segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Autobiografia na Música - Patrulha do Espaço - Capítulo 111 - Por Luiz Domingues


Enquanto o ônibus sofria modificações na oficina, cumprimos mais um compromisso próximo. Voltamos então à casa "Volkana", de São Bernardo do Campo-SP e desta feita não arriscamos a féria da bilheteria como das ocasiões anteriores. Mais tranquilos com um cachê fixo, não nos preocupamos com a conversa fora da realidade do folclórico gerente da casa. Mas na realidade nós deveríamos ter nos preocupado, pois o sujeito falava em mutirões de divulgação, como se fosse uma tarefa fácil, mobilizar equipes gigantescas de voluntários e na realidade, mal havia verba para produzir um modesto material de divulgação.

Nesses termos, nós relaxamos e a confiar que eles fariam o máximo para divulgar, ao levar-se em conta que nos pagariam um cachê fixo e sob um valor substancial para os padrões de 2001, não levamos em conta de que na iminência de uma revés, a casa teria problemas para honrar o seu compromisso. Isso sem contar o quanto seria desagradável para nós, artisticamente, tocar em meio a uma casa com um quórum de público aquém de sua capacidade, caso isso acontecesse.

Houve a presença de duas bandas de abertura. Uma delas foi o "Madreterra", um ótima banda da região do Grande ABC, mesmo, e cujo baixista fora um ex-aluno meu, chamado: Marcos Pessoto Lira, um rapaz 100% bacana e ótimo músico.

Tal banda desenvolvia um trabalho próprio muito bom e calcado na escola do Hard-Rock setentista, mas com muitas dificuldades para achar espaços, tinha que necessariamente tocar covers pela noite, para sobreviver. Todavia, mesmo ao ter que usar desse recurso, ao menos tal grupo tocava um repertório agradabilíssimo munido por de covers de grandes bandas internacionais dos anos setenta, e me lembro claramente de haver escutado até algumas peças surpreendentes nessa noite, material oriundo de bandas como: Grand Funk, Uriah Heep, Ten Years After etc.

A outra banda que tocou, foi o "Railway". Sinceramente, não me recordo com muitos detalhes do som deles, tampouco de seus componentes. Só lembro-me que achei agradável também a sonoridade produzida por esses rapazes e provavelmente se tratou de uma banda com influência setentista para eu ficar com essa pálida lembrança de algo simpático aos meus ouvidos.

Infelizmente, o público presente não foi muito grande. O dono da casa nos chamou para uma conversa na hora do acerto de contas e recorreu à clássica choradeira sobre a falta de condições geradas pela féria da noite para honrar integralmente o cachê combinado, a vir à baila.

Todavia, ao contrário da imensa maioria de donos de estabelecimentos dessa categoria, eu reconheço que esse rapaz em particular era extremamente sincero e honesto, e realmente se viu em apuros para cobrir o cachê, pois foi nítido que a bilheteria não cobriria nem a metade do valor do nosso cachê. Com esse rapaz, houve a compreensão de nossa parte e apesar de não ser correto de forma alguma, nós compreendemos e cedemos, para assim aceitarmos o valor do cachê reduzido.

Mas se dependesse de seu gerente, creio que não teríamos tal consideração, pois o sujeito deu um show de amadorismo nessa noite. E a sua atuação sob absoluta canastrice iniciou-se ainda antes do nosso show, com as bandas de abertura ainda a tocar. O sujeito, ao perceber que o movimento da casa não aumentaria, começou a ficar nervoso com a perspectiva de ter de nos dar um cheque com um valor alto, que a bilheteria não lhe garantiria o ressarcimento e dessa forma, tentou sensibilizar-nos da pior maneira possível, ao simular estar a sofrer uma crise estomacal aguda.

Ao usar uma toalha de rosto que apanhara no toilette da casa, dizia estar sob uma crise aguda de úlcera e que sentia ânsia de vômito. Ao contorcer-se, dizia estar com muitas dores e entremeava tais lamentos com frases pseudo-subliminares, a fazer alusão que a dor seria a consequência da "preocupação em nos pagar".
Nota sintética sobre o lançamento do CD Dossiê Volume 4, publicada na Revista Rock Brigade, nº 181, de agosto de 2001

Foi nítido se tratar de um teatro medíocre que estava a fazer, pois sob uma circunstância real de crise, ele já teria saído a correr para um pronto-socorro, sem nenhuma perda de tempo em querer angariar a pena de quem quer que fosse. De certa forma, foi engraçada a cena patética do sujeito com a toalhinha no rosto e claro que o Rodrigo, um imitador nato, já compôs o personagem no camarim e aquilo nos divertiu ali mesmo.
Nota sobre o lançamento do CD Dossiê Volume 4, publicado na Revista Guitar Player nº 64, de agosto de 2001

Lógico que sabíamos que o pouco público presente traria dificuldades para a casa. Foi óbvio que o espaço não tinha reservas para bancar shows e dependia do movimento da bilheteria. Infelizmente foi o que aconteceu, mas como eu já disse, o dono era um rapaz honrado, e sempre nos tratou bem, portanto, acabamos por relevar. Mas se dependesse apenas do gerente e simulacro de ator, a fazer uso da sua indefectível toalhinha...

Isso aconteceu no dia 15 de setembro de 2001, um sábado, e o público presente foi registrado na casa de cento e vinte pessoas presentes. O próximo show seria uma aventura e tanto. Conto a seguir...

Continua...

Autobiografia na Música - Patrulha do Espaço - Capítulo 110 - Por Luiz Domingues


Enquanto o nosso ônibus passava por tais modificações de funilaria e pintura, nós cumprimos um novo compromisso, alguns dias depois do show que fizéramos em Campinas-SP, conforme eu já descrevi anteriormente.

Desta feita, nem que o veículo estivesse à nossa disposição, creio que valeria a pena usá-lo, pois se tratou de um compromisso em uma casa noturna, na movimentada Rua 13 de maio no bairro do Bexiga, em São Paulo, e convenhamos, para estacionar um ônibus nessa via em pleno dia útil, seria uma proeza, com direito a uma carga de aborrecimento, absolutamente desnecessária. 

Dessa forma, nós fomos com os nossos carros particulares mesmo, a despeito de termos sempre um backline bem grande, e que demandava trabalho para transportar.

Enfim, o compromisso ocorreu no Café Aurora, no dia 13 de setembro de 2001 e portanto, em uma quinta-feira, dois dias após o atentado terrorista contra as Torres gêmeas do World Trade Center de Nova York. Lembro-me inclusive que o Junior chegou a proferir algumas considerações sobre o atentado, e assim arrancar alguns gritos da plateia, com tal manifestação.
O surpreendente baterista do Quarto Elétrico, Ivan Scartezini

A banda de abertura foi o "Quarto Elétrico", grupo que apreciávamos muito pela identidade contracultural grande da qual comungávamos, além é claro, da qualidade artística que eles possuíam, e para nós foi um prazer ter uma banda desse quilate para abrilhantar a noite.

Mundo pequeno e sempre surpreendente, pois apenas cinco anos depois, sob uma reviravolta da vida, eu e Rodrigo Hid estaríamos fora da Patrulha do Espaço e a tocarmos em uma nova banda, a qual, o baterista do Quarto Elétrico, Ivan Scartezini, seria o nosso baterista. Enfim, assunto para um outro capítulo da minha autobiografia (Pedra), pode consultar ali, amigo leitor.

Nesse show do Café Aurora, cerca de oitenta pessoas estiveram presentes e entre elas, houve a presença ilustre do grande produtor musical, Antonio Celso Barbieri, que há anos estava radicado em Londres. 
Foto de Antonio Celso Barbieri, de 2015, quando esteve em São Paulo a promover o lançamento de seu livro: "O Livro Negro do Rock"

Barbieri fora produtor de inúmeros shows de Rock nos anos oitenta e produzira muitos para a Patrulha do Espaço e também para A Chave do Sol, a minha banda naquela década, e tais histórias estão contadas devidamente nos capítulos d'A Chave do Sol, também.

Dois dias depois, tivemos um novo compromisso em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista.

Continua...

Autobiografia na Música - Patrulha do Espaço - Capítulo 109 - Por Luiz Domingues


A ideia de pintar o ônibus foi acalentada pelos quatro membros da banda, com muito entusiasmo, porém, não seria apenas uma questão de querer fazer, pois logo descobrimos que para oficializar uma pintura desse tipo no veículo, gastaríamos mais uma verba considerável, e haveria porquanto, a possibilidade de ficar sob judice das autoridades, pois ao contrário do que imaginávamos, inocentemente, ao pensarmos sobre a enorme profusão de veículos conduzidos por hippies nos anos sessenta, para rodar tranquilos, com o veículo regularizado em sua documentação, o trâmite burocrático gerado seria desagradável, principalmente em um país como o Brasil.

Então, ao levarmos em consideração tais dificuldades e somado ao fato de que o funileiro , quando consultado sobre uma possível pintura artística, relutou e deu a entender que não saberia fazê-la corretamente, culminamos por abortar o projeto, lamentavelmente.

Ficamos frustrados, obviamente, pois teria sido um prazer enorme, sob o ponto de vista de nossas predileções contraculturais, além de que possivelmente pudesse ter sido uma propaganda móvel muito benéfica para a banda. Chegamos a cogitar levantar uma verba de patrocínio, mesmo a conspurcar um pouco a pintura psicodélica, mas logo desistimos pois seria um trabalho que demandaria muito tempo e nós estávamos com o carro parado na oficina já em fase de serviço de funilaria (aos cariocas que estiverem a ler, entendam como: "lanternagem"), e o rapaz (aliás nem nós mesmos), não poderia esperar por tal definição financeira para cobrir essa ideia.

O artista plástico que concebeu a pintura, chegou a oferecer-se para pintar pessoalmente, mas precisaríamos de uma garagem adequada, pátio ou estacionamento e haveria toda a estrutura de pintura que sairia cara com a compra não apenas das tintas, mas também de pincéis adequados e material de apoio, fora a questão da sujeira gerada ao redor, inevitável e posterior responsabilidade por possíveis danos causados.

Ele chegou a falar sobre um mutirão, e que traria alguns colegas do atelier do Peticov, e que seria um prazer sensorial para todos, mas infelizmente não tínhamos estrutura para tal e já estávamos inclinados a abortar a missão pelas dificuldades que teríamos com as autoridades de trânsito, na regularização burocrática da documentação do auto.

Não consigo recordar-me do nome desse jovem artista, pupilo de Antonio Peticov, mas lembro-me que graças a ele, nessa mesma época, ajudamos uma ONG de reciclagem de materiais, a doar-lhes uma música para que produzissem assim um CD coletânea com várias bandas. 

O Junior cedeu a música: "Ser", ao extrair o áudio diretamente do CD "Chronophagia". Tal coletânea se chamou: "Música para Reciclar" e a ONG pertencia a uma associação de um bairro da zona norte de São Paulo, não me lembro se Pirituba ou Freguesia do Ó. Nela, havia a presença de bandas novas e desconhecidas e apenas a Patrulha do Espaço e o Tutti-Frutti participariam, como "dinossauros", a conter história longeva.

Dessa maneira, tivemos que optar por uma pintura tradicional e discreta. Mediante uma consulta à loja de tintas, apreciamos um tom de azul bem escuro, que na nomenclatura do catálogo de tintas, se chamava: "Azul Universo".

Gostamos da ideia do ônibus manter uma cor sóbria, e essa discrição ser um fator de segurança, pois também ponderamos que a pintura psicodélica era maravilhosa, mas estávamos em 2001, no Brasil, e não na América do Norte de 1967, portanto, não obstante o fato de ser lindo para o nosso gosto estético, cultural e ideológico, aquilo seria uma chamariz  para atrair fatores potencialmente ruins na estrada, também. Por isso, ao descartarmos a pintura psicodélica, fomos em direção diametralmente oposta, ao optarmos pela segurança, via "camuflagem".

Um outro aspecto dessa parada do nosso ônibus na oficina, veio da parte do Rolando Castello Junior. Quando o funileiro perguntou-nos sobre os frisos, ele, Rolando, foi incontinente na determinação de mandar arrancá-los. Eu fui contra, mas ele persuadiu os garotos, e sob uma eleição feita de última hora, eu perdi nessa escolha.

O ônibus, se tivesse mantido os frisos originais que estavam em bom estado e só precisavam de uma limpeza e polimento, teria obtido um resultado estético muito melhor com a cor escura que escolhêramos, mas com a lataria desnuda, realmente ficou muito feio, ao meu ver. Fora a questão estética, houve o aspecto da segurança, também. Frisos não servem apenas para enfeitar, mas são sustentáculos importantes dos gomos de lata do veículo. Em 2003, passaríamos um apuro na estrada, justamente pela falta desse equipamento importante. Enfim, a viver e aprender, assim estamos sempre.

Continua... 

Autobiografia na Música - Patrulha do Espaço - Capítulo 108 - Por Luiz Domingues


Diante da dificuldade que detectáramos sobre a tarefa de carregar e descarregar o equipamento do ônibus, surgiu a ideia de promover uma transformação na lataria, e assim se abrir um novo caminho mais confortável para o empreendimento de tal tarefa logística. O sócio-motorista indicou-nos um amigo seu, funileiro que detinha experiência com esse tipo de serviço e dessa maneira, fomos até o município de Taboão da Serra, na Grande São Paulo, onde ele morava, e posteriormente à oficina de seu amigo, localizada em um bairro daquela cidade.

Foi o começo de uma era de peregrinações ao universo das oficinas, lojas de autopeças, eletricista de autos, borracheiros e afins, que confesso, sempre detestei, mesmo para cuidar de meu carro particular, quanto mais de um ônibus.

O sujeito em questão foi mais um daqueles típicos personagens desse universo, cheio das malandragens e maneirismos típicos, e claro que eu e qualquer outro membro da banda, destoava disso completamente, e aos olhos dessa gente, éramos presas fáceis para que exercessem a sua nada nobre arte de ludibriar, a usar de terminologia estranha ao nosso vocabulário e métier. Só não foi fatal tal empreitada promovida por tais agentes, por que nesse quesito, o sócio-motorista tomou a dianteira e falou a mesma linguagem desses tipos, porém sob um curto espaço de tempo, ficaríamos à mercê nesse quesito, conforme eu relatarei no andar da cronologia.

Enfim, o tal funileiro avaliou e projetou uma porta lateral no fundo, que facilitaria a tarefa de carga e descarga de equipamentos. A aproveitar o ensejo dessa intervenção, cotamos a pintura do veículo. A pintura original de fábrica não estava ruim, mas e se pudéssemos melhorar a aparência do carro, por que não aproveitar a oportunidade? Pairou contra, a ideia de uma dívida extra, pois ainda tínhamos prestações a pagar do veículo e vários pequenos reparos a serem feitos. Contudo, o preço que o rapaz pediu para pintar o veículo, ficou abaixo da média de mercado e portanto, tornou-se uma oportunidade.

Antes de comentar sobre essa pintura, eu preciso retroagir um pouco, pois mesmo antes dessa possibilidade aparecer, nós já havíamos pensado na pintura, por que algumas conversações já houveram sido mantidas com um artista plástico, que inclusive nos entregou um esboço incrível que nos fez "viajar" nessa hipótese, literalmente.
Os irmãos Peticov, Antonio acima, em foto dos anos sessenta, e André, abaixo, em foto mais atual

Foi assim que ocorreu: o Júnior era amigo dos artistas plásticos, Antonio e André Peticov, desde o final dos anos sessenta. Para quem conhece a história do Rock Brasileiro, sabe bem que esses irmãos tem uma parcela enorme de contribuição à arte de uma maneira geral e interagiram com bandas de Rock, desde essa época, com muita profundidade. Antonio foi uma espécie de mentor dos Mutantes e André foi um dos primeiros artistas a fazer projeções psicodélicas com bolhas, em shows de Rock em São Paulo.

Então, mais ou menos em abril de 2001, eu fui com o Rolando Castello Junior ao atelier do Antonio Peticov, um enorme galpão situado no bairro do Itaim-Bibi, na zona sul de São Paulo para uma visita. Nessa visita, conhecemos um de seus muitos pupilos e quase todos ali eram entusiastas do Rock 1960 / 1970. Algum tempo depois, nos lembramos desse rapaz, pois ele havia se oferecido para nos ajudar com qualquer tipo de lay-out que precisássemos, de cartazes de shows a capas de discos, enfim.

Então o Junior o chamou à sua casa e conversamos sobre a possibilidade dele desenvolver uma pintura psicodélica ao estilo dos ônibus e vans que circulavam na América do Norte, nos anos sessenta, no auge do movimento Hippie. Claro que o rapaz adorou a ideia e alguns dias depois, voltou à casa do Junior com um esboço no papel e também com um "boneco" em mãos para nos mostrar. Para quem não conhece o jargão de quem lida com lay-out gráfico, "boneco" é uma miniatura bem realista de como um produto vai ficar quando pronto, elaborado para o cliente ver e aprovar ou não a sua confecção. Enfim, o ônibus montado em papel que ele nos trouxe, ficara absolutamente incrível! 

Tratou-se  de uma pintura louquíssima, multicolorida e o que a tornara ainda mais fascinante: 100% fidedigna à psicodelia sessentista, por que o conceito "psicodélico", há muito tempo fora deturpado por gente que lida com grafite, ou que estava ligada às tais "raves" de música eletrônica.

Mas não foi o caso desse rapaz, pois como pupilo de Antonio Peticov, ele era naturalmente cônscio sobre a sua fonte primeva, ao saber exatamente o que procurávamos, e ao ir além, claro que desenhou com paixão, pois também amava aquela estética. Portanto, quando tivemos a chance para pintar o nosso ônibus, claro que queríamos aquela pintura psicodélica incrível, no entanto, fatores alheios à nossa vontade, conspiraram para que mudássemos os nossos planos.


Continua... 

Autobiografia na Música - Patrulha do Espaço - Capítulo 107 - Por Luiz Domingues


Ao fazermos uso da novidade, rumamos à Campinas-SP, logo no primeiro posto rodoviário, fomos "convidados" a parar para estabelecer uma conversa reservada com o policial rodoviário. Apesar da aparência discreta do veículo e estar tudo em ordem, inclusive a documentação já registrada em favor do nome do nosso motorista/sócio, éramos novatos nessa dinâmica de nos considerarmos donos de um ônibus, e posso afirmar que foi o primeiro susto desagradável que tal atribuição poderia proporcionar-nos e infelizmente, ocorrências muito piores aconteceriam doravante, por anos a fio, inclusive.

Imbuído da típica malandragem de quem tinha vivência nesse tipo de ambiente, o motorista só nos disse para ficarmos quietos dentro do veículo e assim aguardarmos, pois ele trataria do assunto com o policial. De fato, o policial quis olhar os itens básicos de segurança do veículo, não achou nada de errado na documentação e só alertou sobre os pneus que não havíamos trocado previamente e certamente também precisavam ser substituídos (só trocáramos dois, os piores, mas o certo seria ter comprado um jogo novo).

Mas o policial quis dar uma olhada na parte interna, e com o seu semblante a denotar ter poucos amigos, entrou e verificou que era uma banda de Rock a bordo, com um monte de cabeludos, instrumentos e equipamentos. Temi por um pedido de inspeção geral, alimentado pelo preconceito de praxe em ralação ao suposto consumo de drogas, mas ele apenas desejou-nos feliz viagem e nos liberou, enfim. A parada consumiu quase meia-hora da nossa viagem, ou seja, a metade do tempo que se gasta normalmente para se dirigir de São Paulo à Campinas.

Enfim, chegamos finalmente ao Delta Blues, no simpático bairro Castelo na cidade de Campinas, e assim como na ida, ficou a constatação de que carregar e descarregar o equipamento pela porta tradicional do veículo seria um fardo. Além de pouco anatômica para a função, produzia um lógico cansaço extra para a equipe de roadies, além da morosidade nesse processo, a gerar um tipo de aborrecimento a mais. Providências teriam que ser tomadas sobre tal questão, além da adequação dos bancos, pois o ideal seria ter menos que as quarenta e tantas poltronas tradicionais do ônibus.

Ao falar do show em si, foi uma excelente performance. A honrar as tradições da nossa própria banda, "fizemos (de fato), uma noitada excelente"...

Foi a noite do dia 6 de setembro de 2001, véspera de feriado nacional, e cerca de trezentas pessoas entraram na casa para nos assistir.

Um fato alheio à banda abaixou um pouco o astral da noite, com uma briga que aconteceu no local, quando seguranças da casa expulsaram alguns rapazes impetuosos que tentaram entrar sem pagar o ingresso. 

E um outro fato, este sim, pertinente para nós, foi que logo na saída, havíamos notado a presença de areia no interior do veículo, ainda que não em grande quantidade e nitidamente notava-se que havia escapado de uma vassourada prévia.

O nosso "sócio" tentou disfarçar, ao justificar que transportara areia de uso pessoal para uma pequena obra caseira que seria feita, mas a verdade veio à tona a seguir: ele transportara uma banda de pagode para a cidade de Santos-SP, alguns dias antes, e o passeio na praia certamente deixou vestígios.

O nosso trato fora construído no sentido de usarmos o veículo exclusivamente para nós, mas logo no início dessa parceria, já ficamos desapontados com tal atitude da sua parte, logicamente sem a nossa concordância, e aí nesse ponto, já começou uma quebra de confiança que só aumentaria nos meses subsequentes.

Na volta para São Paulo, a viagem foi tranquila. O ônibus não esboçou nenhuma pane, e a polícia não nos parou para inspeções, mas quando já estávamos a transitar pela cidade de São Paulo, um problema nos surpreendeu em pleno vale do Anhangabaú, bem no meio do seu túnel subterrâneo. Uma falha lamentável e ocasionada pelo marcador de combustível, nos deixou sem noção da real situação do abastecimento do tanque de óleo diesel. Foi repentino e lamentável, ficar por volta das seis horas da manhã com o carro sem meios para prosseguir. A sorte, foi que se tratara de um feriado e sob um horário muito cedo, pois se fosse em um dia útil qualquer, seríamos alvo fácil dos xingamentos dos motoristas estressados ao nosso redor. 

Enfim, sanado esse problema de ordem prosaica, seguimos em frente e já anexamos uma outra questão para resolver: o marcador de combustível e a sua indefectível boia...

Continua...

Autobiografia na Música - Patrulha do Espaço - Capítulo 106 - Por Luiz Domingues


Embora fosse óbvio que teríamos gastos adicionais da ordem de ajustes de manutenção do veículo, além das prestações da aquisição propriamente dita, o nosso sócio-motorista, sempre minimizara tais questões, como se fosse fácil resolvê-las. É claro que não era, mas a contrapartida dessa aquisição, foi a óbvia perspectiva de aumento da demanda de shows, com o consequente aumento da arrecadação. Nesses termos, pareceu que a estratégia lograria êxito, e na pior das hipóteses, nós conseguiríamos manter a banda na faixa do "azul", o que já seria aceitável naquele momento.
Rara foto desse show realizado no Delta Blues de Campinas-SP em 2001, e do acervo pessoal do nosso roadie, Samuel Wagner

Enfim, nós gastamos uma boa quantia para se prover alguns ajustes mínimos, no intuito de usar o ônibus o quanto antes e torná-lo assim, rentável. E a primeira experiência com o veículo, se deu no início de setembro de 2001. Fomos à Campinas-SP, para mais uma apresentação a ser feita na casa de shows, "Delta Blues".

Como a cidade de Campinas dista apenas cem km de São Paulo, julgamos ser uma experiência ideal para testar o carro na estrada e sentirmos assim, se poderíamos confiar no seu desempenho.

O motorista também pareceu estar bastante animado e como costumava enfatizar, queria "curtir a vida na estrada", a levar a banda para tocar à toda parte.

Nesses termos, pareceu uma parceria perfeita, mas não pensávamos nessa ocasião, o quão imprudente seria contar com um único motorista para conduzir o veículo. Na animação inicial, não ponderamos os impedimentos inevitáveis que poderiam ocorrer, tais como: problemas de saúde, imprevistos familiares, problemas com a carteira de habilitação do dito cujo etc...

Tais questões só viriam à tona, tempos depois, quando nos deparamos com eventos desse nível, pois naquele momento inicial, só pensávamos na praticidade do cotidiano. E assim, com o ônibus submetido a pequenos ajustes iniciais básicos (troca de óleo e filtros, dois pneus novos, um check-up na mecânica, freios e parte elétrica), fomos então testá-lo em seu primeiro desafio.

Eu posso afirmar hoje em dia, que inaugurou-se dessa forma, uma nova etapa na vida da banda e não simplesmente a caracterizar-se como uma mera aquisição. Realmente, daí em diante, a condução da nossa logística pautou-se muito em função desse ônibus, pelos aspectos bons e ruins de tal rumo que tomamos. 

Continua... 

Autobiografia na Música - Patrulha do Espaço - Capítulo 105 - Por Luiz Domingues


Tocamos outras músicas nesse dia, mas os vídeos que um fã/amigo, e que teve curta participação como roadie da banda em 2000, (Rogério André), disponibilizou no YouTube, são esses anteriormente citados.

O programa era obscuro, e evidentemente que teve uma marca de audiência quase no patamar zero na época de sua exibição. A despeito da qualidade de imagem ser precária, pela falta de recursos de iluminação melhores no estúdio daquela universidade, claro que foi válido participar. Foi uma pena, pois a performance da banda foi boa, com pouquíssimos erros musicais perceptíveis em nossa própria avaliação e isso deve ser creditado ao fato de que estávamos bem azeitados pela frequência boa de shows que fazíamos regularmente.

O próximo compromisso que teríamos, seria feito em uma casa noturna famosa do interior de São Paulo, e que já havíamos visitado ao final de 2000. E nesse show em específico, uma novidade aconteceria como um teste preliminar, mas que tornar-se-ia doravante uma esperança, como solução para a logística da banda, mas concomitantemente, uma fonte permanente de aborrecimentos, para todos nós.

A produtora da nossa banda, Claudia Fernanda, conhecera um rapaz que era dono de duas vans, e que conduzira a banda para shows no interior, anteriormente, sob o regime de locação.

Esse sujeito disse ter conhecido um outro rapaz que estaria a vender um ônibus, por um preço convidativo, e que estaria disposto a facilitar o seu pagamento. Então, mediante uma fase onde tivemos muitas oportunidades para nos apresentar em cidades interioranas, viajar para outros estados, e sobretudo, a deixarmos uma robusta fatia dos nossos cachês a sair de nosso bolso para pagar a locações de  micro-ônibus, vans e similares, a ideia de termos um meio de transporte próprio, pareceu ser boa em princípio, porém, muitos desdobramentos ocorreriam dessa ideia.

Claro que conversamos e ponderamos os prós e contras de um investimento desse porte. A autonomia para viajar, sinalizou ser o grande argumento pró, mas a contrapartida gerou-nos dúvidas. Não seria melhor investir tal dinheiro em outras coisas importantes para a banda? Enfim, essa conversa nos ocupou a atenção entre agosto e setembro de 2001.

Continua... 

domingo, 30 de agosto de 2015

Autobiografia na Música - Patrulha do Espaço - Capítulo 104 - Por Luiz Domingues


Ao chegarmos ao campus da Universidade Metodista, verificamos com pesar que o estúdio de TV dos estudantes do curso de Rádio e TV, ficava no quarto andar de um prédio, sem a existência de um elevador sequer. Ora, diante dessa escadaria massacrante, e do fluxo gigantesco de estudantes a subir e descer pelos andares, percebemos que os nossos roadies ficariam exauridos a cumprir essa tarefa, e pior, essa logística atrasaria demais o trabalho de montagem do equipamento, e consequente início dos trabalhos de gravação do programa.
Então, mais uma vez a contarmos com o poder da improvisação e camaradagem, alguns alunos envolvidos nessa produção, dispuseram-se a ajudar, sob um ritmo de mutirão, pura e simplesmente. Conseguiram assim, escalar os quatro andares com aquela maquinaria toda, incluso o órgão Hammond, que demandava a presença de no mínimo, quatro homens fortes para carregá-lo.
Claro, muita gente caiu na real quando viu o tamanho do equipamento, pois talvez alguns desavisados, principalmente do corpo docente da instituição, devem ter imaginado a presença de uma banda despojada, formada por garotos a usar bermudas, sem essa preocupação com a qualidade sonora etc.
Começamos então a montar tudo, e nesse ínterim, eu acompanhei uma conversa travada entre uma professora envolvida na produção do programa, com o técnico de som, preocupada, ao ter verificado que o áudio não poderia sair mal, com uma banda profissional desse nível. Ficou óbvio que ele esteve mesmo surpreendida, pois esperavam uma banda amadora, formada por alunos ou conhecidos dos mesmos, mas com um equipamento mais simples e certamente, completamente despojada.

Diante disso, foi compreensível que ficasse preocupada, ao ver os alunos sob a sua responsabilidade, intimidados com uma banda do nosso porte, com história. De fato, isso tornou-se nítido ao percebermos que estavam nervosos, principalmente a garota que seria a apresentadora. Notamos que ela andava para lá e para cá, com a ficha de informações e perguntas na sua mão e a tentar decorar alguns tópicos. 

Aliás, esse procedimento é comum entre profissionais de jornalismo televisivo, já vi repórter tarimbada a proceder dessa forma, portanto, a professora ensinara corretamente a técnica, mas a garota era só uma estudante, chamada, Alessandra Leite, bem nova e estava nitidamente a se colocar como intimidada com a nossa presença. Normal, ninguém nasce a saber.
E na medida do possível, nós nos solidarizamos com ela, pois tratamos de quebrar o gelo, ao lhe dar suporte nos momento antes da gravação iniciar-se, enfim. Haveria também um pequeno público presente, que foi acomodado sob uma pequena arquibancada dentro do estúdio. De última hora, o Samuel Wagner avisara alguns amigos seus, e que se misturaram aos alunos. Foi bem interessante essa participação, a garantir-nos um pouco de calor humano, fundamental para nos soltarmos um pouco mais, pois é sempre intimidante tocar em estúdio de TV, somente com a presença dos técnicos.
O programa chamava-se: "Página Aberta", e era normalmente exibido no canal comunitário da cidade de São Paulo e também através de um similar da região do ABC. Infelizmente, a audiência fora perto do zero, mas não podíamos e não desprezamos a oportunidade, sem dúvida. Tocamos diversas músicas, e uma entrevista foi intercalada em trechos. O programa foi dividido em dois blocos, e foi exibido em duas datas de agosto de 2001, com meia hora cada um. A qualidade sonora da mixagem feita para o padrão televisivo, surpreendeu-nos, até, quando o vimos no ar, dias depois.
Uma postagem no You Tube, foi feita anos atrás, de um trecho desse programa, mas a dar o credito errado, ao afirmar ser um programa da TV Cultura. Não é correta tal afirmativa, e por isso eu deixei um comentário na página, a solicitar a correção, da parte de quem a postou com essa falha em seu título.

A iluminação deixou a desejar, mas acho que por falta de mais recursos. De fato, é um vídeo um tanto quanto escuro, por se considerar ter sido feito em um estúdio de TV, não 100% profissional, mas em termos experimentais e didáticos, bem aparelhado, pelo o que eu pude verificar.

Essa postagem que eu citei, onde somos vistos a tocar a nossa versão para: "Ando Meio Desligado", dos Mutantes, obteve muitas visualizações. Claro que o chamariz de ter sido uma música famosa dos Mutantes pesou, mas creio que a nossa performance tem o seu valor, ainda mais pelo improviso que fazíamos no meio da canção, com direito à citação de: "In-a-Gadda-da Vidda", famosa canção grupo norte-americano, Iron Butterfly.


O vídeo a mostrar a nossa performance para a música: "Ando Meio Desligado", dessa citada aparição no programa "Página Aberta", produção dos alunos do curso de Rádio e TV da Universidade Metodista, de São Bernardo do Campo, no ABC Paulista. Exibido na TV Comunitária de São Paulo, em agosto de 2001.

http://www.youtube.com/watch?v=GPbNby6HyCo
O Link para assistir no YouTube
O Link para assistir no YouTube



http://www.youtube.com/watch?v=UYzqmDaqkgc
O Link para assistir no YouTube


Continua...

Autobiografia na Música - Patrulha do Espaço - Capítulo 103 - Por Luiz Domingues


De volta a falar dentro da cronologia, o próximo compromisso foi um convite de uma casa noturna tradicional, instalada  do bairro do Bexiga, próximo ao centro de São Paulo. Tratou-se do "Café Aurora", casa que existia há muitos anos na Rua 13 de maio, e que costumava privilegiar uma programação com bandas cover a atuar, predominantemente.

No entanto, como o convite partiu da casa, tornou-se óbvio que haveria um cuidado especial em produzir uma noite para o som autoral e dessa forma, aceitamos nos apresentarmos. Ainda por cima, haveria a boa companhia dos amigos do Baranga, portanto, no mínimo, seria uma noitada de Rock, agradável. Isso ocorreu no dia 26 de julho de 2001 e cento e vinte pessoas foram computadas na plateia. 

Enquanto a gravação do novo álbum se encerrava, um convite para fazer um programa de TV surgiu, mas vale a pena me estender um pouco nele, pois tal oportunidade rendeu uma boa história. Como foi muito comum nessa fase da Patrulha do Espaço, foram raros os programas de TV aberta ou mesmo paga, em que participamos. As raras oportunidades que tivemos, foram proporcionadas por programas obscuros de TV's Comunitárias e/ou universitárias, com pouca visibilidade, infelizmente. E quando surgiram, é claro que os aceitamos, de bom grado, pois a boa vontade expressa ao formular o convite, não poderia ser desprezada de forma alguma.

Foi o caso desse convite que recebemos de um grupo de estudantes universitários, que produziam um programa, como atividade curricular de seu curso de Rádio e TV, dentro do campus de uma universidade privada, localizada na região do Grande ABC paulista.

No caso, foi da parte da turma de estudantes de Rádio e TV da Universidade Metodista, de São Bernardo do Campo-SP.

O convite surgiu através de uma amiga do nosso roadie, Samuel Wagner, chamada: Rosângela. Ela não era estudante desse curso, mas conhecia a turma de Rádio e TV, e sugeriu a participação da Patrulha do Espaço, exatamente pela proximidade de conhecer o Samuel e saber que o contato seria fácil, nesses termos.

A ideia seria gravar um especial de uma hora de duração, com a banda a tocar ao vivo nos estúdios da Universidade, e claro, com direito a uma entrevista para falar do trabalho etc. Seria uma participação sem o pagamento de um cachê, evidentemente, mas a estrutura da universidade nos foi oferecida, e pelo menos a logística esteve garantida, com a cessão de vans para providenciar o transporte do equipamento e da banda.

Muito bem, foi aceito e assim, no dia 10 de agosto de 2001, nos dirigimos ao campus da universidade, em Rudge Ramos, bairro daquela cidade, e que faz divisa com São Paulo.

Continua...