terça-feira, 5 de maio de 2015

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 251 - Por Luiz Domingues


O festival em questão, chamava-se "ERA", e tratava-se de sua primeira edição. No soundcheck, foi tudo muito tranquilo e amistoso, conosco e com o suporte que o técnico Canrobert Marques teve para trabalhar e sempre tende a ser tensa a relação dos técnicos de equipamentos com o técnico da banda, fora a velada (às vezes, explícita), "disputa" para ver quem "entende mais", gerada por ciúmes descabidos, mas típicas desse meio. Um fato curioso deu-se quando notamos que a nossa empresária sumira de nossa vista. Ao sermos procurados pelos organizadores do festival para tratar de alguma questão burocrática de última hora, é que demos falta da presença dela, que teoricamente deveria cuidar de tais atribuições. Bem, esse sumiço teria desdobramentos.
Eliane Daic, namorada do Zé Luiz à época, a descansar dentro do famoso Dodge Charger RT, de propriedade de nosso baterista e que transportou-nos à Aguaí / SP. Click : Rodolpho Tedeschi

Encerrado o soundcheck, fomos conduzidos à Kombi da produção e uma pessoa dessa equipe, levou-nos para jantar em um bom restaurante da cidade. Procuramos pela nossa empresária, mas ela simplesmente sumira. Resolvemos ir jantar sem a sua presença, nessa circunstância enigmática de sua falta.

Beto Cruz a aguardar o momento para o soundcheck, na tarde quente interiorana. Click de Rodolpho Tedeschi

Estávamos muito satisfeitos com o tratamento e atenção dos organizadores, e pareceu que seria um show tranquilo e bem sucedido. E o foi (a não ser por dois eventos que não foram causados por culpa deles, mas quase estragam a noite). O primeiro, ocorreu no restaurante, pois quando chegamos ao estabelecimento, nem lembrávamos que a nossa aparência Rocker ainda poderia causar reações em meio à pessoas desacostumadas a conviver com pessoas, digamos, "fora do padrão". Após tantos anos, foi inacreditável que essas coisas pudessem acontecer ainda, mas em uma cidade interiorana, na metade dos anos 1980, ainda aconteceu. 

Eu, Luiz Domingues, e Edgard Pucinelli Filho, a aguardar o soundcheck e atrás de nós, o velho Dodge do Dinola. Click de Rodolpho Tedeschi

Enfim, quando entramos no restaurante, as conversas pararam em todas as mesas do estabelecimento e a atenção caiu sobre nós, como se fôssemos alienígenas que haviam acabado de aterrissar em uma pequena cidade do meio-oeste norteamericano, conforme um típico enredo de filme orientado pelo gênero Sci-Fi da década de cinquenta. Claro que foi constrangedor, mas em questão de segundos já estávamos sentados na mesa e preocupados em analisar o cardápio e formular os nossos pedidos.

O nosso técnico de som, Canrobert Marques, com microfone à mão, a iniciar os primeiros testes de áudio na afinação do PA; atrás dele, Rubens Gióia e eu, Luiz Domingues, estou no nível do solo. Click : Rodolpho Tedeschi

Esse não foi o problema, contudo. O que ocorreu, foi que tal evento incomodou um membro da nossa comitiva e após a ingestão de bebida alcoólica, tal membro mudou completamente o seu comportamento e passou a cometer uma performance tresloucada para chamar a atenção geral, e assim, a demonstrar o seu desagrado pela recepção quase hostil que havíamos recebido em nossa chegada ao local. Ao tornar-se inconveniente, ele passou a exagerar muito, ao ponto de alguns clientes reclamar com o gerente do restaurante.

Como registro histórico dessa passagem em Aguaí, eis a banda e equipe, a posar no campo, no pequeno estádio de futebol local, em formação de time, Beto Cruz; Rubens Gióia e José Luiz Dinola em pé. Agachados : Edgard; eu, Luiz Domingues, e Canrobert Marques. Click : Rodolpho Tedeschi

Aí, inverteram-se os papéis, pois a situação em tom de provocação pela qual havíamos passado, passou a ser justificável, pois os "freaks" (e possivelmente "drogados", sabemos como é o imaginário popular), estavam a incomodar, agora e de fato. Bem, na prática, tratou-se apenas de uma pessoa alterada em nossa mesa e internamente, falamos-lhe para que ele parasse com aquele comportamento que estava a envergonhar-nos, todavia, ficamos no fogo cruzado, pois quanto mais o advertíamos, mais ele irritava-se, justamente por estar fora de consciência, devido à bebida ingerida. Bem, alguns produtores do show intervieram, ao tentar convencer o dono do restaurante de que tratara-se de uma manifestação isolada e não representava o comportamento da banda, tampouco o festival, mas o clima já estava azedado e só restou-nos encerrar o jantar e sair dali o quanto antes. Não revelarei quem foi o protagonista dessa ação inconveniente, mas isento a banda. Nenhum de nós quatro, músicos, foi tal pessoa a cometer tal excesso.

De volta do restaurante, ao local do show, um fato totalmente inesperado deixou-nos atordoados, e por pouco não tornou-se um tumulto generalizado, a estragar não apenas o nosso show, mas o próprio festival. De uma forma inusitada, ouvimos o nosso fotógrafo, Rodolpho Tedeschi, o popular, "Barba", indignado, a gritar pela presença da polícia. Quando fomos entender o que havia acontecido, no meio daquela confusão em meio à multidão e com uma banda a tocar a todo vapor no palco, com o som do P.A., muito alto, finalmente o "Barba" revelou-nos que estava a caminhar tranquilamente, quando um grupo de rapazes perguntou-lhe agressivamente, por quê ele não cortava a sua barba. Atônito com tal abordagem gratuita e despropositada, Rodolpho retrucou ao perguntar-lhes se a sua barba incomodava-os e aí, sob truculência, esses vândalos arrancaram um chumaço de sua barba, e uma troca de socos, sucedeu-se. 


Foi tão inusitado e tão rápido, que só percebemos quando ele berrava e os rapazes já haviam sumido em meio à multidão. Bem, revelou-se como uma provocação gratuita, com o intuito claro de provocação e a nossa reação de imediato foi ajudá-lo, talvez a localizar os vagabundos que o atacou, mas naquela balbúrdia, foi impossível. Fora a indignação pessoal e o desconforto físico em ter um pedaço de barba arrancada dessa forma agressiva, ficou por isso mesmo, pois ele não quis ser socorrido e de fato, não foi o caso de procurar pronto-socorro. Tampouco ele quis prestar queixa na polícia, pois sabia que os policiais dariam de ombros etc. Fato extremamente desagradável, pois de certa forma estragou a nossa noite, por que ficamos abalados com esse baixo astral gratuito com um membro de nossa comitiva.

Uma foto descontraída ao entardecer, após a realização do soundcheck. Na parte mais alta da árvore, Beto Cruz; abaixo, Rubens Gióia. Abaixo, José Luiz Dinola e Canrobert Marques e agachados, Edgard Pucinelli Filho e Luiz Domingues. Click : Rodolpho Tedeschi.


Continua... 

4 comentários:

  1. onde fica Aguai ? sampa ?.O disse sobre cabeludos estar na city e o pessoal do interior olhar com feia e tudo mais ( sem contar ainda mais sobre a Pessoa que siu fora um pouco ) , fez lembrar da cena final do Sem destino ( peter fonda ) qdo vao ao bar e quando vao embora , acena a gente ja sabe ...., os caras do interior ......assassinaram os motoqueiros, freak ,.. naquela epoca em pleno USA , o peter mostrou isso no filme.Em plenos ano 80 ainda existem e se for ver pelos braziz afora com certeza ainda tera lugar com pessoas dessa forma de ver o cabeludos roqueiros ....rssssss...abraços

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    1. Aguaí fica sim no Estado de São Paulo, perto de Pirassununga; Porto Ferreira; Descalvado etc.

      Reações assim são normais até hoje, dependendo da localidade. De fato, um bando de freaks cabeludos sempre chama a atenção quando entra num ambiente de gente não habituada com esse universo do Rock.

      Bem lembrado, lembrou um pouco a reação dos caipiras reaças que mataram os hippies gratuitamente em Easy Rider...

      Grande abraço, Oscar !

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  2. estimo as melhoras e que esteja otimo nesse momento grande Luiz .

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    1. Muito grato !

      O pior já passou, estou em boa recuperação.

      Abraço e obrigado pela preocupação e torcida !

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