Em uma pequena agência de publicidade de uma cidade mediana do meio-oeste norte-americano (Davenport, Iowa), um dos seus sócios era bastante egocêntrico, embora não admitisse de forma alguma que tivesse tal traço forte e absolutamente visível em sua personalidade.
Dessa maneira, pelas atitudes e também pelo discurso proferido, essa presunção de se achar um gênio da publicidade era algo bem nítido para muitas pessoas do meio, notadamente os seus sócios que toleravam tais arroubos de soberba do rapaz, naquele tipo de predisposição de achar que isso seria um comportamento inadequado, certamente, mas algo a ser considerado como característica pessoal do colega tão somente e por conseguinte, não maculava a imagem da agência ao ponto de motivar prejuízo para os seus negócios.
No cotidiano do escritório, não se pode dizer que ele não fosse motivado a criar e buscar soluções para os desafios que surgiam para atender as reivindicações dos seus clientes, contudo, ele nutria uma espécie de auto avaliação a superestimar as suas ideias em detrimento das propostas de criação advindas de seus colegas, e isso o cegava completamente.
Em meio às reuniões de criação, ele apresentava com tanta paixão e convicção as suas ideias, que praticamente deixava a possibilidade de haver questionamentos como algo impossível, pois ele simplesmente não dava espaço algum para tal.
Primeiro que após a entusiasmada exposição das suas criações, quando alguém questionava, mesmo com muito tato algum ponto, ele mudava o comportamento ao elevar o volume da voz e usar da artimanha de desdenhar dos pontos levantados e também por estabelecer uma verborragia bem tensa, ao tratar de deixar o ambiente tão tóxico que os interlocutores simplesmente se calavam para que as reuniões não se tornassem um ambiente de guerra.
Nesse ponto, pairou a dúvida sobre se tal situação seria algo meramente aleatória ou uma estratégia bem definida da parte dele, para que sempre quando fosse acuado, levasse a discussão para a sua zona de conforto e assim inibisse os seus interlocutores.
E como os demais silenciavam, a situação se tornava bizarra, no sentido de que aceitavam passivamente a explosão de nervos de alguém que se considerava como um brilhante promotor público a falar com veemência para denotar possuir uma farta argumentação e demarcar dessa forma a certeza absoluta de que estava com a razão no cenário de um tribunal de júri.
Da parte dos demais, aceitar tal verborragia se mostrara como uma estratégia errada, pois assim talvez esperassem evitar, por conseguinte, que o clima desagradável ali gerado ficasse ainda pior, mas na prática, isso não mudava o panorama dentro daquele escritório.
No entanto para o soberbo colega, a interpretação era outra: ele se alimentava da ideia de que os demais eram inferiores intelectualmente, sem condições de arguir argumentos sólidos para confrontá-lo e mais ainda, que seriam fracos pelo aspecto da personalidade, e assim, ele se sentia ainda mais poderoso para dominar as ações ali dentro, no campo psicológico.
Então, aos poucos, o reflexo de seu modo de agir e pensar, a representar a imagem da agência a reboque, passou a enfrentar consequências externas da parte da clientela que notara nitidamente a antipatia gerada e diante da imagem maculada da agência por conta disso, foi a se afastar e procurar outros profissionais para movimentar as suas respectivas contas.
Bem, a primeira reação dele foi se revoltar com as críticas, ao se colocar como alguém injustiçado e incompreendido e que as queixas que surgiam seriam, portanto, mais do que infundadas, mas a se constituir de uma forma de ataque pessoal da parte de invejosos motivados pelos supostos méritos que a agência possuía em sua atuação e leia-se: ataques frontais às suas ideias, por conseguinte, contra ele mesmo, como algo pessoal.
Um dos membros da agência falou nessa mesma reunião que as críticas externas deveriam ser ouvidas e analisadas como uma prática de reflexão interna e o mundo caiu sobre ele, pois o colega presunçoso ficou irado com tal colocação, ao alegar falta de solidariedade desse colega para com o escritório.
Mas não foi o caso, absolutamente e assim, a cegueira do soberbo que se considerava o gênio motriz do escritório não o deixava considerar que talvez ele não fosse tão genial quanto se considerava em sua auto avaliação egóica.
Era comum igualmente que os colegas sofressem humilhações veladas no cotidiano e que além da grosseria em si, servia para alimentar o domínio ali estabelecido e assim a ofertar pouco espaço aos demais componentes da agência.
Uma vez, por exemplo, um colega disse estar com duas ideias novas para lhe mostrar. Com nítido ar de deboche o rapaz que se achava um soberano ali dentro, disse com indisfarçável desdém que aceitaria tomar conhecimento das tais ideias e quando o rapaz iniciou a sua exposição, ele mal conseguiu terminar uma frase inteira sequer, pois simultaneamente, o egocêntrico de plantão já propôs modificações na estrutura da proposta, que de tão radicais que se mostravam, automaticamente a destruía, ao descaracterizar toda a intenção concebida pelo colega e na verdade, a propor algo que lhe agradasse mais.
Constrangido com tal comportamento tão desrespeitoso, o rapaz preterido quis mostrar uma segunda ideia. Porém, assim que ele começou a expor, observou no semblante do colega, que este estava a considerar a ideia insípida, a demonstrar pela expressão facial que não teria nem vontade de expressar a sua opinião a respeito, mas apenas com o olhar a demonstrar tédio, já deixara claro a sua avaliação sobre tal.
Em seguida, alguém tocou a campainha da casa e ele deu a desculpa de não haver ninguém para atender a porta, para se levantar com o intuito de tomar conhecimento do que se tratara.
Quando voltou à sala de reuniões, eis que mudou radicalmente de assunto, a denotar que a sua atenção para acatar a ideia do colega estava encerrada e assim a deixar claro que achara ridícula a proposta. Ainda com o papel na mão, a conter as anotações sobre a sua criação, o rapaz se sentiu tão diminuído que simplesmente não teve forças para interpelar o colega para retomar a discussão interrompida bruscamente e encerrada de forma deselegante, como se esta não representasse nada.
Mais adiante, o sujeito propôs enfim uma reunião de “brain storm” para se desenvolver um slogan de um produto para um cliente. Todos se animaram, pois até que enfim trabalhariam como uma equipe, com todas as opiniões a serem levadas em conta.
Todavia, foi um ledo engano, pois não passara de uma farsa criada para que todos acreditassem que haveria boa vontade para haver a cooperação mútua e isso se escancarou quando em meio a muitas sugestões que foram a surgir espontaneamente da parte de todos, ele sistematicamente rebatia todas, a usar de argumentos estapafúrdios para justificar a sua rejeição, e assim reforçar a ideia de que o seu crivo era de altíssimo padrão, ou seja, mais uma vez a exibir a sua arrogância com a deliberada vontade de dominar e humilhar os colegas.
E assim, chegou-se em um ponto no qual ele escancarou a sua forma de pensar, quando cansado de rebater as ideias alheias, pediu silêncio, com bastante veemência, pois precisava “pensar com sossego” para achar uma ideia boa, ou seja, ele nunca considerou a hipótese de levar em conta a cooperação coletiva, pois no seu ponto de vista, somente as suas ideias seriam geniais.
A alimentar uma postura cada vez mais antipática no mercado, a agência perdeu muitas contas e fechou. Pior ainda, o sujeito passou a culpar o seus ex-colegas pelo fracasso, ao alegar que eles não faziam absolutamente nada, pois eram inaptos, preguiçosos e pior ainda, sanguessugas, pois só se fizeram valer do esforço e da criatividade dele para crescerem na profissão, a “montar nas suas costas" etc. e tal.
Então ele anunciou com alarde que abrira uma nova agência e desta feita, somente com subordinados para atender as demandas operacionais básicas e com toda a parte de criação sob o seu comando exclusivo.
Imediatamente, ele recebeu apoio de uns poucos admiradores da antiga agência, e anunciou uma primeira campanha criada então para demarcar a sua nova fase, livre dos seus ex-colegas, por ele considerados como trastes sem criatividade, além de omissos dentro da agência antiga e assim, cheio de confiança apareceu a falar até na TV local para comemorar antecipadamente a vitória retumbante que teria, como uma certeza na sua ótica.
No entanto, a campanha por ele criada não redundou em nada, infelizmente.
Frustrado com o resultado pífio da sua empreitada sem a presença dos antigos colegas, ele propôs a volta da antiga agência e ao abordar os colegas, deixou claro que se colocaria doravante com uma postura diferente em termos de comportamento no trato pessoal e que não haveria da parte dele a mesma predisposição nociva no ambiente de trabalho, além do que, as ideias alheias seriam ouvidas e testadas sem a sua rejeição sumária por antecipação. Que bom, ele reconhecera os seus erros, pensaram os demais.
A agência voltou à ativa com a equipe antiga reintegrada e não passou nem dez dias de trabalho para que uma ideia fosse lançada por um membro e imediatamente foi rejeitada pelo sujeito de uma maneira absurda, ao alegar simplesmente que a considerara fraquíssima, mas sem maiores explicações sobre o teor da sua avaliação tão vaga.
Bem, os maus tempos haviam voltado, definitivamente e a seguir, a turma debandou novamente ao sentir que o colega não mudaria nunca, pois tal questão egocêntrica era algo enraizado e jamais sairia da sua personalidade.
E só para constar, a tal ideia considerada como ‘ridícula’ pelo presunçoso, foi apresentada em outra agência para ser aprovada por aclamação, e assim, gerou um sucesso muito grande ao concorrente.
Em suma: a presunção gera a soberba e ambas em conluio, cegam.
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