Aconteceu no
tempo da Patrulha do Espaço, em algum momento do segundo semestre de 2003
Desde que
entrei para a formação da Patrulha do Espaço, em 1999, eu assumi uma função na produção da mesma, como
responsável pela divulgação de shows.
Coordenei, portanto, toda a parte de colocação de
cartazes e distribuição de “filipetas” (flyers), a anunciar as nossas
apresentações e nesse sentido a comandar uma equipe de colaboradores, e no caso das filipetas,
contávamos com a sorte, invariavelmente de contarmos com espetáculos protagonizados por artistas do
nosso espectro artístico, para aproveitarmos a movimentação antes dos nossos
shows e na contramão, eu incentivei equipes que trabalhavam a favor de outros
artistas, a aproveitarem a movimentação de nosso público, em nossas
apresentações.
Mas nem
sempre a sorte foi favorável aos nossos anseios e assim, muitas vezes em que não tivemos nada perto de nós, ou seja, com alguma similaridade comprovada na seara cultural/artística, por diversas ocasiões nós
forçamos campanhas de divulgação no autêntico campo minado das adversidades
estéticas, no afã de aproveitar a oportunidade ao menos para estabelecer um
contato fugaz com um público que nem sabia de nossa existência, em tese.
Isso aconteceu
em algumas campanhas de divulgação e especificamente em uma delas, algo exótico ocorreu e
mesmo que não tenha tido nada a ver conosco diretamente, chamou-nos a atenção.
Foi o
seguinte: nós resolvemos distribuir filipetas em um evento ao ar livre a ser
realizado na Praça Charles Miller, e para quem não conhece São Paulo,
tal local trata-se de um imenso Boulevard que fica em frente ao portão principal do
estádio do Pacaembu.
Ali aconteceria um show patrocinado por uma emissora de
rádio que dedicava-se exclusivamente ao fomento da cena do “Emocore”, uma
ridícula cena formada por garotinhos muito mal formados musicalmente e sobretudo mal instruídos sobre a história do Rock e que dessa forma cultuavam uma espécie de New-Punk-Rock dos
anos 2000, com forte tendência Pop, sob uma atroz ruindade técnica inerente e tudo devidamente manipulado sob a
meticulosa engenharia dessa emissora em conluio com empresários que fabricavam
bandas nesses moldes sob a pior intenção possível.
Ou seja, nem devíamos ter ido
gastar o nosso material gráfico ali com tais garotos imberbes que gostavam
dessas bandas de plástico, mas o nosso dilema instantâneo foi gastar ali o material ou amargar fazer dele,
sobra para usar como papel de rascunho, pois não houve nada mais interessante antes da data do nosso
próximo show.
Cheguei
acompanhado do meu amigo, o baterista, Junior Muelas, que na época tocava com a banda “Hare” e
grupo este que houvera aberto vários shows da Patrulha do Espaço em cidades interioranas paulistas, desde 2001
e também o roadie da nossa banda, Samuel Wagner, que sempre esteve presente nessas
ações de divulgação, por ter sido o meu fiel escudeiro nessas missões, além de mais
alguns rapazes para efetuar o trabalho.
Então, eu combinei com todos que infiltrassem-se
em meio à plateia, a distribuir uma rota para cada um agir pelos flancos dentro da multidão e na volta, o combinado foi
que encontrar-nos-íamos na famosa e enorme banca de jornais, que aliás era o ponto
de encontro mais tradicional entre amigos, nas partidas de futebol no Pacaembu,
no pós-jogo, no caso de amigos que torciam para equipes rivais entre si e não
poderiam entrarem juntos a ostentar camisetas antagônicas ou mesmo no caso de
perderem-se uns dos outros. Eu sabia desse popular ponto de encontro desde os anos setenta, quando
comecei a frequentar aquele estádio para assistir jogos de futebol.
Foi então
que eu e Junior Muelas, que estávamos perto da referida banca de jornais e ponto de
encontro, vimos uma cena dantesca.
O famoso jornalista que cobria a área de Rádio e TV,
Nelson Rubens, que era (é) famoso por protagonizar uma coluna de fofocas a abordar
principalmente o universo habitado por atores e atrizes de novelas, cantores populares e
subcelebridades em geral que habitam as emissoras de TV aberta, surgiu
a caminhar em meio à multidão de garotinhos "emo" e até então, ao ser abordado
discretamente, mostrara-se tranquilo a se dirigir em direção ao seu automóvel,
estacionado ali perto.
Quando ele chegou perto do carro, teve que pedir licença
para muitos jovens que estavam encostados em seu veículo, alguns até em clara
postura de abuso, sentados sob o seu capô. Nesse mesmo instante,
inevitavelmente algum galhofeiro gritou o famoso bordão que Nelson Rubens usava
(usa) exaustivamente em suas reportagens televisivas: -“eu aumento, mas não
invento”...
Como um fósforo aceso perto de uma bomba de gasolina, aquilo gerou a chama imediata, ou seja, todos à sua volta passaram a compor um coro, com essa frase e tal como uma palavra de ordem, a histeria ganhou força entre outros que nem estavam perto, a aumentar o contingente.
Como um fósforo aceso perto de uma bomba de gasolina, aquilo gerou a chama imediata, ou seja, todos à sua volta passaram a compor um coro, com essa frase e tal como uma palavra de ordem, a histeria ganhou força entre outros que nem estavam perto, a aumentar o contingente.
Até aí, tudo bem, Nelson ria e ficara nítido em seu
semblante que regozijava-se com tal demonstração espontânea de sua
popularidade, mas sob uma fração de segundos, alguém teve o ímpeto de empurrar o
carro e dessa forma, contaminados pela energia bestial que move as multidões bovinas, outros
seguiram a mesma ideia e assim começou um movimento físico intenso, a balançar o
carro perigosamente.
O coro engrossara e nesta altura, o jornalista que estava
já sentado dentro do veículo, mudara completamente a sua postura e gritava para
que parassem com isso e já não demonstrava estar a achar a brincadeira saudável
e claro que nessa proporção, não o fora mais e estava nas vias de fato do
vandalismo e da agressão gratuita.
Foi quando
alguns policiais aproximaram-se e nem precisou intervirem com truculência, pois
a garotada dispersou imediatamente e Nelson pode enfim engatar o seu carro e
partir em segurança.
É impressionante como a euforia desmedida gera violência sem
sentido, e através de uma fração de segundos e não por acaso, vemos cenas deprimentes em
festas, que deveriam se pautar pela manifestação coletiva de alegria pela sua motivação primordial, mas que culminam em
ocorrências policiais.
Imagino vc Rocker no meio dos EMOS kkk...legal e divertida crônica :)
ResponderExcluirFala, Kim Lima !
ExcluirPois é, éramos pouco Rockers genuínos ali em meio a uma multidão seguramente de vinte a trinta mil molequinhos emo...
Legal que gostou da crônica, sempre um prazer ter sua presença aqui com participação através de comentário.
Abraço !!
Imagino a cena, muita euforia e nenhum controle
ResponderExcluirAlô, José !
ExcluirPois é, a proporção que tal ato impensado da parte dos galhofeiros de plantão, ganhou, foi assustadora. Começou com uma brincadeira que parecia inofensiva, mas sempre tem alguém a interpretar euforia com truculência, infelizmente e assim contaminar a massa. Se não fosse a chegada dos policiais, receio que teriam virado o carro de rodas para o ar e isso se alguém não tivesse tido a ideia de incendiá-lo e particularmente, acho que não seria nada difícil para ocorrer.
Super grato pela visita ao Blog e participação com comentário !
Grande abraço !
Ô fase! Naquela época, eu estava iniciando a minha fase adulta. Ou seja, passei a adolescência nos anos 90. Eu curtia as músicas dos anos 80. Boa parte com qualidade duvidosa, mas me iniciou ao Rock. Tenho certeza que eu odiaria Kid Abelha se surgissem hoje.
ResponderExcluirEu gostava das bandas dos anos 90 pois a grande parte eu praticamente "vi nascer", tal como Raimundos, Planet Hemp, J. Quest (antes de mudarem o nome para JOTA Quest e fazer aquele pop fraquinho. Eu gostava do primeiro disco por ter elementos funk e resgatava sons de Hyldon, Betinho e seu Conjunto, numa época em que as revistas incentivavam odiar "dinossauros do Rock"), etc.
Já entre 99/2000, surgiam bandas fraquíssimas nas rádios onde o cheiro do jabá dava para sentir saindo do rádio. Surgiam bandas como Junk (odeio os Hanson..não vem que não teemmm), Mary's Band (happy birthday, fuck you), etc. Já sentia alguma coisa errada. E as bandas dos anos 80 pareciam que estavam perdendo a direção, só se mantendo com discos acústicos, até o formato ficar saturado.
Já a partir de 2001, a coisa piorou. Enquanto a mídia um super hype para The Strokes (dizendo que o espírito undergroun novayorquino do Velvet Underground estava de volta - difícil hein), Linkin Park e bandas de metal pula-pula, com integrantes ostentando bonés, correntes no pescoço e na carteira, calça abaixada a ponto de mostrar a cueca, tatuagens, etc., aqui a "cena" ia de mal a pior: Herbert Vianna fica paraplégico após acidente de avião, Rodolfo deixando os Raimundos, Marcelo Fromer fora atropelado e morreu, Frejat desperdiçando sua voz em músicas bobinhas e deixando o Barão parado, Cássia Eller vindo a falecer, etc. E as bandas ruins, surgindo...os rumores escrotos de que "o Rock vai morrer/morreu/está morrendo" (eles não se decidem até hoje) começou a ganhar força nessa época.
Alô Raphael !
ExcluirMaravilha que postou o mesmo rico comentário que postara na rede social Facebook, quando do anúncio desta crônica. Agradeço-lhe por isso.
Bem, em relação à primeira parte de seu comentário, perfeita a análise. Sua percepção do momento cultural entre as décadas de oitenta e noventa, sob sua ótica, mesmo sendo um adolescente e iniciante na cultura da música pop em geral, impressiona pela precisão de dados e sobretudo por enxergar os meandros da produção e difusão cultural, que logicamente atendiam interesses comerciais bem delimitados e por conseguinte, sujeito a interferência ostensiva da ação do marketing e bem agressivo, por sinal.Sigo a minha resposta a acompanhar a divisão que estabeleceu, abaixo.
Eu já estava ficando de saco cheio, quando surgem do nada esses emos: moleques com franjas gigantes, lápis no olho e banalizando a palavra amor começaram a surgir aos montes. Hoje em dia nunca vi ex-emo. A vergonha deve ser enorme hahahahaha
ResponderExcluirO pessoal do Rock amava odiá-los, e isso os deu notoriedade a ponto de durar mais do que um verão. Acredito que tenha começado aí esse marketing de divulgar música ruim que continua forte cada vez mais (só o fato de a pessoa postar que fulano ou sicrana cantam mal, que as letras são ruins, isso acaba dando ibope pra esses "artistas". O simples fato de ignorar é mais fácil. Nunca ninguém vai me ver dizendo que os artistas da lata de Coca-Cola são ruins. Todos sabem. Se eu dou nome, a pessoa fica mais em evidência, estimulando curiosos a conhecer "a merda da vez" e aumentando o número de visualizações no Youtube). Ah, se o público do Rock simplesmente ignorasse...
As bandas desse movimento emo eram sofríveis. Embora fossem EMOtivas, não havia emoção. Técnica, qualidade, autonomia, etc. inexistiam. Tive uma chance de estar em um festival que tinha, dentre várias atrações (uma delas, Iggy & the Stoogws) o Good Charlotte, uma das principais bandas desse movimento na época. Horrível horrível horrível.
Essa molecada que quis causar com o Nelson Rubens nada mais era do que garotos mimados demais que achavam que os pais os odiavam, e que simplesmente ignoravam a história do Rock. E que certamente tomavam porrada de punks e de skinheads na Galeria do Rock.
Em meio a esse cenário musical, eu entrei de cabeça na rádio Kiss FM e pude cada vez mais me deleitar com clássicos e conhecer muita coisa que janais tocaria (e certamente jamais tocou) nas rádios jabazentas: Status Quo, Bad Company, Wishbone Ash, Ten Years After, etc. As outras rádios iam entrando cada vez mais na cova em que eles mesmos cavaram. Dessa vez, não tinham gravadoras dando dinheiro.
Continuação da resposta...
ExcluirExatamente, essa cena Emocore era tão insípida e pré-fabricada, que a sua metáfora sobre o que ocorria aos garotinhos que seguiam esse modismo nas dependências da Galeria do Rock de São Paulo, além de ser verdade, espelha bem o caráter insípido do modismo vergonhoso inventado na prancheta de algum marketeiro inescrupuloso e espalhado por seus lacaios, os malditos, "formadores de opinião".
Sobre a sua estratégia em não fomentar ainda mais a cena ruim ao falar mal dela, sem dúvida que é o antídoto mais eficaz para derrotá-la. Ao citar essa campanha da Coca-Cola em 2018,foi perfeito em sua colocação, concordo com o seu raciocínio.
Sobre o papel da emissora de rádio, Kiss FM na difusão cultural Rock de São Paulo, você tem razão, mas cabe uma reflexão a parte, que não comentarei aqui para não fugir do espírito de sua reflexão, contudo, oportunamente terei prazer em repercutir contigo, lembre-me disso, futuramente.
Se de um lado o surgimento da Kiss FM foi excelente para mim, por outro lado eu simplesmente ignorava qualquer outra rádio. Pegava asco cada vez mais. Ainda mais quando (diziam que foi a 89) entraram com uma liminar e deixou a Kiss uns 3 dias fora do ar. Cada vez mais sentindo que ia pro espaço, a 89 criou uma vinheta, dizendo que tocava o clássico (Jailbreak do AC/DC ao fundo) e que revelava atuais (não lembro qual era a banda - se Jet, Franz Ferdinand ou outra), mas não deu em nada e passou a tocar músicas de Jovem Pan e Mix FM (estou em dúvida qual das duas rádios eram patrocinadoras do evento mencionado na sua coluna hehehe, mas decerto que era uma das duas kkkk). Hoje dizem que tem 33 anos de Rock, mas isso não nos engana.
ResponderExcluirNessa época cada vez mais surgiam "os novos fulanos" e a maioria sucumbia nessa pressão. E não me chamavam atenção. As vezes a banda era até "legalzinha", mas meu ceticismo impedia de dar um chance. Nessas, eu simplesmente ignorei 1853, Viúva Negra, Baranga, Tomada e tantas bandas legais que surgiram nessa época. Joguei tudo no mesmo caldeirão e deixei passar. Depois de anos, e com a Kiss já ficando esquisita, comecei a correr atrás desse tempo perdido e conhecer as bandas do nosso underground (com os Kurandeiros me conquistando de vez), seja atuais seja os de outrora, das bandas mencionadas nesse parágrafo.
Desculpe pelos textos gigantescos. Sua coluna me fez refletir numa parte a qual foi muito importante e curiosa para a minha (in)formação musical. Grande abraço, querido amigo!
Continuação da resposta...
ExcluirEntão, essa sua determinação em correr para recuperar o tempo perdido e ao mergulhar de cabeça nas suas pesquisas, e descobrir o mundo do verdadeiro do Rock, infelizmente não é uma regra, mas a exceção. Se todo garoto que começa a ligar-se em música / Rock / cultura, através do bombardeio midiático e rompe com tudo e vai estudar a matéria, ocorresse, nós estaríamos hoje a viver um outro padrão de consciência cultural. Mas infelizmente, muito pelo contrário, vivemos tempos difíceis a digladiarmos diariamente com os tentáculos poderosos dos artífices da anticultura e aí, na proporção, estamos a lutar com estilingues contra ogivas nucleares. No entanto, não podemos esmorecer, mesmo que muito inferiorizados, pois esse lixo todo há de ruir. Não há como sustentar-se por muito tempo, mesmo tendo todo o apoio dos poderosos que dele extraem seus lucros fabulosos e certamente atendem interesses escusos, os mais diversos.
Fantástico saber que minha crônica despertou-lhe essa verdadeira tese que escreveu, repleta por argumentação sensata e bem embasada. Estou muito feliz por você ter publicado aqui esse comentário tão rico a despertar uma discussão prazerosa e altamente reflexiva. Fica o convite para participar sempre que sentir-se motivado e não furte-se ao direito de postar um texto longo, pois tudo o que escreveu, foi pertinente.
Grande abraço !!
Fico imaginando o que fariam com o João Gordo se fosse ele ao invés do Nelson Rubens rssss
ResponderExcluirGrande Alexandre !
ExcluirPois é, com a massa não se brinca e por pouco o citado jornalista não protagonizou uma tragédia ali na Praça. Agora, quanto ao que você imaginou, e a conhecer o temperamento da pessoa por você citada, certamente que o rumo teria sido outro.
Valeu por ler e participar com comentário !!
Grande abraço !!
Muito bom Luiz, são momentos que marcam nossa vida de forma até engraçada , onde será que andam esses Emos hoje em dia? Será que estão em outra modinha que a TV impõe para o público em geral? As vezes tenho a impressão que o rock aqui no Brasil está minguando, são poucos os pais que levam seus filhos nos eventos com bandas de rock ou que apresentam um instrumento e músicas que realmente fizeram a história do rock no Brasil, mas fica está reflexão qual será o futuro do rock neste país! Abraço meu amigo.
ResponderExcluirQue legal, Prik !
ExcluirExatamente, essa moda foi tão insípida, tão oca, que seus partícipes hoje em dia, devem omitir tal participação e entusiasmo que nutriram nos anos dois mil, de suas próprias biografias pessoais. Mais ou menos como as fãs do Menudo hoje em dia, a ter sua vergonha por terem seguido aqueles chicanos fakes e bregas. Sobre o futuro do Rock, sinto dizer que quanto mais afastamo-nos das raízes, mais ele vai ficando perdido e portanto, sem perspectivas em relação ao futuro...
Grato pela leitura e participação rica com opinião contundente !
Grande abraço !!