Aconteceu em
meados de 2001, no tempo da Patrulha do Espaço...
Recebi o
convite certa vez para ser componente de um corpo de jurados, a fim de apreciar
e eleger uma banda vitoriosa em um embate desses em tom de festival.
Menos mal, pela
questão de cada artista ter pelo menos trinta minutos de exposição no palco, não se tratou de um festival tradicional nos moldes da qualificação de compositores, a se elegerem-se
músicas inéditas, tampouco show de calouros, para buscarem-se aspirantes a cantores,
mas sim, um festival de bandas cover ou melhor a dizer, bandas “tributo”,
a visar premiar a melhor performance da noite.
E a premiação se mostrara bem razoável
ao vencedor, ao oferecer uma quantia em dinheiro e uma data para uma
apresentação regular e remunerada, na casa em questão.
O mundo das
bandas cover não é da minha predileção e mesmo os mais convincentes intérpretes
que empenham-se com afinco impressionante a reproduzir o trabalho de artistas
consagrados, não comovem-me, apesar de todo o seu esforço e apuro, com todo o
respeito.
Não menosprezo a sua labuta e nem mesmo o seu nível técnico,
muitas vezes bem alto e que justifica a sua condição para reproduzir o trabalho de artistas de
alto nível, ainda assim, ou mesmo por isso, sempre vou achar que seria bem mais
interessante que tais artistas da reprodução musical do trabalho alheio, dedicassem-se ao trabalho autoral e não tenho
dúvida, muitos tem um talento criativo, latente e enorme, portanto,
contribuiriam com a formatação de uma cena artística muito mais forte.
E claro que eu levo em consideração que muitos gostariam de ter uma carreira autoral sustentável, mas em um país como o Brasil, isso é praticamente impossível. Ao ir
além, cabe ressaltar que eu jamais poderei deixar de reconhecer que artistas
que dedicam a sua carreira à execução do trabalho consagrado de outrem, também
estudaram para aprender a tocarem instrumentos e cantarem, muitas vezes por anos a
fio com dedicação e mediante sacrifícios pessoais acentuados, além de
invariavelmente, terem gasto um significativo montante para investirem em bons
instrumentos, equipamentos e acessórios para poderem atuar com qualidade
assegurada de seu áudio, portanto, mais um esforço pessoal notável de sua parte.
E para
encerrar as minhas ressalvas respeitosas aos músicos que vivem desse tipo de
expediente, é lógico que sendo uma atividade honesta, tem a sua legitimidade e
além disso, o simples fato de que através desse trabalho, esses artistas podem colocar comida
em cima da mesa de suas respectivas famílias, já ganham o meu inteiro respeito e
convenhamos, desperdício de talento a parte, o que fazem é manter acesa a chama
da arte vinda da parte de artistas consagrados que admiramos, portanto, não poderia ser nunca
considerado um malefício, mas muito pelo contrário, é uma espécie de serviço de
perpetuação da boa arte, ao manter o seu valor agregado, portanto.
Só mais um ponto a
ressaltar-se, também não é fácil tocar geralmente para plateias desinteressadas
e quase sempre formada por pessoas embriagadas/drogadas e muito mais ocupadas em procurarem parceiros sexuais nas noitadas, do que a prestarem atenção em tais músicos,
portanto, há esse lado obscuro e desagradável para quem atua nas ditas bandas
cover, como dissabor pessoal, eu reconheço e solidarizo-me com tais músicos.
Feitas as
minhas respeitosas ressalvas para quem milita nesse mundo profissionalmente, digo
que não fiquei nada empolgado ao receber o convite para ser componente de um
corpo de jurados, a fim de analisar performances de bandas cover, por todas as
razões acima elencadas, mas acrescento que fiquei constrangido em ter a
responsabilidade de fazer um julgamento pessoal de cada banda ali a colocarem as
suas esperanças de vitória e a dependerem de minha avaliação.
Se fosse pela minha vontade, o tal festival
jamais teria enfoque na competição, mas haveria de ser uma mostra livre, com
cada banda a fazer o seu show e sem julgamentos da parte de ninguém, a não ser
pela legítima espontaneidade do público, mediante a intensidade maior ou menor
da salva de palmas, gritos & assovios e até mesmo de uma eventual vaia, que
não é agradável para o artista em cima do palco, mas é aceitável como
manifestação natural e legítima mediante um possível sinal de desagrado por parte da audiência.
Todavia, não foi essa a intenção da casa de espetáculos que convidou-me e como ali eu já houvera
participado com shows de minha banda, a Patrulha do Espaço, em ocasiões
próximas passadas, recusar teria sido uma quase afronta aos dirigentes do
estabelecimento, mesmo porque o convite fora feito sob o signo da honraria,
a denotar que a minha participação lhe era importante por eu ser membro de uma
banda autoral consagrada no métier do Rock Brasileiro e por conseguinte, a minha presença
ali, no seu imaginário e principalmente para os músicos das bandas cover que apresentar-se-iam,
fora tida como um estímulo e certamente um sinal de status da casa em ter
alguém ali oriundo de uma banda de projeção nacional, para compor o corpo de jurados.
Certo, diante
dessas prerrogativas, lá fui eu em um sábado a noite de 2001, ao bairro Assunção,
da cidade de São Bernardo do Campo, na região do ABC paulista, fazer parte dessa
aventura diferente, pois eu nunca houvera sido convidado para tal tarefa,
anteriormente.
Desconfortável
pela missão desagradável em ter que estabelecer um parecer sobre a performance de
outros artistas, e pior ainda que isso, na perspectiva do meu voto vir a significar alegria para um e
frustração para os demais, imbuí-me de resignação pela situação inevitável e assim
munido com as fichas de cada banda em mãos e caneta, fui a redigir os meus
relatórios sobre o que achei de cada uma e sobre as suas respectivas atuações.
Infelizmente,
a grande maioria ali inscrita para o festival, professava o Heavy-Metal como
um baluarte e notadamente eis aí um gênero musical que eu desgosto profundamente.
Pior ainda, entre os que atuaram dentro dessa vertente, alguns representaram
bandas internacionais voltadas ao dito "Metal Melódico”, pleno de virtuosismos,
exageros & afins, para tornar a minha noite, uma tortura sonora a sentir-me
desconfortável em ter que opinar nessas circunstâncias adversas.
Claro,
esforcei-me ao máximo para não misturar o meu (des)gosto pessoal com a análise e
procurei exprimir no relatório, os méritos de cada banda e emitir, quando fiz
comentários negativos, um tom de crítica construtiva, sem execrar deméritos,
mas a sugerir melhorias, que espero terem absorvido com respeito e quiçá
a enxergar algo bom para corrigirem.
Somente uma
banda agradou-me pela proposta estética e tratou-se de uma a ter a proposta de homenagear a imortal, Janis Joplin, cuja vocalista esforçou-se muito para chegar minimamente perto da voz e
performance da grande pérola de Port Arthur, Texas, mas convenhamos, isso foi quase humanamente impossível.
Conheci algumas cantoras que dedicam-se a isso
com brilhantismo, caso de Vera Negri nos anos oitenta e Xandra Joplin e Fabi
Joplin mais recentemente, e de fato, essas três são muito boas na proposta de
fazer tributo a Janis Joplin, mas mesmo assim, Janis é inimitável em essência,
tamanha a sua condição monstruosa, sobre-humana, praticamente como cantora e performer.
Mas eu fiquei
tão feliz por ver uma banda fazer um tributo a um ícone sessentista dessa
grandeza, ali em 2001, quando a maioria estava naquele momento inebriada por
"Iron Maiden", "Metallica", "Dream Theater", "Red Hot Chilli Peppers" e "Motorhead", que
cheguei a escrever no relatório que chegou às mãos da banda, que eles haviam
salvado a minha noite.
E o grupo era bom, tocava com um balanço legal. A
cantora não era ruim, mas apenas a sua tarefa fora inglória ali e como um trunfo a
mais, eles tiveram o bom gosto de usar um visual “hippie chic” bem convincente,
a fugir do estereótipo de um figurino de festa a fantasia mal-ajambrado e
caricato.
E foi assim,
após uma overdose de Heavy Metal e virtuosismos histriônicos sem fim, ao menos eu pude ouvir
canções marcantes como: “Ball and Chain”, “Try” e “Piece of my Heart”, com uma performance razoável e no tocante às minhas avaliações, esforcei-me para ser 100% justo em
minhas ponderações ao emitir opiniões
sinceras e procurar ser construtivo ao comentar aspectos negativos em respeitoso tom de crítica justa.
Mas vamos
combinar assim, doravante: festivais para novatos, sim, mas sem caráter de
competitividade! Sem avaliações, notas, vencedor e perdedores, mas com espaço
para todos tocarem livremente e de preferência, a executarem as suas composições
próprias, certo? A cena musical agradece!
Nenhum comentário:
Postar um comentário