sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 194 - Por Luiz Domingues

Chegou a hora, enfim, para entrarmos em estúdio ! Estávamos por adentrar o estúdio Vice-Versa, mas antes de iniciarmos o trabalho, efetivamente, o produtor fonográfico, Luiz Calanca, convidou-nos para fazermos uma visita prévia ao local, para conhecermos a sua estrutura, como se fosse um reconhecimento de campo. Muito bem, foi uma boa ideia, sem dúvida, ter contato com a sala de gravação; conhecer o técnico que lidaria conosco, o equipamento etc. Então, fomos ao Vice-Versa em um dia de semana, no período da noite, onde deveria acontecer a primeira sessão de mixagem do primeiro disco do Platina, que estava a ser preparado ali, também. 

Como o Vice-Versa mantinha duas salas de gravação, na mesma noite, o Ultraje a Rigor estava a usar a sala "B", mais modesta, para cumprir a pré-produção de seu novo álbum. Por ser uma gravação de pré-produção, dispensava maiores requintes, ao ser gravada ao vivo, como uma demo-tape, e sendo assim, a gravadora WEA estava a bancar essa demo prévia (rough demo), sem maiores problemas. Encontramos dois membros de tal banda, Leospa e o Maurício na escadaria que dava acesso à sala B. Eram muito gentis, e imediatamente convidaram-nos para visitar a sua gravação, e ouvir o que estavam a produzir. Encontramos o produtor, Peninha Schmidt a capitanear o trabalho, mas foi claro que ele nem notou sobre quem nós éramos, sobretudo que já o abordáramos algumas vezes no passado. Pouco tempo antes, supostamente um material d'A Chave do Sol, havia chegado às suas mãos, e sido rejeitado sumariamente. Essa pelo menos houvera sido a versão que recebêramos da dupla de empresários, Ricardo e Bia, do escritório "Raio X", talvez na única ação que alegaram ter feito em nosso favor, mas pairava dúvidas, ainda que a conhecer a mentalidade do Peninha, e a vibração oitentista em voga, certamente que fez  todo o sentido (desde que o material realmente tivesse sido enviado, e tínhamos dúvidas sobre essa ação ter ocorrido, de fato).

Bem, o que ouvimos no estúdio B do Vice-Versa, foi um Rock, meio que misturado com Ska, com timbragens mega oitentistas, e uma letra bastante satírica, mas a beirar a linha jocosa, a contar a história de uma galinha, e as suas peripécias sexuais etc. Claro que achamos horrível a abordagem chula, mas foi o som que o povo quis, como diria o saudoso comunicador, Bolinha, e de fato, pouco tempo depois, a tal canção depois de gravada oficialmente, esteve devidamente estourada nas emissoras de rádio, TV e na boca do povo.... uma tal de galinha Marylou... 


Enfim, apreciamos a hospitalidade dos membros do Ultraje a Rigor, que sempre foram muito amistosos para conosco. Então, fomos conhecer o estúdio onde gravaríamos, e apreciamos muito a sala de gravação; a técnica e o equipamento. O técnico que assistir-nos-ia, fora o Nico, muito gentil; solícito e animado para mergulhar em nosso som. Posteriormente, outro técnico assumiria na metade do trabalho, mas sobre tal mudança, falo depois, no decorrer da cronologia. Infelizmente, nessa mesma noite, o clima pesou quando o pessoal do Platina chegou. Éramos muito amigos, e não haveria problema em permanecer alguns minutos durante o horário deles, para ouvirmos o trabalho de mixagem de seu álbum, que começaria naquele instante. 

Contudo, claro que tínhamos bom senso, e iríamos embora bem rapidamente, para deixá-los trabalhar em sossego. Mas algo muito desagradável ocorreu. Enquanto conversámos agradavelmente, um funcionário do estúdio apareceu muito constrangido, para dizer que não estava a encontrar a fita de rolo master, com todo o material bruto deles, gravado. Uma certa apreensão iniciou-se, mas ainda ninguém poderia supor que algo muito pior estava por acontecer...

Foi quando os funcionários enfim criaram coragem, e comunicaram que um acidente houvera ocorrido, e assim, sob um lapso indesculpável, um técnico apanhara a fita onde estava toda a captura bruta do álbum deles, e acidentalmente a teria usado para gravar outro cliente, por cima ! Um erro desses dentro de um estúdio profissional, e do renome que eles tinham, fora inacreditável. Os amigos do Platina e o Calanca, enlouqueceram com tal notícia lastimável.


E foi com toda a razão, diga-se de passagem, pois foram jogados no ralo, entre quarenta e cinquenta horas de trabalho duro, a conter todo o esmero, a emoção despendida da parte dos artistas etc. Claro que o estúdio responsabilizou-se sem reservas pelo prejuízo da banda e de seu produtor fonográfico, o Luiz Calanca e propôs-se a gravar-se tudo novamente, inclusive com mais horas bônus para caprichar-se ainda mais, no entanto, o desgaste emocional em que foram submetidos com essa notícia, foi enorme e irremediável, ao meu ver. Foi evidente que eles conformaram-se com tal revés, alguns dias depois, a retomar o trabalho do zero, e de fato, mesmo com esse prejuízo, o disco deles ficou excelente, na sequência. Entretanto, além de solidarizarmo-nos com os nossos amigos, e também com o Calanca, que como produtor fonográfico, também fora lesado, ficamos apreensivos em relação à esse tipo de ocorrência, a só restou-nos rezar para que não acontecesse um desastre conosco, e convenhamos, nem havíamos começado o nosso trabalho...


Continua... 

Nenhum comentário:

Postar um comentário