quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Autobiografia na Música - A Chave/The Key - Capítulo 36 - Por Luiz Domingues


Como foi amplamente explicado desde o início deste específico capítulo, "A Chave"/"The Key"/"A Chhave", uma banda com três mudanças de nome em sua curta trajetória, nunca foi a continuação natural d'A Chave do Sol como muitos acreditam.

Ela nasceu sim, das cinzas d'A Chave do Sol, mas por pura necessidade proveniente de uma situação dramática, onde por um lado, a súbita e triste dissolução da velha, A Chave do Sol mostrou-se implacavelmente incontrolável para os seus membros remanescentes (eu, Luiz Domingues, Rubens Gióia e Beto Cruz), e por outro lado, por ter havido concomitantemente o lançamento do disco, "The Key", para ser trabalhado enquanto divulgação, mas bem pior que isso, por lidar com dívidas pesadas para administrar-se, contraídas pela produção do disco, e com a qual não tivemos apoio externo algum.  

Portanto, nesse cenário dramático, não houve uma outra solução a não ser montar uma banda em caráter de emergência, para suprir compromissos inadiáveis que A Chave do Sol já tinha firmado, e a duras penas, estabelecer a divulgação do disco que fora lançado poucos dias antes da discussão que fulminou a banda, de forma triste. O ideal, reitero, teria sido nós conversarmos dias depois dessa fatídica reunião tensa, e com a cabeça mais fria, termos colocado os nervos no lugar e dado prosseguimento à carreira d'A Chave do Sol, normalmente.

Muito provavelmente teríamos inclusive a volta do nosso baterista original, José Luiz Dinola, que havia anunciado a sua saída da banda no início do segundo semestre de 1987, mas que ao final desse mesmo ano, já havia desistido da ideia de estudar odontologia e abandonar a música. Essa teria sido a melhor das soluções para a crise que a nossa banda atravessou nesse final de 1987, mas infelizmente não foi o que ocorreu.  

Rompidos com nosso cofundador, Rubens Gióia, e sem nenhuma possibilidade de cogitar não cumprir os compromissos firmados e divulgar e vender desesperadamente o LP The Key, eu e Beto não tivemos alternativa.

Quando eu comecei a escrever a minha autobiografia, em junho de 2011, ainda a usar a plataforma da saudosa Rede Social Orkut, através de uma comunidade chamada: "Luiz Domingues", aberta pelo meu amigo, Luiz Albano, a minha proposta foi em escrever tal relato focado em capítulos exclusivos dedicados a cada trabalho que fiz na minha carreira. E no caso específico d'A Chave do Sol, eu sabia desde o início que essa etapa final, onde teria que descrever o seu final abrupto e triste (e consequente início de atividades forçadas de uma outra banda com outro nome, mas a gravitar em sua órbita, então denominada: "A Chave"), teria que obrigar-me a ser muito claro para construir tal narrativa, e tomar muitos cuidados para não magoar ninguém.

Isso por que é óbvio que o Rubens Gióia, eu, Luiz Domingues, e Beto Cruz, saímos muito magoados dessa história, e mesmo ao termos resgatado a nossa amizade, ele, Rubens, ainda raciocina que a formação dessa nova banda foi um ato de traição de minha parte, e do Beto. E da parte do Beto, e a estender aos três componentes que fizeram parte dessa nova banda formada em 1988, poderia ficar a impressão de que eu desprezo essa banda chamada "A Chave".

Portanto, tomei todos os cuidados para deixar claro os motivos dessa banda ter sido formada, para que os fãs do trabalho da antiga, A Chave do Sol e principalmente, da parte do Rubens Gióia, saiba o leitor, que eu jamais quis que ele fosse substituído por um outro guitarrista, e para ir além, jamais desejei que A Chave do Sol terminasse um dia, aliás, pior ainda do jeito que aconteceu.

E para o Beto, Ardanuy, Ribeiro, e Rapolli, que a minha contrariedade com o trabalho dessa nova banda formada em 1988, foi algo meramente motivado por uma questão estética, e que jamais teve algo de ordem pessoal com qualquer um deles.

No caso do Beto, muito pelo contrário, sou-lhe eternamente grato pela sua luta, determinação e forte poder de iniciativa, para que em um cenário de hecatombe nuclear, saísse a correr para buscar a salvação, quando a reação normal da maioria das pessoas nessa situação, seria a de apenas resmungar pelos cantos, a lamuriar e chorar pelo leite derramado.

Portanto, realço a força de vontade e garra do Beto Cruz, que reputo ser o grande artífice da criação desse trabalho, para fazer com que tivesse vida, visibilidade, notoriedade e também lhe credito o descobrimento de três talentos jovens que após essa passagem pela banda, cresceram uma barbaridade nas suas carreiras, individualmente a citar-se: Eduardo Ardanuy, Fábio Ribeiro e Pedro "Kiko" Loureiro, sendo este último citado, em meio a uma etapa em que eu nem estava mais presente na formação da banda.

De fato, o Beto tinha/tem talento de "garimpeiro de talentos", e poderia até ter se colocado no mercado musical como um executivo de gravadora, ou mesmo um "manager", para ganhar dinheiro nessa específica função, que requer um talento quase extra-sensorial, eu diria. 

Sobre a banda, especificamente, acho que ela cumpriu a sua função inicial que era de suprir necessidades prementes.  

Posteriormente, quando se assumiu como um novo trabalho e buscou a sua identidade, pecou por vários motivos e escolhas ao meu ver. Faço a minha mea culpa, é claro, pois eu nada fiz para exercer a minha influência para coibir aspectos que me desagradavam, mas mesmo ao não querer justificar, mas apenas constatar, não teria sido o momento adequado para eu forçar mudanças que me aproximassem do que eu realmente gostaria de fazer como estética artística.

Eu nunca enxerguei clima algum para propor uma guinada para sonoridades sessenta-setentistas em 1988, e apesar de eu estar a começar a ter vontade de voltar às minhas raízes, naquela época em específico, isso ainda não se tornara forte o suficiente dentro de minhas possibilidades e principalmente pelo ambiente externo que foi totalmente avesso, é claro. Fora isso tudo, os meus novos colegas jamais aceitariam tais ideias, pois a sua mentalidade estava em outra esfera, pura e simplesmente.

E por fim, a "situação financeira da época versus dívidas", não nos permitiriam devaneios estéticos. O negócio foi tocar o máximo possível, promover o novo trabalho e vender o disco "The Key", que nem pertencia diretamente à essa banda, mas foi a única forma de livrar-nos de dívidas contraídas para que ele, o próprio LP, pudesse ter sido lançado. Portanto, foi uma condição estranha e muito incômoda.

Pelo aspecto da exposição pública, esse novo trabalho gerou inúmeras confusões, é claro. Para muitos fãs e jornalistas, tal banda foi a continuação simples d'A Chave do Sol, mas isso não é uma avaliação correta. Tal confusão também somente serviu para acirrar melindres, e isso me entristece até hoje, é claro.

Portanto, quando comecei a escrever a minha autobiografia, tomei a decisão de separar os respectivos capítulos, para firmar na história a clara divisão que existe entre uma banda, A Chave do Sol, e a outra, A Chave/The Key.

Para efeito biográfico, lamento possuir poucas fotos desse trabalho, por isso a escassez de opções para ilustrar os capítulos. Foram poucos shows entre 1988 e 1989, e também não produzimos muitas peças de portfólio.

Conforme eu descrevi ao longo dos capítulos, também foram poucos os momentos felizes que eu tive, ou ocorrências amenas e divertidas, pois além de eu não ter me afeiçoado ao trabalho, o clima nesses meses foi marcado mais pela presença da apreensão em torno das dívidas contraídas, portanto, a minha visão desse trabalho é mais taciturna, aliás, e assim, posso afirmar que foi o trabalho mais sombrio sob esse aspecto, da minha carreira. No entanto, eu isento os companheiros dessa jornada de qualquer culpa nesse processo, é claro!  

É bastante controverso o resultado sonoro do LP "A New Revolution", não apenas pela estética adotada, mas pelo áudio que foi bastante prejudicado pela mixagem, que achatou os instrumentos, para privilegiar os solos de guitarra. De minha parte, não posso me queixar, pois tão aborrecido que estava por não gravar da forma que desejava, a criar as minhas linhas de baixo livremente, não acompanhei as sessões e assim, moralmente a falar, não tenho o direito de reclamar a posteriori, contudo, o resultado é decepcionante, ao meu ver.

Todavia, ao ver pelo lado heroico com o qual o Beto Cruz tanto lutou para isso ser alcançado, é uma conquista, é claro. Não tenho absolutamente nada contra os companheiros dessa jornada e pelo contrário, lhes agradeço muito por terem aceito a proposta insalubre que o Beto lhes fez para segurar um explosivo nas mãos, naquele início de 1988! Agradeço-lhe também pelo esforço em dar dignidade para essa banda nascida em condições tão inóspitas, tão inadequadas pelas circunstâncias.  

Apesar de tudo, acho que o esforço de todos valeu a pena, e fico contente por verificar que eles demonstram carinho por esse momento de suas carreiras, em entrevistas que concedem na mídia, e que de certa forma, foi o estopim de suas carreiras, caso dos mais jovens na ocasião, Edu e Fábio, e mesmo em uma situação posterior até à minha participação, da parte de Kiko Loureiro. E ao Beto, principalmente, por ter sido a força motriz dessa banda.

 Chegou a hora para falar de seus membros e dos agregados que gravitaram na sua órbita.
Continua...

Nenhum comentário:

Postar um comentário