sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Autobiografia na Música - Patrulha do Espaço - Capítulo 289 - Por Luiz Domingues

Viajamos para Chapecó-SC no período da tarde, com muita tranquilidade. Conforme eu já disse anteriormente, fãs da banda, Rockers de Concórdia-SC, viajaram conosco no ônibus, e tudo foi bastante amistoso, sob o frio vespertino moderado desse início de maio.

Pelo caminho, ficamos bastante admirados por ver que na encosta da estrada haviam muitas propriedades rurais cuja atividade principal era a suinocultura e quase todas, para não dizer todas, ostentavam placas explicativas a dar conta que sua produção destinava-se a fornecer para indústrias frigoríficas renomadas nacionalmente, e situadas na região de Chapecó. Realmente era (é) a base da pujança daquela cidade do oeste catarinense e de toda a região.

Quando chegamos na cidade, fomos direto ao pavilhão onde realizar-se-ia o Festival Sonora 2004, em que aliás, éramos uma das atrações. Seríamos o sub "Headliner" da noite, com a presença de uma banda "estourada" no mainstream e que era muitíssimo antagônica aos nossos ideais, princípios & estética.Tratava-se dos skatistas do Charlie Brown Junior, e o seu conceito deturpado do que era o Rock.
Enfim, essa era a dura realidade de se conviver com uma difusão cultural equivocada, caso do Brasil, e para nós Rockers outsiders dentro do que se habituou a chamar de "Rock" desde os anos oitenta, foi bem desconfortável conviver com tais distorções históricas e inversão total de valores.

Não tenho e nunca tive nada contra os componentes da banda citada e não haveria motivo algum para falar mal dos rapazes na época, e muito menos agora, tantos anos depois, e com dois de seus integrantes já a morarem em outra dimensão, contudo, o choque estético foi institucional, naturalmente.

Chegamos ao local do show, verificamos que haviam dois palcos, e ao conversarmos com membros da produção local, soubemos que a montagem do segundo palco fora exigência da produção da banda dos skatistas, pois estes recusavam-se a usar o mesmo palco das demais atrações e sobretudo, o mesmo PA. Isento tal soberba da parte dos rapazes em si, e creio ter sido uma ação da sua equipe, no afã de valorizar seu o produto ao máximo e para conferir-lhe uma exclusividade, com o uso de seu equipamento próprio etc. e tal.
Acostumados a lidar com tal tipo de estrelismo, relevamos e nos concentramos na nossa órbita, ao fazermos o soundcheck e neste caso, o equipamento do palco menor, era de extrema qualidade, com uma pressão para suportar mega festival de estádio de futebol, portanto, não tivemos queixas.

Já com nosso backline no palco e ao ouvirmos o técnico a fazer os primeiros testes preliminares de bateria, lembro-me de estarmos dentro do ônibus e o som do bumbo fez a nosso carro trepidar. Foi uma pressão sonora impressionante e por alguns segundos, achamos que quebraria todas as vidraças do nosso carro.

Feito o soundcheck, fomos levados para o hotel e após o jantar, tivemos uma atividade ligada ao festival, antes do nosso show. Um entrevista ao vivo promovida pelos organizadores que queriam que eu e Junior participássemos. Fiquei impressionado com a reverência com a qual fomos tratados, ao entrarmos em um galpão de grande proporção e ao vermos uma quantidade grande de pessoas, visto que foi uma entrevista aberta ao público em geral.

Havia um mediador a fazer as vezes de um assessor de imprensa e muitos jornalistas da imprensa da cidade e de localidades vizinhas ali presentes.

Quando entramos no galpão, muitos gritos irromperam da parte do público, o que nos surpreendeu muito, pois esperávamos uma entrevista comedida para três ou quatro jornalistas e sem presença de público. Por tal cenário, tivemos que nos comunicar com microfones, a fazermos uso de um pequeno PA disponibilizado para a coletiva.

Bem, as perguntas não surpreenderam e ficaram dentro do trivial sobre a carreira da banda e o panorama do show business. Só achei um pouco demasiado quando insistiram para que falássemos "mal" da banda dos skatistas, que fecharia o festival naquela noite, e de fato, havia uma revolta na cidade, conforme verificamos assim que olhamos o jornal local no hotel, que dava conta em uma reportagem de que havia uma denúncia de super faturamento dos custos do Festival, perpetrados por um político local, provavelmente alguém ligado à secretaria de cultura da prefeitura, e parecia que um vereador também estava envolvido na falcatrua.

Segundo a reportagem do jornal e pelas conversas das pessoas na entrevista, a banda dos skatistas fazia parte da falcatrua, ao apresentar um cachê declarado de um valor e na realidade, por baixo do pano fora um outro montante e sob um patamar milionário. Queriam que nós entrássemos nesse mérito a emitir opinião, mas como isso seria possível? 

Sem provas concretas, sem evidências... e além do mais, mesmo que fosse verdade, duvido que os componentes da banda tivessem ciência do imbróglio, portanto, qualquer declaração nossa nesse sentido, seria no mínimo, leviana.

Mesmo quando a conversa partiu para uma seara mais leve, ao dar conta da soberba da tal banda em recusar-se em tocar com bandas "menores", nós incluso nesse caldeirão, tampouco acho que tal ideia partiria dos rapazes em si. Isso foi uma clara manobra da sua equipe de produção e no calor dos acontecimentos, mesmo tendo sido uma ação antipática perante os outros artistas, eu acho que há uma certa guarida ética, no sentido de que não é nada fácil atingir o mainstream e quando se atinge tal patamar, o empresário da banda tem a obrigação de dar sempre as melhores condições para o seu artista trabalhar e ao ir além, aproveitar todas as circunstâncias para capitalizar vantagens para o seu contratado, a realçar o seu produto.

Claro que não falamos mal dos rapazes por conta disso, mas pessoas da plateia ficaram bem alteradas e se manifestaram contra os skatistas, no entanto, nada poderíamos fazer para conter tais ânimos acirrados. Foi a hora de ir para o show, a última banda local ainda tocava quando fomos conduzidos ao camarim improvisado, próximo ao palco.
Continua...   

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