sexta-feira, 1 de abril de 2022

Crônicas da Autobiografia - Fanatismo a Gerar Vilipêndio Gratuito - Por Luiz Domingues

            Aconteceu no tempo do Pitbulls on Crack em 1995

Esta pequena ocorrência não diz respeito diretamente à minha banda na ocasião, mas esteve indiretamente ligada em sua órbita.

Foi em algum dia de junho de 1994 que um compromisso surgiu para a nossa banda e seria uma entrevista na qual todos os componentes participariam. Para facilitar a logística dessa ação, combinamos de nos encontrar em uma estação do metrô, especificamente a estação Paraíso.

Eu morava relativamente perto, cheguei primeiro e em seguida, o guitarrista solo da nossa banda, Deca, apareceu em uma das entradas dessa estação em que havíamos marcado o encontro.

Encontro aguardávamos a chegada dos outros dois componentes da nossa banda, ficamos a conversar animadamente, quando eis que vimos duas moças na faixa dos trinta anos mais ou menos, a nos olhar de uma maneira acintosa.

Elas não pareciam ser fãs de Rock and Roll, portanto, descartamos de imediato a hipótese de que elas pudessem ter nos reconhecido por nossa atuação como músicos de uma banda de Rock, que se não estava no patamar de celebridade mainstream, certamente mantinha exposição dentro desse nicho, com bastante aparições na MTV, por exemplo e isso poderia ocorrer, acaso essas moças fossem adeptas dessa cultura típica da década de noventa.

Muito pelo contrário, elas estavam trajadas de uma maneira bem característica a deixar claro que faziam parte de alguma denominação religiosa e além do mais, os seus olhares estavam carregados de um indisfarçável incômodo, certamente relacionado à nossa presença naquele hall de entrada da estação.

Relevamos, no entanto, pois estávamos entretidos em nossa conversa e a nossa única preocupação foi na verdade que os nossos colegas não demorassem em demasia para que não chegássemos atrasados ao estúdio de uma emissora de rádio.

Infelizmente, as duas moças não se contiveram apenas a nos mirar com semblantes de desaprovação e assim, eis que vieram em nossa direção com passos firmes a denotar a determinação de nos abordar.

A interromper-nos de uma forma rude, a mais impetuosa das moças se pôs a falar de uma maneira bastante agressiva e a usar de empáfia igualmente, ao dizer que nós que éramos “metaleiros” que cultuávamos o demônio deveríamos abandonar a “vida errática que levávamos” e nos rendermos ao seu Deus. Ao prosseguir no seu discurso inconveniente, afirmou que nós deveríamos cortar os nossos respectivos cabelos longos e pararmos imediatamente de ouvir a música do “demônio”.

Perplexos pela inconveniência, agressividade e claro, pelas asneiras que essa moça desconhecida perpetrara contra nós, perguntamos de pronto para ela: -“quem lhe disse que somos metaleiros?”

Tal pergunta, tecnicamente a dizer, foi um questionamento correto para início de conversa, porém, por outro lado se revelou como um erro de nossa parte, pois para uma pessoa de baixo nível cultural e com a mente carcomida por preconceitos e falta de discernimento completo, fazê-la entender tal nuance não faria nenhum sentido para ela.

Claro que ante ao seu ataque tresloucado, ela nem parou para pensar e buscar entender a nossa pergunta, e pelo contrário, seguiu a sua verborragia insana a nos dizer que nós servíamos os “demônios do inferno” e que tais.

Foi quando o Deca, que sempre foi um brincalhão contumaz, lançou uma ironia no ar, ao dizer que usávamos cabelos longos iguais ao do Ser que ela seguia tenazmente e sem entender a piada por ele lançada, ela retrucou com enorme arrogância que: -"somente ele teria permissão do seu Deus para usar cabelos longos, segundo constava em suas escrituras sagradas". E falou isso como se fosse um axioma irrefutável, o que nos causou espanto pela demonstração de extrema ingenuidade e também pela incrível falta de noção civilizatória de sua parte.

Cada vez mais histérica, a fanatizada seguidora de um orientador que certamente devia instruir os seus pupilos a abordar pessoas pelas ruas em nome das suas crenças paradigmáticas, ela aumentou ainda mais o volume de sua voz, a transformar aquela situação inconveniente em um escândalo, a chamar a atenção de outras pessoas que estavam ao nosso redor.

Foi quando o Deca mais uma vez resolveu investir no escárnio para encerrar a questão e ao usar um gestual teatralizado e bem exagerado, soltou a sua voz como um tenor de ópera e assim proferiu diversas palavras de ordem com sentido de uma ode a um determinado demônio infernal, e assim a fornecer a confirmação que ela esperava e certamente com o intuito de ironiza-la.

Então, a brincadeira dele surtiu efeito, pois as duas moças saíram a correr daquele hall, já a entoar cânticos que possivelmente elas usavam como algum tipo de proteção contra forças infernais, por orientação do seu tutor. Ou seja, a estratégia deu certo para espantar aquelas duas moças fanatizadas e completamente desprovidas de  educação básica.

Ironia das circunstâncias, tudo isso aconteceu sem que elas soubessem que éramos músicos e que a nossa banda detinha o nome de: Pitbulls on Crack, ou seja, se tomassem conhecimento desse detalhe, imagine o teor do chilique que teriam protagonizado...

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