Entramos em processo de gravação do álbum, em julho de 1989. O Chicão, produtor, fechou acordo com um estúdio de bom nível, mas que não era badalado no meio, por ser novo no mercado. E exatamente por estar a iniciar as suas atividades, praticava um padrão de precificação mais acessível. Contudo, continha uma maquinário de primeira qualidade e as suas instalações cheiravam a tinta, com tudo novo em folha e instalado em um belo e amplo sobrado localizado no bairro do Alto de Pinheiros, que é um quadrante extremamente residencial do bairro de Pinheiros, na zona oeste de São Paulo, e com a maioria das casas a se constituir de alto padrão, ou mesmo a tratar-se de mansões. Tal estúdio chamava-se: "Big Bang".
Um dos sócios foi Marcelo Galbetti, membro do grupo de sátira e humor, "Premeditando o Breque", banda contemporânea do Língua de Trapo, egressa portanto daquela cena da "Vanguarda Paulista", surgida entre 1979 e 1982, mais ou menos. O outro sócio, e que era o dono do imóvel, chamava-se, Marco Mattioli.
Não ensaiamos muito, mas aquelas músicas eram bem rodadas, sendo que as tocávamos desde 1988, nos shows, portanto, não haveria o que temer em termos de perda de tempo nas tomadas básicas de gravação. A metodologia foi na base do um-por-um, portanto fizemos a captura da bateria mediante a guia no primeiro e segundo dia, com o Rapolli a gravar a sua parte com bastante eficiência.
De última hora, resolvemos gravar a canção: "No Quarter" do Led Zeppelin, e claro que seria inviável inseri-la no disco por conta da fortuna que seria ter que pagar as taxas à editora que controla tal canção, mas gostamos de ter uma versão nossa dessa canção épica, talvez pelo simples prazer de ouvir em casa, secretamente. Contudo, na hora da mixagem, claro que tal devaneio foi descartado e muito provavelmente essa versão foi apagada ali mesmo em 1989, assim que deixamos o estúdio e o próximo cliente precisou usar usar as fitas, prática comum em estúdios profissionais, diante da tecnologia analógica ainda em curso.
A música: "Before the Bridge Falls Down", era uma versão com outra letra de "Sun City", do repertório d'A Chave do Sol, e acho hoje em dia muito constrangedor que tal canção forjada nesses termos, tenha sido inserida no LP, embora muitas modificações na melodia principal houvessem sido efetuadas. Deveríamos na verdade, ter gravado uma música inédita e de fato, haviam várias que acabaram por ficar de fora da seleção final, caso de "Paralell Paradise", que era um tema instrumental do Fábio Ribeiro, muito inspirado no Prog-Rock setentista e bem bonito tema, na minha opinião.
Algum tempo depois, já em agosto, eu passei cerca de três horas da minha vida a gravar a minha parte, sozinho com o técnico, Michael Angel, em uma noite de sexta-feira, quando me lembro que ficamos a trabalhar e conversarmos animadamente sobre os anos setenta.
E nessa altura, foi tudo o que eu quis, ou seja, voltar para as minhas raízes e me livrar da década de oitenta.
O clip da música: "When We Was Fab", do então mais recente disco do George Harrison, havia acabado de ser lançado, e aquele mergulho na nostalgia da psicodelia sessentista começou a me fazer crer que, sim, seria possível resgatar a minha verdade, e ela contrastava com o mundo oitentista hostil.
Tal música em específico e o então novo disco inteiro do George Harrison ("Cloud Nine"), e mais o LP solo do Keith Richards também recém lançado em 1989 ("Talk is Cheap"), representaram um fio de esperança em meu combalido coração sessentista e o descarte do ranço oitentista em que me inseri por absoluta falta de escolha, estava prestes a ocorrer.
Um dissabor ainda na gravação da guia do disco d'A Chave/The Key, reforçara tudo o que enfatizo. Ao ouvir as convenções que eu e Rapolli havíamos criado para enriquecer algumas canções, o Edu pediu para não as gravarmos, mas fazermos uma base simples, pois julgava que aquelas frases o atrapalhavam nos seus solos. Bem, reduzido a um baixo reto, quase sem frases, a gravação do disco tornou-se ainda mais penosa para a minha participação. Portanto, esse trabalho é certamente o mais simples que eu fiz em minha carreira inteira, com uma participação pífia, a tocar baixo contínuo, em uma nota só, na maior parte do tempo, de forma medíocre.
Aborreci-me tanto com isso e somado à toda a insatisfação acumulada desde 1988, que desliguei-me completamente dessa produção, fato raro e que me entristece, pois eu sempre gostei de acompanhar todo o processo, da pré-produção à mixagem final. Mesmo alheio e chateado, ainda acompanhei a gravação dos companheiros, para lhes ofertar uma dose de apoio moral, mas nessa altura, o Beto já sabia que eu estava desligado da banda.
Aliás, esse comunicado já havia sido feito antes mesmo de entrarmos no estúdio, quando ele pediu-me para eu gravar o disco. É claro que não o deixaria desamparado, tampouco os companheiros e o produtor, Chicão, que estava super entusiasmado e a gastar muito dinheiro.
Lembro-me de ter visto o esforço que o Fabio fez para gravar várias camadas de teclados, inclusive ao alugar um órgão Hammond e a sua respectiva caixa Leslie, do Fernando Costa, o "The Crow", que deu um trabalho incrível para ser levado à sala de gravação, que só era acessada mediante uma ínfima e perigosa escada espiral. Portanto, o entendo perfeitamente quando concede entrevistas e se sente contrariado pela mixagem ter arruinado quase que inteiramente os seus esforços, a transformar a participação dos teclados nesse disco, em uma mera base harmônica chinfrim, que não condiz com a técnica e criatividade de um músico de seu nível.
De minha parte, eu nem teria como me queixar da mixagem, pois não participei de suas sessões, já a me considerar fora da banda. De fato, o baixo está obscurecido, mas não importou-me muito, visto que as linhas que eu gravei são burocráticas, simples e sem grandes atrativos.
Todo o trabalho de produção da capa e encarte foi feito pelo Beto e pelo Chicão. A escolha da ordem das músicas, o texto da ficha técnica e escolha das fotos, e até mesmo o título do álbum, por eles escolhido. "A New Revolution" foi o nome escolhido para esse álbum.
A capa foi obra de um rapaz chamado: Marcos Aurélio, com o logotipo a cargo de Sandra Regina Gonçalves Jacinto
Fotos da capa, de Eric de Haas, extraídas de dois shows no Dama Xoc, em São Paulo, em 1988 e 1989
Por problemas que eu nem sei dizer quais foram, pois eu já não fora mais membro da banda, esse disco só foi lançado no mercado, muitos meses depois, ao final de 1990, a tornar a sua divulgação, extremamente confusa. Não tenho um recorte sequer de jornal ou revista com uma nota ou resenha sobre o seu lançamento. Nem sei se saiu algo de fato, mas claro que deve ter saído.
Não sei dizer quanto tempo mais os demais membros ainda ficaram com essa banda, pois a partir dessa obrigação moral de gravar o disco, eu me despedi. Creio no entanto, que ninguém ficou, pois eu soube a posteriori que o Beto iniciou logo a seguir, uma imediata reformulação da banda. Mas por motivos dos quais também desconheço, que eu saiba, tal nova formação não chegou a fazer shows ao final de 1989, tampouco no decorrer de 1990.
Contudo, por incrível que pareça, em outubro de 1990, quando finalmente o disco ficou pronto, o Beto me ligou para formular-me um pedido que soou como algo inacreditável pelas circunstâncias, mas que eu não poderia recusar em consideração à todo o esforço e sofrimento que esse amigo teve para manter a chama acesa...
https://www.youtube.com/watch?v=ZWpSUkxbthY
Continua...
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