domingo, 16 de agosto de 2015

Autobiografia na Música - A Chave/The Key - Capítulo 18 - Por Luiz Domingues

Pelo tipo de filipeta absolutamente amadorística, feita nas coxas para usar uma expressão popular, nós deveríamos ter desconfiado que desta feita as coisas não dariam certo no Rio, como em outras ocasiões...

Chegamos a São Paulo no início da madrugada, e tínhamos pouco tempo para descansarmos, pois a viagem para o Rio seria no início da manhã seguinte. Partimos para o Rio, e chegamos na hora do almoço, sob um dia nublado e atípico para o padrão carioca de sol e calor escaldante. Quando nos aproximamos do espaço onde funcionava o Caverna II, tínhamos, eu e Beto, a lembrança de shows realizados nos anos de 1986 e 1987, com nossa ex-banda, A Chave do Sol, mas nessa nova realidade, as circunstâncias eram diferentes, com uma nova banda, e um novo som.  

A expectativa entre os cariocas se mostrara grande, sabíamos, por conta dos acontecimentos que culminaram com o fim das atividades de nossa ex-banda, e a criação às pressas dessa nova banda dissidente. Tocaríamos com duas bandas pesadas da cena local, e formada por bons músicos e pessoas boas, com as quais teríamos certamente uma boa ambientação. Foram, no caso: "Destroyer" e "Calibre 38". Conhecíamos o pessoal do Calibre 38, e esteve garantido, portanto, o clima de camaradagem nos bastidores. Contudo, algo inexplicável ocorreu nessa tarde/noite.

Em primeiro lugar, o público que compareceu às dependências do Caverna II, foi diminuto para os padrões daquele espaço. Nos anos anteriores, havíamos nos apresentado (a falar sobre A Chave do Sol, logicamente), para mais de mil pessoas espremidas no salão retangular e muito quente. Mas nesse dia, o público informado pela produção, de forma aproximada, foi em torno de apenas trezentas pessoas.

O segundo ponto, e mais decepcionante ainda, foi que o público habitual do Caverna II, simplesmente não compareceu e o que vimos ali, foi a presença de um público mal-educado e adepto de tendências radicais de Heavy-Metal extremo, absolutamente agressivo e hostil. Ficamos surpresos quando ao subirmos ao palco, os que estavam mais próximos da grade de segurança, nos hostilizaram bastante. Não foram xingamentos pesados, mas abusaram da ironia e do deboche, a satirizar o nosso sotaque paulista/paulistano, e aí sim, a achincalhar os nossos clubes de futebol, como uma maneira para nos atingir, moralmente.

Até aí tudo bem, pensamos em princípio se tratar de meia dúzia de bairristas idiotas e dispostos a praticar bullying coletivo, pelo simples prazer mórbido de nos incomodar.

Mas quando começamos a tocar, sentimos que não houve sinergia alguma, pois mal ouvíamos os aplausos educados dos poucos que ali compareceram com vontade de assistir os shows das três bandas e, também houve a constatação de que as duas bandas cariocas que tocaram na mesma noite, houveram sido recepcionadas friamente pela plateia.

Segundo o meu amigo, Ricardo Aszmann, que era o nosso contato no Rio, e conhecia bem a cena local, tais elementos eram radicais xiitas vindo de bairros longínquos da periferia e cidades da Baixada Fluminense, e que só teriam mesmo o objetivo de tumultuar, praticar bullying e azucrinar quem quer que fosse que subisse ao palco. Entendemos, ainda que com lástima, mas, aonde estivera o público habitual da casa? A única resposta plausível para tal surpreendente ausência, foi no sentido de que a divulgação fora malfeita, e nessa altura, de fato, o Caverna II já não detinha a força de anos anteriores, infelizmente. Foi um show bastante estranho, portanto.

Saímos do palco aborrecidos por não termos nos apresentado para o verdadeiro público carioca Rocker, mas sim para uma massa alheia ao nosso som, e disposta a tumultuar, simplesmente. Na semana subsequente, teríamos dois shows no Black Jack Bar, em São Paulo, uma casa minúscula, mas tradicional no circuito do Rock paulistano.
Resenha sobre o show realizado no Rio de Janeiro, escrita pelo jornalista, Sergio Martorelli, para a Revista Metal, nº 49

Continua...
  

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