quarta-feira, 2 de fevereiro de 2022

Pouco Trabalho e Muito Abuso - Por Luiz Domingues

Um pedreiro foi contratado para realizar uma pequena reforma em um escritório de advocacia. Ele não era nem de longe um profissional renomado no bairro sequer, mas como havia pressa na execução do serviço, o dono do escritório resolveu contratá-lo no afã de agilizar a resolução do problema.

Pois eis que o sujeito chegou para o primeiro dia de trabalho, fez a sua avaliação da situação e elaborou uma lista de materiais necessários para a execução do serviço. Liberada a verba para a aquisição dos produtos, ele foi à loja de material de construção e trouxe tudo, mas ao alegar que ficara tarde demais para iniciar naquele mesmo dia, eis que postergou o início do trabalho para a manhã do dia seguinte.

Isso de fato ocorreu, mas logo no dia posterior, ele faltou ao trabalho, ao alegar algum problema de saúde. E quando voltou ao serviço, procurou o domo do escritório para lhe pedir uma quantia irrisória a fim de comprar dois parafusos e duas buchas. Advogado muito ocupado com demandas jurídicas complexas, este não acreditou que o rapaz o procurou para lhe pedir esse valor íntimo.

Visivelmente irritado com essa interrupção inoportuna, ele simplesmente lhe perguntou se a falta de dois míseros parafusos não fora por conta do erro de cálculo quando da elaboração do material inicial ao que o pedreiro retrucou que obra é assim mesmo, portanto, se o doutor não fornecesse tal dinheiro, a obra ficaria paralisada. 

Isso foi a gota d’água, pois o advogado ficou muito incomodado com essa fala com tom ameaçador desferido pelo pedreiro e somado à irritação anterior de ter sido interrompido por uma motivação tão insípida, ele simplesmente tirou a carteira do bolso, lhe deu uma importância em dinheiro e o exortou a ir logo comprar os tais parafusos e buchas e que voltasse ao trabalho imediatamente.

Profundamente contrariado com essa situação, o advogado solicitou à sua secretaria que doravante, não gostaria mais de tratar nenhuma questão com esse rapaz e que ela assumisse a interlocução direta.

Então, a secretária conversou com o rapaz e lhe adicionou em uma rede social de recados rápidos, para poder tratar com agilidade sobre a obra.

Daí em diante, o pedreiro começou a enviar uma quantidade absurda de mensagens. Em princípio, baseado em fatos referentes ao serviço, mas de forma descabida, a comemorar com fotos e vídeos, fatos completamente irrelevantes a dar conta de cada minúsculo avanço do trabalho e obviamente que a secretária notou a verdadeira motivação do sujeito em bombardeá-la com tantas mensagens.  

No entanto, mesmo que o rapaz não fosse explícito e lhe desferir gracejos, ela logo notou o abuso e assim, apenas respondia as questões referentes à obra, como forma de deixar bem claro como conduziria a conversa e nem respondia as demais mensagens ou repercutia os vídeos bisonhos que ele mandava a mostrar encanamentos, tijolos sobrepostos e massa corrida a ser preparada.

Na contrapartida das suas bravatas, na verdade a obra estava a ser conduzida de uma maneira bisonha e mesmo a se colocar como equidistante dessa relação, na verdade p advogado percebera a morosidade e instruía a sua secretaria a cobrar celeridade do pedreiro.

Isso sem deixar de mencionar que funcionários do escritório haviam flagrado o pedreiro a promover sessões de flatulência no meio do expediente, enquanto o seu assistente, um adolescente, apenas ria da situação e claro, ambos sem trabalhar, como se estivessem em uma atividade recreativa da quinta série.

Três dias depois e com a obra longe do seu término, o rapaz procurou o advogado diretamente a lhe dizer que a sua vida estava a viver um inferno por conta da secretaria que tratava diretamente com ele.

Segundo o pedreiro, a secretaria havia se apaixonado perdidamente por ele e a abrir um parêntese em tom bastante presunçoso, ele acrescentou que isso não o surpreendia pois ele se sentia mesmo irresistível para as mulheres.

Atônito, o advogado nem teve força para interromper e seguiu a ouvir. Foi quando o petulante pedreiro foi mais incisivo ao dizer-lhe: -“Doutor, por causa do assédio insuportável da sua secretária, a minha esposa está em pé de guerra comigo, a falar sobre divórcio, eu não posso mais admitir essa situação”.

E foi além ao ameaçar: -“Doutor, ou o senhor afasta essa secretária daqui ou eu largo a obra”.

O velho advogado colocou calmamente os seus pesados óculos no rosto, tirou um maço de dinheiro da gaveta da sua mesa, e a falar com aspereza lhe disse: -“O senhor pegue o seu pagamento pelo serviço, recolha as suas ferramentas e desapareça daqui, não quero vê-lo mais”.

A se mostrar indignado, o pedreiro também elevou a voz e perguntou: –“mas o obra não acabou, o senhor vai me mandar embora, deixar o serviço pela metade e proteger a sirigaita da sua secretária? E como que eu fico? A minha mulher quer o divórcio por causa dessa mulher assanhada que dá em cima de mim, isso não é justo.

O advogado respirou fundo e lhe disse: -“tome aqui o cartão do escritório e peça para a sua esposa telefonar para a minha secretária”.

Rindo, o pedreiro retrucou em tom de estupefação ao dizer: -“Pelo amor de Deus, doutor, o senhor enlouqueceu? Justo para aquela mulher que está destruindo o meu casamento?”

O advogado colocou o cartão no bolso da camisa do pedreiro e lhe disse: -“não sou louco, não, rapaz. É para a sua mulher me ligar que eu faço questão de preparar a papelada do divórcio, gratuitamente, para ela”.

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