quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 191 - Por Luiz Domingues


Após esses shows realizados no Teatro Lira Paulistana, nossa agenda apontou o próximo compromisso para somente dali a um mês, praticamente. Esse foi um hiato raro nessa fase de embalo que vivíamos, e tanto não abalou-nos ficar tanto tempo sem um show, que pensamos nessa pausa como uma possibilidade para ensaiarmos mais, ao visar a nossa entrada no estúdio, em breve. E também representou um tempo para dedicarmo-nos à pré-produção da capa do nosso novo álbum. Na questão da capa, já havíamos feito reuniões para suprir o desenhista Líbero, com um manancial de ideias. O mote que demos-lhe foi : queríamos uma garota sensual, mas acompanhada de uma animal feroz, para fazer um contraste do tipo, "A Bela e a Fera". A ideia seria que a garota fosse Rocker, mas bem feminina e sensual. Não queríamos que ela fosse agressiva, exatamente para deixar tal agressividade para ser expressa pelo animal. Outro elemento, queríamos que uma guitarra estivesse presente. Ou empunhada pela garota, ou colocada na cena de alguma forma. O mote teria que ser sensualidade / agressividade e a música, como catalisadora de tais sentimentos. Confesso, não achava a melhor ideia. Meus conceitos contraculturais sessenta / setentistas apontavam para outros direcionamentos, mas havia a preocupação nítida de adequação aos tempos modernos, e se não éramos exatamente uma banda de Hard-Rock, tampouco Heavy-Metal, oitentista, ao menos precisávamos aproximarmo-nos dessa estética, visualmente a falar, por uma questão de adequação mercadológica ao mercado em voga.

Os primeiros esboços (rafs), não agradou-nos, e o desenhista, Líbero, mostrava-se frustrado em não agradar-nos, inteiramente. Ele era extremamente gentil, solícito, e de fato, um ótimo desenhista, contudo, não estava a entender os nossos anseios, ao denotar nitidamente haver uma dificuldade de comunicação entre as partes. E não foi por falta de empenho da parte dele, de forma alguma, pois em cada reunião, ele mostrou-nos inúmeros esboços. O problema, foi que ao mesmo tempo em que pedíamos-lhe traços modernos, internamente, sob um paradoxo, detestávamos tais sinais estéticos oitentistas. Então, o que ele poderia fazer, um milagre ? Bem, a sua competência era inquestionável. Como ilustrador da revista Bizz, os seus trabalhos estavam sempre em destaque naquela revista.

Lembro-me até que a Bizz lançou naquela mesma época, uma série de desenhos disponibilizados em cartolina, que vinham encartados na revista, como itens colecionáveis. Eram cards, com ilustrações ultra-oitentistas, com inspiração no Pós-Punk; Techno- Pop; New Wave, e similares, a evocar todos aqueles ícones em voga. Pois foram trabalhos executados pelo Líbero, e que foram super elogiados na época. Lembro-me que ele chegou a ganhar prêmios por trabalhos assim, dentro do jornalismo cultural, em quesitos como, melhor Lay-Out; ilustração, e afins. Preocupava-nos essa falta de perspectiva de que o Lay-Out da capa estava a demorar para definir-se, e pior ainda, que o rumo apontado não fosse nem de longe o que queríamos. O tempo urgia e o próprio produtor do disco, Luiz Calanca, mostrou-se insatisfeito com a nossa relutância, pois confiava muito no Líbero, e não esperava tanta rejeição aos seus rafs, de nossa parte. Foi um sinal apreensivo, prestes a tornar-se ainda mais intenso, dentro dessa produção...


Continua... 

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