Wilton Rentero e eu (Luiz Domingues), na sala da técnica do estúdio Prismathias de São Paulo. Gravação do single: "1969". 3ª sessão de gravação. 23 de maio de 2023. Click (selfie) e acervo: Luiz Domingues.
Gravada a base e já a contar com dois solos e alguns contrasolos também gravados na sessão anterior, chegara a vez de colocarmos os teclados. Ainda faltava fazer dois pequenos contrasolos e o terceiro solo de guitarra, este da parte do Osvaldo Vicino, mas para efeito de aproveitamento máximo da logística, visto que não foi fácil conciliar a agenda do estúdio com a do Rodrigo Hid, nosso convidado especial para gravar os teclados, nós estabelecemos que essa terceira sessão fosse exclusivamente focada nessa missão, e assim a deixarmos a meta para cumprir o que faltara das guitarras para ser gravado em uma quarta sessão, exclusiva com tal finalidade, talvez até mais curta em termos de duração.
O nosso convidado especial, Rodrigo Hid, a tocar na gravação da música "1969". Boca do Céu no estúdio Prismathias de São Paulo. 3ª sessão de gravação. 23 de maio de 2023. Click e acervo: Luiz Domingues
Por ter muita convivência com o Rodrigo Hid, meu querido amigo e companheiro de três bandas, é claro que me prontifiquei a lhe dar todo o conforto possível em termos de lhe prestar carona, no sentido de valorizar a sua boa vontade para contribuir conosco. E assim, nos encontramos em um horário nada bom para se enfrentar o trânsito de São Paulo, mas por uma estranha sorte, ou por influência direta dos "Deuses do Rock", eis que chegamos na porta do estúdio Prismathias, com pouco menos de dez minutos de antecedência ao horário marcado, ou seja, que ótimo.
Assim que adentramos o ambiente do estúdio, e eu ainda fazia a devida apresentação do Rodrigo e do Danilo, um ao outro, foi quando o Rodrigo colocou a mão na cabeça e suspirou ao se lembrar que esquecera de trazer a fonte que alimentava o teclado "Oberheim", ou seja, o instrumento que ele trouxera especificamente para gravar a melhor simulação de órgão Hammond possível naquele instante. Na mesma hora eu tive o impulso de propor voltarmos imediatamente ao bairro da Aclimação, na zona sul e voltarmos com a fonte em mãos ao Parque São Lucas, na zona leste, ou seja, mesmo com o trânsito a se apresentar surpreendentemente bom nesse dia, essa seria uma operação que nos extrairia pelo menos uma hora entre ida e volta, fora o cansaço que acarretaria.
Eu, Luiz Domingues, a observar e Rodrigo Hid a tocar. Gravação da canção "1969". Boca do Céu no estúdio Prismathias de São Paulo. 3ª sessão de gravação em 23 de maio de 2023. Click, acervo e cortesia: Wilton Rentero
Na mesmo hora, o Rodrigo amenizou a adversidade ao apontar que o outro teclado que trouxera, um teclado da marca "Korg", com o intuito de gravar uma simulação de piano elétrico e o solo de piano acústico, oferecia também uma convincente imitação de órgão Hammond. Sim, eu sabia disso, sobre esse teclado em especial, o Rodrigo o havia comprado no tempo em que tocamos juntos no "Pedra", portanto, eu sabia dessa possibilidade, muito embora fosse algo incontestável que o Oberheim se colocava como um simulador específico, de melhor nível e que igualmente ele sempre o usou nos tempos da carreira construída com o Pedra e também durante o período final em que estivemos juntos na formação da Patrulha do Espaço.
Rodrigo Hid e Wilton Rentero em um momento de confraternização no estúdio durante a gravação dos teclados para a canção: "1969". Boca do Céu no estúdio Prismathias de São Paulo em 23 de maio de 2023. 3ª sessão de gravação. Click e acervo: Luiz Domingues
Mesmo assim, ante a dificuldade gerada, e com o horário do estúdio a correr, a decisão do Rodrigo foi de gravar a parte do órgão Hammond mediante a ação do simulador Korg, para otimizarmos o tempo. De fato, o Oberheim chega normalmente muito mais perto do som de um verdadeiro órgão Hammond, mas o Korg não desapontou, mesmo que sabidamente mais falho nesse aspecto, e assim que o Rodrigo acertou o timbre e o Danilo também o reforçou com algum apoio discreto em termos de "plug-ins" da sua mesa de operações, nós partimos para a gravação propriamente dita.
Com pouco desenho empreendido pelo Rodrigo de uma forma comedida propositalmente e dessa forma mais centrado na tarefa de prover o chão harmônico da canção, mesmo assim de forma mais econômica, o órgão ficou magnífico. Não me surpreendi nem um pouco com a performance segura e tranquila da parte do Rodrigo, muito experiente para trabalhar em estúdio.
O nosso convidado especial, Rodrigo Hid, a gravar teclados para a canção: "1969". Boca do Céu no estúdio Prismathias de São Paulo. 3ª sessão de gravação. 23 de maio de 2023. Click e acervo: Luiz Domingues
A seguir, eis que a missão foi gravar o piano elétrico. Sabedor que a canção já tinha duas guitarras base e o baixo como suporte, além da inclusão do órgão na mesma função harmônica, eu pedi ao Rodrigo que colocasse uma linha de piano elétrico bem pontual, apenas em alguns trechos e mais para que sobrasse nos espaços de respiro dos tempos fracos dos compassos, a ressonância típica do instrumento, apenas para ornar sutilmente o arranjo.
Ele acertou um timbre mais agudo, mais próximo do piano Würlitzer do que o Fender Rhodes e realmente seguiu essa linha de observar a parcimônia no arranjo. E claro, mesmo assim, ele foi tão criativo a improvisar que mesmo a introduzir poucas intervenções, a sua contribuição ficou muito marcante ao ponto do Danilo se empolgar ao ouvir e imediatamente declarar que certos trechos não poderiam ficar obscurecidos na hora de mixar definitivamente a canção, de tão bonitos que ficaram, a acrescentar muito para o tema. Concordei com ele, Danilo, pois realmente foi um acréscimo e tanto para o enriquecimento da música e embora ainda fosse uma época muito prematura da gravação para se falar em termos de mixagem, de fato, criou-se ali um "bom problema" a ser resolvido mais à frente.
O nosso convidado especial, Rodrigo Hid, a se preparar para gravar teclados para a canção: "1969". Boca do Céu no estúdio Prismathias de São Paulo. 3ª sessão de gravação. 23 de maio de 2023. Click e acervo: Luiz Domingues
Tudo fora cumprido com bastante eficiência em termos de tempo, portanto, havia uma boa margem para que a terceira tarefa do dia, fosse cumprida logo a seguir. Tratou-se do solo de piano acústico solicitado pelo próprio Laert, e que aliás, conforme eu já descrevi em capítulo anterior, fora objeto de sua solicitação em cima da hora da produção, para justamente propor a mudança no mapa da canção, para introduzi-lo.
O nosso convidado especial, Rodrigo Hid, a gravar teclados para a canção: "1969" e eu, Luiz Domingues a observá-lo a trabalhar. Boca do Céu no estúdio Prismathias de São Paulo. 3ª sessão de gravação. 23 de maio de 2023. Click, acervo e cortesia: Wilton Rentero
Bem em cima disso, a questão foi que no ensaio que realizamos em 7 de maio e com a participação dele, Laert, justamente nessa nova parte por ele sugerida, durante a sua ocorrência nas filmagens que fizemos do ensaio, ele havia cantarolado uma melodia de puro improviso e com a específica intenção de demarcar o espaço, para que quando este nosso convidado visse e ouvisse (sobretudo), a filmagem, soubesse exatamente onde ficara inserido o espaço do solo.
No entanto, o improvável ocorreu quando ao escutar, o Rodrigo gostou da melodia e influenciado por essa impressão, ao montar a sua concepção no estúdio ele quis seguir esse padrão melódico. Até aí, tudo bem, a melodia era interessante, mas do jeito que o Rodrigo a interpretou ao piano, a intervenção ficou nitidamente fora do espírito de uma canção Blues-Soul a la Janis Joplin, conforme esteve estabelecido de comum acordo entre nós como padrão a ser seguido, e contrariamente, veio a ganhar uma forma de expressão mais a se parecer com uma formulação do "Krautrock" pela natureza mais "dura" dos ataques "martelados" às teclas e pela insinuação melódica a resvalar em alguma influência caribenha bastante improvável. Para o leitor mais conhecedor da história do Rock, seria algo como se o Keith Emerson estivesse a tocar em um disco do "Guru-Guru", mediante uma melodia que ouvira durante as suas férias no Caribe. Piada a parte, foi exatamente como soou esse piano.
Wilton Rentero no comando da "selfie", eu (Luiz Domingues) e Rodrigo Hid, nosso convidado especial. Boca do Céu a gravar a canção "1969". 3ª sessão de gravação no estúdio Prismathias de São Paulo em 23 de maio de 2023. Click (selfie), acervo e cortesia: Wilton Rentero
E eu tive uma boa dose de culpa nessa formulação mais áspera, digamos, quando sugeri ao Rodrigo que gravasse a mesma frase com duas oitavas de diferença de uma mão para a outra. Dessa forma, o contraste brusco de uma oitava bem grave com o agudo da outra bem mais alta, só reforçou a estranheza quase experimental que me remeteu ao conceito de lembrar ser uma peça típica da escola germânica do Krautrock, ou a trocar em miúdos, não ficou feio, mas destoara em demasia da proposta inicial.
No dia seguinte, o Laert se pronunciou, ao se penitenciar por haver induzido o Rodrigo a essa formulação e o Rodrigo por sua vez me disse que teve receio de desagradar o Laert, se fugisse completamente da ideia por ele cantarolada durante os vídeos de ensaio que ele assistira. Em suma, faltou uma melhor comunicação entre nós, entretanto, e para amenizar, o Rodrigo me disse que a despeito desse desencontro, de fato havia mesmo gostado da melodia improvisada pelo Laert.
Eu (Luiz Domingues), Rodrigo Hid, Wilton Rentero e Danilo Gomes Santos na confraternização após o encerramento da 3ª sessão de gravação da canção "1969". Boca do Céu no estúdio Prismathias de São Paulo. 23 de maio de 2023. Acervo: Luiz Domingues. Click (selfie): Danilo Gomes Santos
Bem, ficou acertado então que esse solo de piano seria regravado em uma sessão posterior, bem rapidamente, e o Rodrigo lançou a seguinte ideia, assim que isso ficara resolvido: já que abriríamos uma nova sessão para gravar esse solo novamente, será que nós aceitaríamos regravar o órgão, mediante o uso do Oberheim, que não fora usado por um detalhe tolo do esquecimento de uma fonte para ligá-lo? Bem, a se considerar que ele não gastaria mais de uma hora para cumprir tal função, é claro que valeria a pena regravar o órgão, a despeito da versão anteriormente gravada estar ótima sob o ponto de vista da execução da parte dele.
Eis o link para assistir no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=M3x0qczgO38&list=PL3-MvRpDYtfGdr-qnn_sJSlpbAyHRf5OE&index=102
Outra versão do Rodrigo a gravar o órgão da canção "1969".
Eis o link para assistir no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=1AXYaCdRLHg&list=PL3-MvRpDYtfGdr-qnn_sJSlpbAyHRf5OE&index=104
Mais um vídeo a mostrar o Rodrigo a gravar o órgão da música "1969".
Eis o link para ver no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=ZtMzEt3weWM&list=PL3-MvRpDYtfGdr-qnn_sJSlpbAyHRf5OE&index=106
Então foi assim que decorreu essa primeira sessão de teclados: o piano elétrico ficara maravilhoso e o órgão igualmente, mas este segundo seria substituído mediante uma nova sessão a ser marcada, por uma questão de timbre melhor do outro teclado a ser usado e finalmente, um novo solo de piano acústico seria feito, por uma questão de estética, a buscar a adequação total dentro do espírito que a canção necessitava.
Eis o link para ver no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=adZ6DSi4d2M&list=PL3-MvRpDYtfGdr-qnn_sJSlpbAyHRf5OE&index=107
Um vídeo a mostrar a audição da gravação do piano elétrico por parte do Rodrigo Hid. Filmagem: Luiz Domingues
Eis o link para assistir no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=lPPE4qlPWFk&list=PL3-MvRpDYtfGdr-qnn_sJSlpbAyHRf5OE&index=108
Cabe a acrescentar que o clima com o nosso convidado foi maravilhoso. O Wilton estabeleceu amizade instantânea com o Rodrigo e por coincidência, o fato do Rodrigo se apresentar costumeiramente em uma casa noturna da cidade na qual o Wilton morava, Guarulhos, e cujo proprietário era um ex-professor colega seu da universidade na qual lecionara, só estreitou a boa conversa estabelecida entre ambos, fora as inevitáveis derivações para se falar de Beatles, Rock Progressivo, Clube da Esquina e Led Zeppelin, como citações de gosto comum entre nós e que gerou por conseguinte, conversas das mais agradáveis não só entre os dois, mas para todos, incluso eu e Danilo.
Eis o link para ver no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=pVlexQmIxVY&list=PL3-MvRpDYtfGdr-qnn_sJSlpbAyHRf5OE&index=111
Um vídeo a mostrar a prova de áudio com os três teclados gravados na 3ª sessão de 23 de maio de 2023 por nosso convidado especial, Rodrigo Hid. Filmagem: Luiz Domingues
Eis o link para assistir no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=1cvNDemdySA&list=PL3-MvRpDYtfGdr-qnn_sJSlpbAyHRf5OE&index=118
Enfim, foi uma noite memorável para todos e mais uma vez para mim em específico, ficou marcada como mais uma parceria que criei com Rodrigo ao longo da minha autobiografia, mediante amizade, companheirismo, parceria musical, é claro, e neste caso, para ele, foi um prazer também colaborar com o Laert, do qual era amigo há muitos anos por outras conexões que os uniu, independente da minha intervenção como elo.
E para o Boca do Céu, claro, foi um luxo contar com o talento de Rodrigo Hid nessa história do resgate e a provar que o curso da história é muito intrigante, no sentido de que o Rodrigo nasceu em dezembro de 1978, ou seja, durante os momentos finais do Boca do Céu, que encerrou atividades oficialmente em abril de 1979. Quem poderia em dezembro de 1978, imaginar que essa banda se reagruparia em 2020, e que em maio de 2023 estaria a gravar uma música, com esse então bebê recém-nascido na época na qual estávamos agrupados nos anos setenta, e agora a gravar teclados para abrilhantar a nossa canção neste ponto do século XXI? Mais enredo de seriado "Sci-Fi", impossível.
Wilton Rentero, eu (Luiz Domingues e o nosso convidado especial, Rodrigo Hid. Gravação da música: "1969". Boca do Céu no estúdio Prismathias de São Paulo. 3ª sessão de gravação. 23 de maio de 2023. Click (selfie) e acervo: Luiz Domingues
Continua...
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