domingo, 16 de agosto de 2015

Autobiografia na Música - A Chave/The Key - Capítulo 21 - Por Luiz Domingues


Nos dias 11, 14, e 20 de julho de 1988, nós tivemos aparições rápidas em um novo programa de TV, que mostrava-se moderno para os padrões da época, chamado: "TV Mix", veiculado na TV Gazeta de São Paulo. Aparentemente caótico e avant-garde, teve a proposta de ser uma mescla de programa de jornalismo cultural, com cobertura de cotidiano em geral da metrópole. Para dizer a verdade, era bem interessante a sua proposta de dinamismo e informalidade, a extrair o ranço de seriedade de um jornal tradicional, sendo leve; moderno e de certa forma, irreverente.

Com exibição diária e ao vivo (apresentava três edições por dia), detinha uma série de âncoras, entre eles, figuras que não eram ainda famosas na TV nessa ocasião, como Serginho Groismann, Alê Primo, o escritor, Caio Fernando Abreu, o então jovem, Cleber Machado (atual narrador esportivo da TV Globo), Marcelo Mansfield (famoso a posteriori, com o stand up comedy, "Terça Insana"), Luis Henrique (travestido como "Condessa Giovanna", e que hoje em dia faz a "Mamma Bruschetta" em programas femininos da própria TV Gazeta), e Astrid Fontenelle, só para citar alguns jovens (além de alguns veteranos também, caso de Ricardo Corte Real e Tadeu Jungle, ex-A Fábrica do Som), e de certa forma, tal programa antecipou a extrema informalidade que dois anos depois marcaria o início das atividades da MTV no Brasil.

No caso da Astrid, certamente que sua atuação na TV Mix, assegurou a sua contratação para a MTV, em 1990. 

E no dia 20, ao aproveitarmos a passagem pela TV Mix, novamente, agendamos participação no programa; Realce. No tempo d'A Chave do Sol, fôramos habitues desse programa onde nos apresentamos diversas vezes a praticar dublagens hilárias, e a participar das loucuras improvisadas pelo apresentador argentino e loucaço-mor, Mister Sam.

Mas nessa nova fase, o Realce havia se reformulado muito. Mister Sam não fazia mais a apresentação que ficara a cargo de um locutor de FM chamado: Beto Rivera. Ele era extremamente profissional e gentil, mas não tinha o carisma e a insanidade do Mister Sam, ao tornar o programa muito "certinho", portanto, a subtrair muito do seu charme anterior.

Nesse dia, dividimos o programa com uma figura super ilustre do Rock/MPB brasileiro setentista, Pepeu Gomes, que foi muito gentil conosco nos bastidores e conversou bastante com o Edu Ardanuy sobre guitarras, equipamento etc.

O nosso próximo compromisso foi marcado para o Centro Cultural São Paulo. Desta feita, ao contrário do público presente que havíamos considerado decepcionante no Teatro Mambembe, tivemos bastante gente nessa nova apresentação. Tocamos perante cerca de seiscentas pessoas, no dia 24 de julho de 1988, e foi um show com energia, devo registrar.  
Foto de João Cucci Neto, a cobrir esse show do Centro Cultural São Paulo, para a revista Rock Brigade

Entretanto, o que mais marcou nesse dia, não foi a nossa performance boa, tampouco a reação calorosa do público, mas um acontecimento ocorrido nos bastidores. Através do Eduardo Ardanuy, o empresário que estava a trabalhar com o João Ricardo, Ex-Secos & Molhados, foi assistir o nosso show, e talvez daí surgisse o interesse em nos contratar. Bem, desde o final da velha, A Chave do Sol que não tínhamos mais contato com empresários, e agora que uma nova banda estava articulada e a fazer um relativo sucesso na mídia especializada, portanto, se arrumássemos alguém para nos auxiliar, não seria nada mal.

Alguns dias depois, uma reunião foi marcada para termos uma conversa preliminar com o rapaz que se chamava, Enzo, mas fico a dever o seu sobrenome. O ponto de encontro foi o próprio Centro Cultural São Paulo, mas ao contrário do que supúnhamos, a sua real intenção não seria nos contratar. Contudo, só percebemos isso alguns minutos depois. Ao emitir uma desculpa esfarrapada sobre ali não ser um local adequado para conversarmos (e não procedia, pois o CCSP possui vários "lounges", ambientes de convivência social, café etc), nos convidou a irmos a uma cantina no bairro do Bexiga, onde a degustarmos uma bela massa italiana, conversaríamos com mais calma.  

Chegamos lá então, e entre inúmeras cantinas italianas que existem na Rua 13 de maio, entramos na "Lazzarella", excelente, é claro, mas eis que deparamo-nos com o grande, João Ricardo à nossa espera. Bem, fora portanto uma mera armadilha, com o tal Enzo não interessado em nos contratar como banda a nos empresariar, mas na verdade, preocupado em arregimentar músicos para compor uma nova tentativa de volta dos "Secos & Molhados", que João Ricardo estava a planejar.

O interesse ali foi convidar, Edu e Fabio, os nossos solistas. E a conversa girou em torno disso, pelos cantos, enquanto comíamos e o Enzo fazia esforços para que eu, Beto e Zé Luiz Rapolli não prestássemos atenção no assédio sobre os nossos companheiros, mas isso foi praticamente inútil para tentar disfarçar. 

E convenhamos, se fosse em 1973, eles não teriam nem que pensar, e nós só poderíamos amargar a perda de nossos companheiros, a desfalcar a nossa banda, mas em pleno 1988, a perspectiva de uma terceira ou quarta "volta" dos Secos & Molhados, e sem Ney Matogrosso e Gerson Conrad em suas fileiras, não os seduziu.   

Quando o jantar terminou, o tal Enzo estava com uma linha de comportamento muito diferente. Falante e brincalhão no início da noite, estava agora bem mal-humorado, em um misto de contrariedade pela não concretização de seu intuito primordial, visto que Edu e Fabio não se mostraram empolgados com a proposta, e talvez potencializado pela ingestão de vinho.

Antes disso acontecer, horas antes, quando de conversas sobre amenidades, esse rapaz havia me oferecido uma carona, pois descobrira que eu era morador do bairro do Tatuapé, na Zona Leste de São Paulo, e ele era da Mooca bairro da mesma "ZL". Agora, não haveria como retroceder na sua gentil oferta, apesar de estar visivelmente contrariado pelo rumo da conversa.  
Portanto, no caminho, ele foi a dirigir o seu carro sob um profundo silêncio e quando o carro alcançou o viaduto Bresser, na avenida Radial Leste, eis que ele tomou impulso e me perguntou se eu não me importava em prosseguir a minha viagem pelo metrô, pois ele estava cansado, e queria virar ali para embrenhar-se no bairro da Mooca, rumo à sua residência, o mais rápido possível. Claro que não me importei, seriam apenas duas estações para eu chegar à minha casa, mas tal episódio ilustra bem a contrariedade do rapaz.

Bem, nem precisa dizer que ele parou de atender o telefone logo a seguir, e o seu suposto interesse em nos empresariar nunca existiu, na realidade...

Continua...

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