Para um bebê com poucos meses de vida, a enigmática incidência da luz, que não só iluminava, mas
cegava, ao se olhar para o seu corpo emissor, só não foi mais incompreensível do que
a absoluta ausência dela.
A escuridão, assustadora sob uma primeira análise, trouxera uma
série de outros sentimentos análogos. Não foi apenas o breu, anulado pelas pequenas
luzes que inexplicavelmente se acendiam, mas sobretudo foi nítido o comportamento diferente das
pessoas ao redor.
Todos pareciam procurar o aconchego, a evitar a parte
externa da casa. Sim, ficara óbvio que o ambiente se tornara mais frio e todos pareciam propensos a
fazer poucas atividades ou mesmo nada, nesse estranho período dominado pelas trevas.
Tudo fora nebuloso nesse suceder de claro e escuro, a estabelecer uma
alternância incompreensível, sem uma lógica plausível para quem tinha pouco mais de
um ano de idade, certamente. E também se configurou como uma das minhas primeiras indagações semiconscientes da minha parte,
eu diria.
Qual a razão de haver a luz do Sol e também sua ausência? Por que os adultos pareciam não se importar com algo tão
contundente em minha confusa percepção de então?
Por que os adultos mudavam os seus afazeres e a repercutir o seu comportamento, conforme
cada uma dessas duas fases tão díspares entre si?
Não demorou muito para eu me acostumar com tal dinâmica e
passar a absorver com normalidade esse fato da natureza.
Mais que isso, me enquadrar como os demais em comportamentos
análogos e repetitivos, a adequar-me.
Biologia, cultura e educação? Sim, tudo isso e muitos outros elementos nessa receita
social acachapante.
Em 1961, as noites de outono foram frias na cidade de São Paulo.
Havia a famosa garoa que caia fina, e gelada, toda noite.
Meu pai usava chapéu por conta disso e também pela moda que se
perpetuava há décadas, como todos os homens seguiam.
Claridade e escuridão se mostravam indecifráveis e perturbadoras,
mas não por muito tempo...
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