quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Autobiografia na Música - Pedra - Capítulo 96 - Por Luiz Domingues

"Meu Mundo é Seu" foi uma canção que o Rodrigo trouxe pronta de sua casa. Revelava-se seu lado "MPB voz & violão", que sempre foi forte, mas principalmente com o Pedra, teve muito maior possibilidade de vazão, do que na Patrulha do Espaço, é óbvio. 

A canção chegou para a percepção dos demais, praticamente como ela ficou conhecida no pós-gravação e inclusão no Pedra II, mas a letra era completamente diferente e a interpretação da melodia, detinha um outro contorno. Em princípio, a letra que o Rodrigo trouxe montada, falava sobre temáticas regionalistas. 

Particularmente, eu tenho uma resistência enorme a esse tipo de poesia, por um motivo muito simples: acho que assume-se um risco imenso de soar falso, pelo simples fato de não corresponder à realidade de quem não nasceu e foi criado em um ambiente rural, verdadeiramente. 

Uma situação é ouvir um disco de MPB de um artista folk de Minas Gerais, Rio Grande do Sul ou de algum estado do Nordeste e achar bonitas as imagens por ele propostas, a falar de aspectos eminentemente regionalistas e ainda mais, a usar e abusar de palavras que são expressões idiomáticas típicas de tais regiões. 

Mas outra percepção completamente diferente, é forjar tal poética, a falar por exemplo de frutas típicas, vegetação e animais com nomes exóticos, que não fazem sentido para quem nasceu e foi criado na urbanidade da cidade de São Paulo, o nosso caso.

Na minha ótica, isso soaria falso, a denotar apenas que tal influência existe enquanto produto artístico, mas as imagens evocadas, não fazem parte da formação cultural real do artista, no caso, o Rodrigo e por extensão, nós mesmos. 

Explanei tal opinião para ele, que entendeu o meu ponto de vista, mas ele logicamente defendeu o seu, ao achar não ser nociva a ideia de falar como se fosse um artista interiorano, acostumado com tais imagens por serem de seu habitat natural.

Mas o Xando veio com outra argumentação. Ainda que mais próxima da minha linha, mas a divergir também e ao seguir por uma via paralela, ele considerou que tal linha de MPB, muito regionalista demais, destoava do "todo" do disco. 

Foi também um raciocínio a ser observado, é claro. Após muitas conversas, em que houve até o risco da música ser descartada por destoar do restante da obra, o Rodrigo aceitou considerar uma nova letra e dessa forma, o Xando passou a trabalhar com algo mais próximo da MPB, via Chico Buarque, o que para nós, acredito ter sido muito mais conveniente, não só pela urbanidade, mas sobretudo pelo tipo de abordagem até de um assunto trivial, como é a relação homem/mulher por tal viés mais dramatúrgico, digamos assim.

Creio que o resultado da letra e a interpretação do Rodrigo nessa canção fala por si só. "Meu Mundo é Seu" é uma das músicas mais queridas do disco e teve (tem) no público feminino, uma audiência maciça. 

Quanto à gravação dela em si, o Rodrigo idealizou uma intervenção simples de percussão. 

Convidamos o percussionista, Thiago Sam, que já houvera participado de uma intervenção ao vivo conosco (junto a Caio Ignácio e Roby Pontes, em 2006, no show de lançamento do primeiro disco, em 2006, no Centro Cultural São Paulo). 

No estúdio, Sam trouxe ideias muito criativas que enriqueceram a canção.

 

Ele usou uma folha de zinco, que dá um efeito fantasmagórico, mas não lúgubre, na parte "B", além de um "Ovo" (um pequeno instrumento em formato de um ovo de galinha e com material arenoso no seu interior, o que dá ao músico a possibilidade de manipulá-lo ritmicamente como um condutor de pulsação, a imprimir um balanço para a música), na condução na parte "A" e um efeito étnico muito bonito com o chamado "Vaso" (tal instrumento oco por natureza e semelhante à um vaso de plantas, produz nuances de sons secos, sem "sustain" e com alcance grave e médio, a simular a sonoridade de uma tabla indiana ou o "derbake" de origem árabe), também na condução geral, ao garantir um ar exótico à canção.

O áudio de "Meu Mundo é Seu", do disco: 
Continua...

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