sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

Autobiografia na Música - Pedra - Capítulo 111 - Por Luiz Domingues



Ainda no QG do Overdrive Studio, mas de saída para o Palácio das Convenções do Anhembi. Será que ganharíamos o "Prêmio Dynamite Toddy de Música Independente", na categoria em que fôramos nomeados, por melhor álbum de 2006? Foto de Grace Lagôa

Mas em outubro teríamos um lampejo de alegria por dias melhores, pois havíamos sido indicados para um prêmio, ao concorrermos na categoria de melhor disco de 2006, ainda referente ao nosso disco de estreia, naturalmente. 

Tratara-se do "Prêmio Dynamite de Música Independente", ligado a Revista Dynamite, e que por conta de seu patrocinador, uma famosa fábrica de bebidas achocolatadas, recebia o nome de "Premio Toddy". 

Com uma cerimônia nos moldes das premiações tradicionais, com certo glamour, eu diria, fomos ao Palácio das Convenções do Anhembi, participarmos do evento.

Já no saguão do Palácio das Convenções do Anhembi, Xando Zupo & Rodrigo Hid. Foto : Grace Lagôa

Ali haviam centenas de artistas de diversos campos da música independente, mas muito mais concentrados no espectro "indie", que já dominava fortemente o underground. Havia a ala "metaleira", é bem verdade, mas o pessoal "Indie" dominara quase que completamente tal cena, isso se tornara visível pela frequência ali caracterizada. 

Haveriam alguns shows programados e seriam diversificados. A banda satírica "Massacration", uma gozação perpetrada por uma trupe de humoristas ligadas à MTV, com o objetivo de debochar da cena do Heavy-Metal, faria o "show" inicial. Mas haveriam apresentações mais sérias, posteriormente, com outros artistas escalados para fazerem os shows. 

Logo que aproximamo-nos do local e estávamos todos presentes no carro do Xando e com a sua esposa e fotógrafa, Grace Lagôa, conosco, a fila para adentrar o estacionamento se mostrou gigantesca. Estávamos parados em meio a um grande fluxo e eram centenas de carros nessa fila, quando uma garota completamente desequilibrada forçou uma manobra perigosa ao extremo e colocou-se à nossa frente com seu carro, sem nenhuma cerimônia e nenhum cabimento. 

Ainda bem, o Xando era/é calmo ao volante, a suportar a quase colisão absurda que ela causaria e limitamo-nos a comentar entre risadas que ela seria uma "louca varrida", entre outras observações desse teor. 

Quando conseguimos entrar enfim e aproximamo-nos do local, vimos a mocinha tresloucada que quase abalroara-nos, aos prantos, a berrar com um rapaz que devia ser o seu ex-namorado, enquanto este simplesmente a ignorava, apesar da crise nervosa dela, que promovia um escândalo. 

O rapaz em questão era um músico famoso no meio e filho de uma artista muito mais famosa ainda. Paro por aqui, não sou editor de Blog de fofocas, mas esteve explicado o nervosismo da mocinha transtornada e a caracterizá-la como a uma "louca varrida", certamente.

Encontramo-nos com Tony Babalu, o guitarrista superb e a simpática Suzi Medeiros, sua esposa, que acompanhados do não menos superb baterista Franklin Paolillo, e da jornalista, Marina Abramowicz, estes acompanharam-nos para o interior do Palácio, quando sentamo-nos juntos na mesma fileira de poltronas.

A nossa comitiva presente no Anhembi para assistir a cerimônia do prêmio. Em pé, da esquerda para a direita: Telma Vecchione (irmã de Oswaldo e Celso Vecchione, os Glimmer Twins do Made in Brazil), Franklin Paolillo, Samuel Wagner, Suzi Medeiros, Luiz Domingues, Ivan Scartezini, Tony Babalu, Xando Zupo, Marina Abramowicz e Rodrigo Hid. Agachado: Daniel "Kid"

Tony Babalu foi o produtor fonográfico do nosso disco e se ganhássemos o prêmio, ele subiria ao palco conosco para receber a honraria e muito provavelmente faria um breve discurso de agradecimento, em nome de sua gravadora. 

Logo que as luzes apagaram-se, entrou em cena o "Massacration" e mediante uma tentativa de interação com o público, o seu vocalista propôs que todos nós ali presentes levantassem-se para prestar em voz alta, um "juramento de fidelidade ao Heavy-Metal", e a plateia levantou-se incontinente para participar da palhaçada, menos eu. 

Tenho uma adversidade bem grande com esse tipo de expediente de artista que dá voz de comando para fazer o público de tolo. Por isso recusei-me a participar, ao permanecer sentado e já profundamente entediado com um começo de festa/premiação que começara mal para o meu gosto. 

O show desses rapazes era uma galhofa, mas muitos incautos levavam a sério, ao considerar tratar-se de uma banda de Heavy-Metal verdadeiramente e eu ali a torcer para acabar logo e sob a dúvida cruel sobre definir o que seria mais entediante: o Heavy-Metal ou a paródia dele?  

Enfim, logo os apresentadores começaram a anunciar as categorias e os diversos premiados a subirem ao palco e fazerem os seus discursos, uns bem piegas ao estilo do "Oscar", outros a se portarem de forma debochada e houveram até alguns que quiseram aproveitar para expressar alguma opinião política. 

O segundo show seria supostamente de uma banda séria, mas como levar a sério a cena "indie", eis a questão.

Por ética e compaixão, não vou citar o nome da banda, mas digo que foi mais uma banda a autoproclamar como representante do "Rock'n Roll", mas que na verdade praticava o sofrível Punk-Rock raquítico de sempre e a misturando elementos do folclore nordestino em sua obra, certamente a conspurcá-lo.

Creio poucas vezes ter visto uma banda tão ruim e com a ressalva de que atravessei os anos oitenta e noventa inteiros a verificar com perplexidade artistas dessa qualidade sofrível e o pior, a serem endeusados por setores da crítica, a revelar uma inversão de valores insuportável. 

Foi o caso desses garotos e para piorar, eles apresentaram-se a usarem apenas fraldas geriátricas como figurino, portanto a trazer-nos tal dissabor a mais. Bem, não resisto... a música que produziam justificara o uso de fraldas, pelo teor do material expelido. 

Já no meio da apresentação dessa banda e que era muito incensada pela imprensa na época, muita gente retirou-se do recinto, mas eu fiquei e aplaudi educadamente a cada final de música, embora não tivesse tal obrigação moral, visto estar desgostoso com a performance horrorosa do referido artista. 

Então, após mais algumas nomeações anunciadas e prêmios outorgados, eis que surgiu a figura do "Seu Jorge". Não sou nenhum fã da sua obra, mas foi um bálsamo assistir a sua apresentação intimista, só com ele & violão a acompanhar-se sozinho. 

Após um simulacro de Heavy-Metal e uma banda indie ruim em demasia, ouvir alguém com a proposta cartesiana de cantar e tocar dentro dos parâmetros do que habituamo-nos a chamar como "música" em tempos de outrora, foi um alívio. 

Nessa altura, da comitiva do Pedra, eu fui o único sentado e a aplaudir educadamente os artistas que apresentavam-se e também as nomeações. Neste caso, todos os meus colegas alegaram que desejavam "fumar" e simplesmente abandonaram o recinto (e o evento), para não retornarem mais e claro que as rodinhas de conversas e as cervejas lá de fora deveriam estar mais agradáveis, sem contar os famigerados cigarros em si. Veio o Made in Brazil e o seu Rock tradicional foi tocado com o teatro já quase vazio, uma grande pena. 

Não vencemos. Foram dez ou doze álbuns a concorrerem conosco e o nosso ficou em terceiro ou quarto lugar, não recordo-me ao certo, mediante um parâmetro ditado por votação de jornalistas especializados.

Duas grandes feras da bateria no Rock Brasileiro: Ivan Scartezini e Franklin Paolillo. Foto: Grace Lagôa

Ficamos contentes em termos sido nomeados e uma banda como a nossa, fora do espectro mainstream e também fora do mundo "indie", foi "outsider dos outsiders", portanto ficamos até surpreendidos com a nomeação. 

Dias depois, ao comentarmos sobre essa noite, um membro da nossa banda disse ter ficado chateado comigo. O seu argumento foi que a minha atitude de não levantar-me para atender o comando do "vocalista" do "Massacration" para participar da interação cênica por ele proposta, fora uma decisão errada que eu tomara, pois poderia passar a imagem de arrogância de minha parte, e por conseguinte, respingar sobre a banda, a nos estigmatizr como artistas "blasé" naquele instante. 

Ao prosseguir, ele falou-me que se fosse um prêmio mais requintado como os prêmios Sharp, MTV Awards ou o Multishow e estivéssemos a sermos filmados, uma atitude dessas flagrada por uma câmera, teria causado uma péssima impressão para a banda e para eu mesmo. 

Eu ponderei sobre tal observação e concordei, pois foi verdade sob esse ponto de vista, contudo, de pronto coloquei também um outro lado da medalha e que se tornara indiscutível: - e vocês que saíram para fumar um cigarro antes da metade da cerimônia e não voltaram mais, isso também não seria interpretado como um desdém se fosse num prêmio mais requintado?"

Como última lembrança dessa noite de outubro de 2007, o fato de que dois atores fantasiados como "vacas", o animal símbolo e também logotipo do achocolatado, faziam gracejos o tempo todo no palco e a plateia, mesmo formada por artistas e produtores musicais em maioria absoluta, não perdoou e criou vários coros ofensivos em tom de pilhéria, a fazer menção aos animais em questão, mas com forte conotação sexual. Não tem jeito, é o povo brasileiro, sempre a se portar como se estivesse em um estádio de futebol, com a sua deselegância padrão costumeira.

Continua...

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