sábado, 15 de agosto de 2015

Autobiografia na Música - A Chave/The Key - Capítulo 11 - Por Luiz Domingues


Já tínhamos perspectivas para shows, novas aparições na TV, e mais entrevistas de rádio em vista. Matérias e resenhas ainda a citar o LP The Key, e a antiga, A Chave do Sol, ainda apareciam nas bancas de jornais e revistas. E nesse embalo, uma perspectiva para cumprir shows no interior de São Paulo, surgiu, mas não se tratou de uma perspectiva mesmos moldes da época próspera vivida pela antiga banda que tivéramos, A Chave do Sol, onde o telefone tocou de forma espontânea muitas vezes e com convites bons a nos formular.

Na verdade, desta feita foi fruto de um arranjo familiar de minha parte, sem nada concreto que pudesse ser comemorado antecipadamente, mas claro que quando surgiu a chance, eu não tive dúvidas e com o material em mãos, entrei em um ônibus de linha e fui incontinente às cidades interioranas de Franca e Ribeirão Preto. Cabe explicação.

Ribeirão Preto é uma cidade onde eu tenho laços familiares. É a terra natal da minha mãe, onde os meus avós maternos moraram por muitos anos, e lá sempre tive muitos tios e primos de três graus, aliás, até hoje. Um dos meus tios, irmão de minha mãe, e meus primos, seus filhos, conheciam há anos o compositor e cantor, Kiko Zambiachi e a sua família, também, igualmente habitantes daquela cidade. A viver os seus dias de glória, com a carreira solo a deslanchar, com as suas músicas a ser gravadas por outros intérpretes, Kiko poderia nos dar uma "força", talvez ao nos colocar na situação de abrirmos os seus shows, ou mesmo a nos indicar para alguma situação interessante. 

                       Kiko Zambianchi em foto dos anos 1980

Essa foi pelo menos a concepção de meus tios e primos, que muito amorosamente sempre torceram por mim e se viram com a oportunidade de me prestar um auxílio direto, graças à essa proximidade que tinham com a família Zambianchi.

De minha parte, eu já estava muito mais maduro naquela altura, com quase vinte e oito anos de idade, e com uma rodagem a contar com doze anos na música, portanto, a minha visão foi bem mais realista sobre a maneira que os supostos "apadrinhamentos" ocorriam no show business, e ao ir além, creio que eu já havia me desapontado com tal tipo de abordagem anteriormente, fatos esses que já foram relatados nos capítulos sobre A Chave do Sol.

Mas claro, o gentil oferecimento de meus parentes, ao oferecer-me mais que o contato com tal artista, mas todo o suporte de estadia na cidade, e claro, a abrir a perspectiva de divulgação na mídia local e venda de discos nas lojas da cidade, também foram vantagens para arriscar essa viagem.

E assim, fui para o interior alguns dias depois do show do Teatro Mambembe, e direto para Franca, onde eu também tinha dois outros tios, irmãos da minha mãe, a morar naquela cidade, sendo que um deles já havia sido presidente da Associação Atlética Francana, o clube local, inclusive com time no futebol profissional, e uma história forte no basquete.

Ali, no dia 25 de abril de 1988, graças aos contatos de meu tio, eu concedi entrevista para a emissora Hertz FM, a falar sobre o LP The Key, além de vender discos em uma loja do centro da cidade. Sobre shows, seria muito complicado pensar em algo, pois os contatos que ele tinha dentro do clube que havia presidido no passado, não garantiam nada, visto que o departamento social de tal agremiação mantinha mentalidade popularesca, e as atrações musicais que agendavam, passavam anos-luz de bandas de Rock, ainda mais as não conhecidas no mundo mainstream, nosso caso como agravante.

Agradeci o apoio, foi bom rever tios e primos, e dali entrei em um ônibus em direção à Ribeirão Preto, distante cerca de cem km de Franca, com o mesmo objetivo de divulgação e possível agendamento de shows.

Na casa de meus outros tios, o entusiasmo deles e de meus primos em me auxiliar foi grande, e claro, imbuí-me de toda a boa vontade em falar com Kiko Zambianchi, embora internamente, não achasse que isso resultaria em algo concreto.

Bem, a minha prima mais velha fez a ligação telefônica, e logo me colocou na linha para falar com ele, em pessoa. Claro, Kiko mostrou-se educado, mesmo por que tinha bastante respeito pelos meus parentes que o conheciam desde a sua adolescência, mas deu para sentir que aquilo fora embaraçoso para ele, também e claro que eu compreendi isso.

E no meu caso foi embaraçoso, pois esse tipo de abordagem mostrara-se um tanto quanto inconveniente pelas circunstâncias.

Enfim, eu lhe falei sobre a minha banda, de sua sonoridade, e da vontade de fazer algo em Ribeirão Preto e região, para divulgar esse trabalho. Ele, por sua vez, foi educado e cordial, mas bastante óbvio na resposta que deu-me, ao exortar-me a buscar apoio de indústrias da cidade, como por exemplo a Cervejaria Paulista, ou a Fábrica de Biscoitos Mabel, indústrias tradicionais e prósperas de Ribeirão Preto, para alavancar um possível patrocínio e pleitear datas a ser usadas na famosa Arena ao ar livre na "Cava do Bosque", equipamento cultural público, controlado pela prefeitura local, para um possível show.

De fato, essa Arena era famosa e ali, muitos artistas medalhões da MPB e do Rock já haviam se apresentado, algumas apresentações até ficaram históricas, caso dos inúmeros shows dos Mutantes ali realizados no início dos anos setenta etc. Eu mesmo já havia me apresentado ali com bastante sucesso, com o Língua de Trapo, em 1984.

Portanto, a dica foi ótima, mas absolutamente evasiva, a denotar que ele estava educadamente a sair pela tangente, de uma maneira cordial para não se envolver, e ao mesmo tempo não gerar mágoas com os meus familiares, ao denotar que nada faria por mim, e ficaria desagradável para ele, visto que o conheciam bem.

Eu entendi perfeitamente a sua posição e nem na época, e muito menos agora, reclamo de sua postura, pois sei que a despeito de estar em um momento bom na sua carreira, pouco ou nada poderia fazer para me/nos ajudar, mesmo que me conhecesse bem e fosse um ardoroso apoiador da minha banda. E pelo contrário, Kiko andava com a "intelligentsia" dos Post-Punkers do eixo São Paulo-Rio-Brasília, e não seria com cabeludos anacrônicos para a realidade oitentista hostil, que encantar-se-ia, normalmente.

Agradeci, e disse aos meus familiares que uma perspectiva abrira-se com esse contato, para não frustrar o entusiasmo cativante de meus tios e primos em ajudar-me, mas na realidade, eu sabia que o contato não renderia nada.

No entanto, a minha ida à Ribeirão Preto renderia um fruto para a banda. O meu tio conhecia uma repórter da TV local, afiliada da Rede Globo, e a convidou para jantar conosco naquela noite. Ela não poderia agendar entrevista no jornalismo local, sem a perspectiva de um show em vista na cidade, mas foi simpática e agendou-me uma entrevista em um dos jornais impressos locais, onde mantinha contatos na redação, e logo para o dia seguinte.

Eu compareci à redação de tal jornal, é claro, e fui bem recebido pela repórter que me entrevistou. Lógico, foi uma entrevista recheada por colocações efêmeras, por não se tratar de um órgão especializado, mas não posso me queixar, pois deixei Ribeirão Preto com uma ação de divulgação para o trabalho, que foi publicada alguns dias depois.

Apesar de meu esforço para lhe explicar que se tratava de uma outra banda doravante, a matéria por ela assinada saiu com a manchete: "A Chave do Sol prepara voo Internacional", a configurar uma típica confusão gerada pelo imbróglio todo. Engraçado também, na reportagem fez-se menção à minha baixa estatura... pois me adjetivaram como: "baixinho", colocação que não me ofendeu, pois não tenho nenhum problema em ter tal característica anatômica, mas achei por outro lado, desnecessário.

Nem em jornais e revistas popularescos em que eu já havia sido mencionado, isso ocorrera, portanto, me surpreendi com essa citação tola, vinda de um jornal interiorano. 

Paciência... em Liliput também existem Rockers, acredito...

Além do fato de que toda a minha explicação sobre as mudanças, não foram levadas em conta, e na reportagem, nos citaram como: "A Chave do Sol", e o release oficial do LP The Key, foi o que prevaleceu. E como eu já mencionei no início deste capítulo, tínhamos mais oportunidades no campo da mídia para cumprir em São Paulo, e shows estavam marcados, doravante.
Continua...

2 comentários:

  1. Eu acho que a repórter na verdade queria dizer "baixista" e na hora de preparar o layout o revisor é que confundiu as palavras, he he he.

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    1. Boa, Takeo !!

      Tomara que tenha sido isso, em defesa da profissional, ou erro de quem diagramou, mas que foi engraçado, isso foi...

      Bacana estar acompanhando !!

      Abração !

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