observada, não poderíamos perder a oportunidade. Já tínhamos feito abordagens ao Peninha e também ao Liminha, por duas vezes, em 1984 e 1986, com recusas. Em 1986, tinha ocorrido muito recentemente, conforme o leitor leu poucos capítulos atrás. Agora, seria uma outra abordagem, mas com a estratégia diferente, a estabelecer uma aproximação mais gradual, não agressiva, mas na base da informalidade, via camaradagem.

Já havíamos tido o apoio do baterista dos Titãs, Charles Gavin e agora, o pessoal d'Os Inocentes estava a indicar-nos, portanto, mais que isso, estaríamos ali com o papel de apoiadores d'Os Inocentes, a denotar a nossa amizade, com direito a suporte, e vice-versa, na questão dos instrumentos. 

Dessa maneira, foram algumas visitas ao estúdio Mosh, ainda instalado no sobrado da Vila Pompeia, zona oeste de São Paulo, e vale a pena descrever algumas histórias ali ocorridas, que reputo serem hilárias...

Continua...
 

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