quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Autobiografia na Música - Patrulha do Espaço - Capítulo 285 - Por Luiz Domingues

Falo sobre as canções, agora...

"Rock com Roll" do áudio do disco

Eis o Link para escutar no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=yuGB3y3B3U0


1) Rock com Roll (Marcello Schevano - Rolando Castello Junior)

O riff primordial se mostra bem "ganchudo", lembra bastante o Hard-Rock setentista de bandas como o Bachman Turner Overdrive, Blue Oyster Cult e Foghat, ou seja, apesar do peso e da contundência instrumental absurda, tem um quê de Pop, por incrível que pareça. 

As duas guitarras trabalham com uma composição de sobreposições muito inteligentes, como se tivéssemos a ensaiado à exaustão, ou mesmo se a tocássemos ao vivo nos shows, há tempos, mas como já esclareci antes, não foi o caso. Marcello e Rodrigo se acertaram em pouco tempo e ficou tudo espetacular, ao meu ver. 

O Rolando Castello Junior arrebenta como de costume, com uma condução mega inspirada e as suas costumeiras viradas impossíveis. Não gostei do som do bumbo logo no começo, ao fazer acentos ainda com a ausência do restante da banda, mas não pelo arranjo e muito menos pela performance dele que é perfeita, mas pelo timbre que o deixou "latoso". Ao exagerar muito na sensação do "kicking", mas creio que isso tenha ocorrido na masterização que trouxe uma sonoridade muita aguda para o disco inteiro e aí, eis que prejudicou especificamente o bumbo, nessa música, justamente pelo fato dele ter ficado proeminente pela ausência da banda naquele trecho. 

No caso do baixo, usei o Fender Precision e assim como tudo ficou agudo ao extremo por conta da masterização, ele nunca soou tão agudo, em nenhum outro disco que gravei, ao usá-lo. Alguns graus menos, teria ficado melhor ao meu ver, mas também não posso me queixar de ouvi-lo assim tão agressivo. Parece o baixo do Phil Lynott (Thin Lizzy), mas elevado ao cubo, para cortar como uma lâmina de tão afiado que ficou.

Sobre o meu arranjo pessoal, fiz uma frase de difícil execução na parte da introdução, que também serve ao refrão e naquela rapidez e com aquele timbre agudo, impressiona, admito. No restante, fiquei mais comedido, sob uma condução de Rock'n' Roll tradicional, ao recorrer à escalas cinquentistas, mas acho que foi o que a música pediu e me dou ao luxo de usar o recurso de passar pela 9ª; 9ª aumentada e décima, um recurso estilístico mais usado nos anos setenta, e que eu gosto muito. 

Os solos e contra solos dos nossos guitarristas são ótimos, gosto muito. Tem um interlúdio com a base a deixar acordes soltos, muito boa e o solo é bastante melodioso. O slide no fim é muito bem colocado, também.

O vocal do Marcello é bem no seu estilo de voz, com aquele grave natural que ele tem, mas a rasgar, quase ao chegar na rouquidão. 

Os backing vocals estão muito precisos e por incrível que pareça, a minha voz parece de forma cristalina, e por força da natureza, eu, entre os três cantores da banda fui o que tinha a menor emissão natural e por isso sempre evitei cantar solo, apesar do Rodrigo sempre ter me incentivado a fazê-lo. 

Sobre a letra, acho que é uma boa sacada como resolução e apesar de alguns clichês que eu não escreveria se fosse o seu autor, acho o mote bom. 

Tal letra surgiu de uma ideia tirada de uma resposta que eu mesmo dei certa vez em um programa de TV, que gerou risadas generalizadas. Indagado sobre o que eu achava de bandas moderninhas que faziam "misturas" inusitadas em sua obra, eu ironizei, ao responder ao meu interlocutor que a Patrulha do Espaço também fazia uma mistura insólita: misturávamos "Rock com Roll!"

Tal piada desconcertante fora proferida muito tempo antes, mas o Junior havia adorado a ironia implícita e que batia nos críticos buscadores de artistas novos, não pela qualidade de seu trabalho, mas pela simples menção de ser "esquisito", propositalmente.

2) Vou Rolar (Marcello Schevano - Rolando Castello Junior) 

"Vou Rolar", do áudio do Disco

Eis o Link para escutar no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=fPXEQ0q5LX4

Essa música tem uma letra que eu gosto bastante, pois tem um significado interno para todos nós que vivemos essa banda nesses quase seis anos em que ficamos juntos. Fala da estrada e sobretudo do que fazia valer a pena todo o esforço e sacrifício pessoal de cada uma para fazer turnês exaustivas e sob um patamar de estrutura de artista underground e não dos mega stars, ou seja, o prazer de se chegar em uma cidade e deparar-se com a alegria dos fãs, que ao desconhecerem os seus problemas para poder concretizar a chegada ali, nos respondiam com muita emoção.

São citadas as cidades de São Carlos-SP, São José do Rio Preto-SP, Chapecó-SC e São Leopoldo-RS, de forma explícita, localidades onde sempre fomos ovacionados por plateias Rockers quentíssimas.

Sobre a parte musical, trata-se de um riff mega "ganchudo", a lembrar o trabalho do "AC/DC" em sua introdução, mas há outras influências ali. Acredito que a intervenção do slide deixa algo do "Uriah Heep", claramente inserido. A condução "tribal" criada pelo Junior, é sensacional e detém um peso mastodôntico, ao lembrar muito o som de Roger Taylor em suas intervenções mais Hard-Rock, nos primeiros discos do Queen. 

A passagem para parte "A" traz um peso impressionante, a lembrar o som do "UFO", e me deixa com a impressão de que uma divisão "Panzer" está a passar por cima do peito. Gosto do interlúdio que traz uma dinâmica, e a intervenção do baixo a estabelecer um looping com a cabeça do acorde sempre em uma nota só e as demais a se intercalarem em quinta justa, quinta diminuta, quarta justa...

Sobre o baixo, o Fender Precision, este roncou forte mais uma vez. Menos ardido que o da faixa anterior, mas não muita coisa, ele rasga com um agudo impressionante, metálico. Inevitável não se lembrar mais uma vez do som do baixo do Phil Lynott.

A opção por abrir o disco com duas músicas desse teor, no limiar do Hard-Rock, e ambas com a voz rasgada do Marcello foi ousada, mas ao se pensar em um público bem fã da banda, acho que agrada em cheio. Em termos comerciais não teria sido uma boa escolha, mas uma banda como a Patrulha do Espaço nem pensava em agradar alguém que não fosse o seu público cativo, portanto, ficou de bom tamanho.

3) One Nighter (Marcello Schevano - Rolando Castello Junior)

"One Nighter", do áudio do disco

Eis o Link para escutar no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=itgjuo8yyW0

Aqui, a opção é um Funk-Rock bem setentista, e é inevitável não se lembrar de bandas como James Gang, Aerosmith, Trapeze, e o próprio, Deep Purple em sua fase Mark III, mas sobretudo, Mark IV

O riff inicial é bem no estilo do Aerosmith em sua fase setentista, com peso de Hard-Rock, mas a trazer o balanço da Black Music. O peso do baixo nesse riff é absurdo e com o brilho do Fender Precision, ficou matador. Nem o Tom Hamilton eu creio ter gravado com um Precision nesses termos, embora geralmente nos discos do Aerosmith e principalmente nos primeiros, dos anos setenta, foi algo nesse patamar.

A parte "B" explicita o lado mais "Trapeze", e aí é funk setentista mesmo, sem concessões. Muita guitarra "cutucada" e o baixo a "suingar" forte, com o Precision a roncar forte e lembrar bastante o som do Glenn Hughes.

O Rolando Castello Junior também"suinga" forte, ao lembrar bastante a quebradeira típica proporcionada pelo saudoso, Pedrinho Batera (Som Nosso de Cada Dia), mas com as suas costumeiras viradas violentas, é claro. Há um interlúdio para um solo que é bastante dentro do suingue do Funk-Rock, mas com um solo de uma delicadeza ímpar, extremamente melodioso. 

De minha parte, eu faço algumas evoluções inspiradas em bandas funk setentistas como o Funkadelic/Parliament, Kool & the Gang, Earth, Wind & Fire e acho que "ornou" bem com o espírito da canção. 

Na parte "A", o Marcello canta e rasga como nas músicas anteriores e finalmente o Rodrigo intervém com uma voz solo, a conduzir a parte "B". Ambos cantaram muito bem, cada um no seu estilo.

Não gosto da letra, pois acho que cai na vala comum de muitas bandas que insistem em temática sexista/machista/porcochauvinista etc. Acho que destoa dos princípios que nortearam o clima do "Chronophagia", mas foi o tal negócio, o clima já não era de união total na banda em torno desses ideais e escorregadas desse tipo foram até compreensíveis. Tudo bem, garotas "One Nighter" são comuns nos bastidores de bandas de Rock, principalmente em longas turnês, mas do jeito que a canção desenvolveu-se, parece que éramos norte-americanos e o nosso ônibus carregava um harém nas turnês, e claro que isso não foi a nossa realidade para nós, pobres Rockers tupiniquins.

Apesar disso, é divertidíssima a intervenção vocal do Junior ao final da canção, ao pronunciar a expressão: "One Nighter" em tom jocoso e com aquele vozeirão grave, de fato ficou engraçado e a se parecer com a voz do cantor Barry White. Tanto que ele mesmo brincou com isso e citou tal cantor na ficha técnica ("Vocal Barry White"). 

A risada que ele deu foi absolutamente espontânea ao final. E durou muito mais que os poucos segundos que ficaram registrados no disco. Contagiou o estúdio inteiro e demorou para pararmos de rir, pois foi engraçado ao extremo.

4) Trampolim (Rodrigo Hid)

"Trampolim", do áudio do disco

Eis o Link para escutar no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=VfhryfcA95w


Finalmente uma canção para abaixar a adrenalina, aqui sim, o clima "Chonophágico" renasceu. "Trampolim" trata-se de uma das mais belas canções da nossa formação inteira, ao meu ver. 

Rodrigo sempre trazia uma canção "Beatle" na manga, em todo disco, mas desta vez, superou-se, e digo isso sem nenhum demérito às suas canções de discos anteriores que são belíssimas, mas "Trampolim" é realmente uma que poderia estar em qualquer disco dos Beatles, ou do Paul McCartney solo, pois é de uma qualidade melódica e harmônica incrível. 

Tudo é bonito nela. Desde a introdução, com a harmonia doce levada ao violão, apoiada pelo slide brilhante, a tecer uma voz de guitarra extremamente melodiosa, das mais inspiradas. 

A interpretação vocal do Rodrigo é perfeita. Lembra o estilo de Paul McCartney é claro, mas tem muito de Rock brasileiro setentista, e também da MPB hippie e maravilhosa, praticada nessa década. 

Gravei com Rickenbacker e isso acentuou ainda mais o McCartney explícito, embora eu tenha recorrido à chave de captadores para baixo, a explorar o médio-agudo mais ao sabor "Prog". Nesses termos, para ouvidos mais atentos, vai lembrar o som do Beto Guedes, podem reparar. Gosto muito dessa escolha, não apenas pelo timbre do "RK", como as soluções que criei para compor minha linha de baixo. 

E para realçar ainda mais o estilo McCartney, a entrada do órgão Hammond ao final lembra a clássica canção: "Maybe I'm Amazed", e a interpretação vocal do Rodrigo explode, inclusive com a aparição de um segundo canal com um vocalise estratégico a desenhar uma melodia diferente. 

O Rolando Castello Junior montou uma bateria perfeita, com apenas pontuais intervenções mais fortes, a realçar a melodia. Marcello arrebenta no slide, sem dúvida uma de suas melhores criações de contra-solos em todos os discos da Patrulha do Espaço em que ele gravou.  

A letra é linda, e aí sim no espírito com o qual nos unimos ainda fora da Patrulha do Espaço, eu, Rodrigo e Marcello e criamos o projeto do Sidharta, com toda aquela atmosfera 1960 & 1970. Rodrigo usa da poesia e da metáfora com muita propriedade, para nos mostrar mais uma vez que também é um poeta, e ali, no subliminar, há uma dose de espiritualidade sutil em algumas colocações.

"Estou chegando na ponta de um trampolim,

O mergulho vai ser para dentro de mim

Na minha mente paira a eterna ideia da missão, pois cada passo é um passo e cada tropeço, a lição

A vida é um novelo de lã, e eu...o gato a brincar com moinho de vento"

5) Quando a Paixão te Alcançar (Marcello Schevano - Rodrigo Hid - Rolando Castello Junior)

"Quando a Paixão te Alcançar" do áudio do disco:

Eis o Link para escutar no You Tube:

https://www.youtube.com/watch?v=X2IBMkk47Do

Mais uma canção com acento de Funk-Rock, mas aqui mais próxima da Soul Music. Tem muito balanço, e uma sensualidade implícita que remonta de certa forma ao trabalho solo de Rod Stewart nos anos setenta. 

Ela se inicia com uma insinuação de guitarras como se fosse uma jam-session livre e nesse caso, com o som "apodrecido", como se estivesse a ser escutado em um radinho de pilhas com as frequências esmagadas pelos falantes "liliputianos" desse tipo de aparelho sonoro. No entanto, quando começa para valer, tudo clareia e a banda entra com peso e timbre, naturalmente. 

Entrecortado ritmicamente, lembra bastante o som do Santana, ainda mais com a presença de uma percussão descoladíssima que o Junior concebeu e gravou com a apoio do nosso amigo Junior Muelas. Com Cowbell e o Guiro (no Brasil, este instrumento costuma ser chamado como "Reco Reco"), o balanço que essa música ganhou foi impressionante, e se tornou mesmo um atrativo e tanto para a banda.

As guitarras "cutucam" o tempo todo e o baixo segue na linha da Soul Music, a buscar o máximo do balanço. 

Gravei com Fender Jazz Bass, para buscar o registro mais grave, aveludado, principalmente ao pensar nesse sabor da "Soul Music", mas o baixo ficou com um brilho agudo além da conta, graças à masterização, todavia eu não me queixo, por que ficou incrível, mesmo não que não tenha sido exatamente o timbre que eu planejava para tal canção. Portanto, tem o peso normal de um baixo Fender Jazz Bass, mas com um metálico brilhante incomum, porém muito bonito, em minha opinião. 

Em alguns momentos, o Junior improvisou uma batida bem ao estilo do "Deep Purple", a lembrar a canção: "You Fool no One". Foi improviso mesmo em sua gravação e quando eu gravei o baixo separadamente, claro que realcei isso, ao fazer um desenho de reforço rítmico e o recurso da tônica e oitava. E acho que ficou muito bonito.  

Há um interlúdio para a intervenção de um solo em duo, que é um primor na minha opinião. Ali, baixou como incorporação mesmo, o espírito do "Wishbone Ash", e é tão bonito que toda vez que eu escuto, fico a torcer para se alongar, mas infelizmente é uma parte curta, com três módulos apenas, com direito a uma subida de tom, na terceira repetição. Sutil, mas linda igualmente, é a presença de um piano Fender Rhodes nesse trecho. 

Ao final, o Marcello gravou um solo curto, mas eficiente de saxofone. A sua incrível capacidade para dominar inúmeros instrumentos mais uma vez trouxe esse brilho extra para a banda, certamente. 

A interpretação vocal do Rodrigo é boa, como sempre, mas mais uma vez acho que a letra deixa a desejar. Ao tratar de sensualidade, e falar de conquistas noturnas hedonistas, não foi a melhor solução para se escrever, ao menos para o meu gosto e ainda a pensar nos princípios que estavam se esvair nessa fase da banda, infelizmente.
Mas eu entendo que a música detém uma sensualidade implícita, e falar de gnomos ou seres extraterrestres talvez destoasse de sua intenção.

6) Tão Perto Tão Distante (Marcello Schevano)

Vídeo montado por um fã, provavelmente para homenagear a sua namorada, pelo teor das fotos editadas, mas positivo pela iniciativa de usar a nossa música como sua inspiração romântica.

Eis o Link para assistir no YouTube :

https://www.youtube.com/watch?v=dUIrdHqi3u8 

Quando o Marcello nos mostrou essa canção nos ensaios, para definir o repertório desse disco, claro que a tratamos como a uma composição fortemente inspirada no Prog-Rock setentista, mas em alguns aspectos, ela tem muito a influência de Southern Rock, e nessa junção bastante improvável, acho que acertamos a mão no arranjo, ao usarmos as duas influências com coesão. 

Bem, assim como "Trampolim" do Rodrigo, "Tão Perto Tão Distante" é também uma canção belíssima, pela melodia, harmonia, letra e arranjo final. Acho-a uma das melhores do disco, com muito sentimento e profundidade. 

Claro que para quem aprecia as estéticas dos anos setenta, só de se ouvir a introdução com um órgão Hammond pontuado pela caixa Leslie, tal efeito já desperta a simpatia imediata.  

O piano acústico a desenhar por baixo é belíssimo. É uma sutileza mixada para ficar quase imperceptível, mas convido o leitor a prestar atenção nesse detalhe. 

O Rodrigo desta vez foi quem pilotou os contra-solos de slide e brilhou muito. Foram muito lindos os desenhos que criou. E é na parte B que mais se parece Southern Rock norte-americano, a lembrar bastante o som do The Allman Brothers Band. 

 Gravei com Rickembacker, mais pensando em Prog Rock inglês do que Southern Rock americano, mas se tivesse optado pelo Fender Precision, acho que teria sido correto também.

Sobre o RK, o timbre agressivo deixou-o tão marcante, que nesse caso, eu acho que dei sorte com a masterização que realçou agudos no resultado final. Nem foi o caso pela docilidade da canção (com exceção do solo de Hammond, mais proeminente), mas ficou espetacular. Nos discos do Pedra, o som do meu "RK" ficou bom, mas acredito que neste disco da Patrulha do Espaço, eu alcancei o melhor resultado sonoro com tal instrumento, mesmo que tenha sido um golpe fortuito da sorte, graças ao efeito involuntário da masterização final. 

Um lindo solo de Hammond executado pelo Marcello, lembra bastante o som de bandas Prog-Rock britânicas. É portanto, bem Rick Wakeman para se citar uma referência clássica. Intervenções pontuais de sintetizador, são sutis, mas estão lá, igualmente, basta que o ouvinte preste atenção. 

Sobre a voz principal, a interpretação mais suave do Marcello que mais contrastava com vocais mais rasgados, lembra bastante a voz do Tim Maia em baladas Soul. Gosto bastante. 

A letra se mostra com uma certa intenção romântica, mas acho que o Marcello foi feliz e não correu nenhum risco de soar piegas, um perigo constante para quem se propõe a abordar o tema.

7) Universo Paralelo (Marcello Schevano - Rodrigo Hid - Luiz Domingues- Rolando Castello Junior)

"Universo Conspirante", do áudio do disco

Eis o Link para escutar no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=LDcfa4iB8i4

Essa foi a única música que tínhamos antes de nos reunirmos para definir o repertório do disco e até já a tocávamos nos shows, em 2003. Fruto de uma jam-sessiom, foi criação coletiva, daí os nomes de todos na assinatura da composição, embora o riff primordial tenha sido uma ideia do Marcello. Bem, aqui se trata de Blues-Rock, mais ou menos na linha de "São Paulo City", do disco anterior, mas com certos elementos do Jazz-Rock em sua constituição. 

O riff inicial é poderoso e as partes "A" e "B" são muito fortes, com uma intensidade impressionante. A linha melódica que costura o riff e é cantada em coro por nós três (eu, Marcello e Rodrigo), no refrão, tem uma força dramática enorme. Gosto bastante da parte "A" cantada pelo Rodrigo, também entrecortada ao riff. 

Tudo soa poderoso na música, com um peso incrível, e o solo tem uma parte feita em duo, mais uma vez a lembrar o trabalho do "Wishbone Ash", mas aqui com mais peso do Blues-Rock do "Mountain", "Blue Cheer" etc. 

A letra, como eu já revelei em capítulo anterior, foi escrita no último dia de nossa permanência no estúdio/chácara "Área '13". Lembro-me do Rolando Castello Junior a finalizá-la ao ar livre, ao buscar inspiração no bucolismo ali presente. Contudo, a letra nada tem de "silvestre", e pelo contrário, é densa, super urbana e tem como tema a teoria da conspiração, vista de forma generalizada, poder oculto e manipulação. Acho que é uma letra forte e que condiz com a densidade da música.

8) Phrâna (Marcello Schevano)

"Phrâna" do áudio do disco:

Eis o Link para escutar no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=FM8i4CLv9yA

Essa canção ultra Prog-Folk e hippie ao extremo e o Marcello a havia composto há muito tempo. Mas nós nunca havíamos tido tempo para nos dedicarmos à ela, anteriormente. Reputo ter sido uma ótima ideia incluí-la no disco, pois é de uma beleza incrível, super a ver com o espírito perdido na banda, e o seu arranjo ficou maravilhoso. 

Canção em 6/8, mais ou menos a resgatar a linha de "Céu Elétrico", tem aquele sabor Prog-Rock-Folk setentista e evoca também o Folk tupiniquim, com o Rock rural de Sá/Rodrix & Guarabyra, Secos & Molhados, Bendegó, Flying Banana e tantos outros exemplos de artistas setentistas e sensacionais que apreciávamos. 

O trabalho de violões de Rodrigo e Marcello é magnífico. Fazem tantos dedilhados inspirados que chegam a lembrar o som flamenco e intrincado de Paco de Lucia e congêneres. 

O meu Rickenbacker falou alto mais uma vez. Aquele médio-agudo encorpado que ali gravei, é um dos melhores sons de "RK" que já gravei na vida. 

Gosto muito das sutis percussões que estão ali inseridas, a auxiliar a bateria corretíssima que o Junior criou. 

Marcello a canta com intensidade e os backing vocals são muito bonitos. Há uma intervenção rápida de flauta do Marcello, para um micro solo. 

A letra é toda calcada em espiritualidade de viés hippie e a buscar referências na Índia. Fala em "prana", a energia vital que se espalha no ar e através da respiração, segundo os yogis, é passível de ser absorvida por qualquer pessoa, a promover o seu bem-estar. 

Tenho uma séria dúvida sobre o título, em termos de ortografia. Creio que a maneira correta de se escrever seria "prana", sem o h adicional e o acento circunflexo na primeira letra "a". Em sânscrito transcrito em caracteres ocidentais, existiria um acento exótico para nós, sobre a primeira letra "a", algo como um "underline", mas do jeito que o Marcello quis que ficasse "Phrâna" na escrita definitiva, receio não fazer sentido, e pode até induzir algumas pessoas a interpretarem a junção "PH", com a fonética antiga do "F", e assim a chamar a música de "Frana", erroneamente. Paciência...

9) Anjo do Sol (Rodrigo Hid)

"Anjo do Sol" diretamente do áudio do disco:

Eiso Link para escutar no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=aZQsaGJ_vPg

Eis aqui um tema eminentemente Prog-Rock. Rodrigo o trouxe praticamente pronto em sua mente e nós só montamos as parte da suíte, para arranjá-la, paulatinamente. Bem, como peça tipicamente "prog" setentista, tem muitas imagens sobrepostas, como em um grande mosaico. 

A sua introdução ao piano é muito bonita, ao trazer uma harmonia um tanto quanto melancólica, ao estilo do "King Crimson", e eu sei o quanto a obra do grande Rei Escarlate influencia o Rodrigo bem e ainda bem! Seguem outras partes com intensa massa instrumental. Logo de início, ao sair do piano solo, a banda mergulha sob uma progressão de dois acordes sob aceleração total, e que lembra bastante o trabalho da fantástica banda italiana Prog-Rock, "Banco Del Muttuo Soccorso".

A seguir, partes diferentes propõem mudanças frenéticas. Uma rápida intervenção que lembra o estilo do "Emerson/Lake & Palmer", emenda-se em um passeio de órgão Hammond, bastante ao sabor do "Focus" e do "Atomic Rooster". 

Convenções muito rápidas e precisas abrem o caminho para um final apoteótico que lembra muito o trabalho do "Genesis" em canções épicas como "Supper's Ready" e "Afterglow". Com um vocal muito emocionante, cantado por nós três da linha de frente em vocalise, realmente é muito bonito e inspirador. Acho que é uma das músicas mais emocionantes no disco, e foi uma pena que tenha sido tão pouco executada ao vivo, pois nos emocionava e nas poucas vezes que a tocamos, causou comoção no público, principalmente pelo trecho final com apelo apoteótico e muito melodioso. 

Gravei com Rickenbacker e mais uma vez o som ficou matador. Acho que eu já mencionei amplamente o fator que gerou essa carga a mais de agudos no disco inteiro, mas no caso específico do Rickenbacker, que é um baixo que poucos técnicos sabem gravar no Brasil, acho que tive uma sorte incrível, pois ele soa exatamente como deve soar. Sobre os demais instrumentos, todos brilham muito. Junior massacra na bateria, ao fazer levadas e frases que só bateristas de altíssimo nível fariam, e esse é o seu caso, naturalmente. 

Marcello faz um fraseado belíssimo de guitarra que só realçou a parte final ainda mais. É um item que ajudou decisivamente a criar a emoção que eu mencionei anteriormente. As intervenções de sintetizadores também são muito boas. Música instrumental por excelência, acho que teve no vocalise algo tão significativo que realmente dispensou a palavra cantada.

10) For Loonies Only (Rolando Castello Junior)  

"For Loonies Only", áudio diretamente do disco:

Eis o Link para escutar no You Tube:

https://www.youtube.com/watch?v=VOK_G0uur6Q 

Uma tradição iniciada no CD Chronophagia, o Junior sempre gravava uma vinheta instrumental somente de bateria, geralmente um improviso gravado a esmo após encerrar a gravação de todas as baterias do disco. Desta feita no entanto, ele planejou a sua performance e trabalhou com os técnicos alguns efeitos interessantes com "delay". 

 O título em inglês com a qual ele a designou, diz tudo: "para lunáticos apenas", é uma boa menção à loucura, e entendido à luz do desbunde contracultural sessenta-setentista, tal menção à loucura é um elogio e não me refiro a Erasmo de Rotterdam.

11) Véu do Amanhã : A) O Agora / B) A Confortante Incerteza do Futuro (Marcello Schevano)

"Véu do Amanhã" , do áudio do disco

Eis o Link para escutar no You Tube :
https://www.youtube.com/watch?v=HmS9_xyHe1E

Bem, aqui temos mais um tema Prog-Rock do disco, e desta feita para radicalizar ainda mais que "Anjo do Sol", pois a letra da canção mergulha em considerações subjetivas sobre a expectativa do homem em relação ao tempo-espaço, ou seja, um hermetismo nada Pop, mas que eu defendo enfaticamente enquanto peça artística, e que se danem os que enxergam música como produto de gôndola de supermercado. 

Sobre a parte musical, a simples menção a dois subtítulos, já deixa clara a intenção de ser uma peça Prog-Rock sem concessões, a rezar pela cartilha setentista do gênero. A iniciar-se com um belo prólogo comandado pelo piano, contém intervenções muito bonitas da guitarra do Rodrigo, e entrecortadas pela bateria e o baixo Rickenbacker que mais uma vez rasga na carne, com o seu potencial de peso e timbre inigualáveis. 

Logo o apoio do órgão Hammond chega, e o peso toma conta. Também com apoio de sintetizadores, ao estilo Moog, intrincadas partes fazem com que todos os instrumentistas brilhem bastante em seus arranjos pessoais. A referência ao som de bandas tais como: "Emerson/ Lake & Palmer", "Banco Del Muttuo Soccorso", "Triumvirat", "Trace" e "Omega", para citar algumas poucas bandas Prog-rock dessa seara setentista, é total. São partes bastante agressivas e exigiram muito dos quatro instrumentistas.

A parte final tem uma particularidade engraçada, até. A despeito de sua beleza incrível, a frase contínua e ultra melódica que o Rodrigo criou na guitarra, lembra de certa forma, a melodia da música "Leãozinho", do Caetano Veloso. Não se trata de plágio, não caracteriza ipsis litteris tal semelhança, mas lembra-a vagamente e assim, claro que brincadeiras surgiram já desde os ensaios que fecharam o arranjo da música. Independente disso, a parte final também executada em sentido de "looping", tal qual "Anjo do Sol", emociona, e muito.

Por fim, há uma intervenção robótica ao final, e que lembra a parte final da "Karn Evil 9/Third Impression", do "Emerson/Lake & Palmer", portanto, é bastante interessante.  

Sobre o meu baixo, mais uma vez o som do Rickenbacker ficou excelente, para me deixar bastante satisfeito com o resultado. 

Isso é "Missão na Área 13", um disco gravado sem muito planejamento, mas que diante das circunstâncias, ficou muito melhor que os anteriores no quesito do áudio.  

Agradeço muito a Fabio Poles, Gustavo Vasquez e Alberto Sabella, que nos proporcionaram tal oportunidade de usar o seu ótimo estúdio, e sobretudo pelo empenho que tiveram para operar essa gravação, com carinho, para torná-la a melhor gravação que a Patrulha do Espaço teve em nossa formação, e quiçá da carreira toda, ao menos até aquele ponto. 

Agradeço também a Junior Muelas, que ajudou muito no processo todo.

Continua...

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