segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Autobiografia na Música - Patrulha do Espaço - Capítulo 109 - Por Luiz Domingues


A ideia de pintar o ônibus foi acalentada pelos quatro membros da banda, com muito entusiasmo, porém, não seria apenas uma questão de querer fazer, pois logo descobrimos que para oficializar uma pintura desse tipo no veículo, gastaríamos mais uma verba considerável, e haveria porquanto, a possibilidade de ficar sob judice das autoridades, pois ao contrário do que imaginávamos, inocentemente, ao pensarmos sobre a enorme profusão de veículos conduzidos por hippies nos anos sessenta, para rodar tranquilos, com o veículo regularizado em sua documentação, o trâmite burocrático gerado seria desagradável, principalmente em um país como o Brasil.

Então, ao levarmos em consideração tais dificuldades e somado ao fato de que o funileiro , quando consultado sobre uma possível pintura artística, relutou e deu a entender que não saberia fazê-la corretamente, culminamos por abortar o projeto, lamentavelmente.

Ficamos frustrados, obviamente, pois teria sido um prazer enorme, sob o ponto de vista de nossas predileções contraculturais, além de que possivelmente pudesse ter sido uma propaganda móvel muito benéfica para a banda. Chegamos a cogitar levantar uma verba de patrocínio, mesmo a conspurcar um pouco a pintura psicodélica, mas logo desistimos pois seria um trabalho que demandaria muito tempo e nós estávamos com o carro parado na oficina já em fase de serviço de funilaria (aos cariocas que estiverem a ler, entendam como: "lanternagem"), e o rapaz (aliás nem nós mesmos), não poderia esperar por tal definição financeira para cobrir essa ideia.

O artista plástico que concebeu a pintura, chegou a oferecer-se para pintar pessoalmente, mas precisaríamos de uma garagem adequada, pátio ou estacionamento e haveria toda a estrutura de pintura que sairia cara com a compra não apenas das tintas, mas também de pincéis adequados e material de apoio, fora a questão da sujeira gerada ao redor, inevitável e posterior responsabilidade por possíveis danos causados.

Ele chegou a falar sobre um mutirão, e que traria alguns colegas do atelier do Peticov, e que seria um prazer sensorial para todos, mas infelizmente não tínhamos estrutura para tal e já estávamos inclinados a abortar a missão pelas dificuldades que teríamos com as autoridades de trânsito, na regularização burocrática da documentação do auto.

Não consigo recordar-me do nome desse jovem artista, pupilo de Antonio Peticov, mas lembro-me que graças a ele, nessa mesma época, ajudamos uma ONG de reciclagem de materiais, a doar-lhes uma música para que produzissem assim um CD coletânea com várias bandas. 

O Junior cedeu a música: "Ser", ao extrair o áudio diretamente do CD "Chronophagia". Tal coletânea se chamou: "Música para Reciclar" e a ONG pertencia a uma associação de um bairro da zona norte de São Paulo, não me lembro se Pirituba ou Freguesia do Ó. Nela, havia a presença de bandas novas e desconhecidas e apenas a Patrulha do Espaço e o Tutti-Frutti participariam, como "dinossauros", a conter história longeva.

Dessa maneira, tivemos que optar por uma pintura tradicional e discreta. Mediante uma consulta à loja de tintas, apreciamos um tom de azul bem escuro, que na nomenclatura do catálogo de tintas, se chamava: "Azul Universo".

Gostamos da ideia do ônibus manter uma cor sóbria, e essa discrição ser um fator de segurança, pois também ponderamos que a pintura psicodélica era maravilhosa, mas estávamos em 2001, no Brasil, e não na América do Norte de 1967, portanto, não obstante o fato de ser lindo para o nosso gosto estético, cultural e ideológico, aquilo seria uma chamariz  para atrair fatores potencialmente ruins na estrada, também. Por isso, ao descartarmos a pintura psicodélica, fomos em direção diametralmente oposta, ao optarmos pela segurança, via "camuflagem".

Um outro aspecto dessa parada do nosso ônibus na oficina, veio da parte do Rolando Castello Junior. Quando o funileiro perguntou-nos sobre os frisos, ele, Rolando, foi incontinente na determinação de mandar arrancá-los. Eu fui contra, mas ele persuadiu os garotos, e sob uma eleição feita de última hora, eu perdi nessa escolha.

O ônibus, se tivesse mantido os frisos originais que estavam em bom estado e só precisavam de uma limpeza e polimento, teria obtido um resultado estético muito melhor com a cor escura que escolhêramos, mas com a lataria desnuda, realmente ficou muito feio, ao meu ver. Fora a questão estética, houve o aspecto da segurança, também. Frisos não servem apenas para enfeitar, mas são sustentáculos importantes dos gomos de lata do veículo. Em 2003, passaríamos um apuro na estrada, justamente pela falta desse equipamento importante. Enfim, a viver e aprender, assim estamos sempre.

Continua... 

Nenhum comentário:

Postar um comentário