Aconteceu no
tempo da Patrulha do Espaço, em janeiro de 2000
Estávamos
a gravar o álbum “Chronophagia”, da Patrulha do Espaço, em janeiro de 2000, no
estúdio Camerati, de Santo André-SP, cidade localizada na região conhecida como
Grande ABC, integrante da gigantesca mancha metropolitana de São Paulo.
Tal estúdio fora bem usado nos
anos anteriores, mas naquela ocasião, estava decadente, a carecer de reformas em
sua estrutura física, ainda que a parte operacional do equipamento, propriamente
dito, ainda estivesse em ordem, com tudo a funcionar a contento.
Entretanto, o
seu proprietário na época, já havia desistido de investir nas suas melhorias e mediante o pedido
do proprietário do imóvel para a devolução do mesmo, resolvera vender todo o maquinário
e fechar as portas. Portanto, nós fomos os últimos artistas a usufruírem de suas
instalações e o nosso álbum ali em construção, “Chronophagia”, tornou-se por conseguinte, o último disco
ali gravado, oficialmente.
Esse estúdio
continha uma particularidade interessante em sua arquitetura, pois por tratar-se de
uma antiga residência de alto padrão, era muito amplo e com um desenho estrutural
arrojado, a fugir do padrão de uma residência familiar tradicional, porém, por
apresentar salões enormes, o que possibilitou que tal empreendimento fosse
adaptado para ser usado como um mini centro cultural, mediante um auditório na sua parte interna,
dentro de um salão que deve ter sido uma espécie de “living room” muito amplo,
anteriormente.
E o estúdio em si, ficava alojado em uma instalação igualmente
ampla, montada no quintal, ricamente ajardinado, como uma sala de inverno
charmosa e sob um belo paisagismo, mas isso em um tempo anterior, deduzíamos, pois
estava tudo muito mal cuidado nesses tempos decadentes em que vivera os seus últimos dias e assim, a meta do seu mandatário foi
sucatear o estúdio, vender o seu equipamento e entregar o imóvel ao
proprietário, que nessa altura já estava apalavrado com um empreendedor que
visava montar ali um restaurante de cozinha japonesa, sob alto padrão (e foi o
que ocorreu, meses depois).
Foi quando
surgiu a ideia para aproveitarmos a nossa maratona de sessões ali e produzirmos um
show no pequeno auditório do complexo e assim, logicamente ao visar aproveitar a
estrutura do estúdio para gravar o concerto. Tudo isso eu contei com detalhes no
texto do meu livro autobiográfico, mas aqui eu exponho um detalhe inédito e
inusitado.
O dono do estúdio na ocasião, foi o cantor/compositor, Belchior,
uma figura sensacional da MPB setentista, autor de muitos clássicos naquela
década etc. Contudo, ele não teve nenhuma intenção de salvar o estúdio, que
já comprara por um preço reduzido da parte do antigo dono, consciente de que estava
decadente e dessa forma, o seu plano foi apenas o de ganhar algum dividendo com a venda
do equipamento e nada mais.
Portanto, ele nem aparecia por lá e deixara a
responsabilidade da sua administração em seus dias finais, ao técnico de som
que cuidou de nossa gravação e só havia um funcionário (um faxineiro), que astutamente, ao perceber a decadência do espaço e por antever a perda de seu emprego, ficava
nos quartos vazios do patamar superior, a aproveitar a calmaria total e simplesmente
dormia o dia inteiro, sem pegar em uma vassoura, em hipótese alguma.
Quando esse rapaz soube
que nós tencionávamos fazer um show no auditório, veio rapidamente dizer-nos que
haveria uma “taxa de limpeza”, que seria supostamente uma ordem expressa de seu
patrão. Pura balela, Belchior nem aparecia ali e claro que a sua intenção fora apenas
amealhar dinheiro para o seu bolso.
Então,
quando percebemos o golpe do aspirante a astuto, dissemos-lhe que pagaríamos após o
show e então, nós ficamos a observar os seus movimentos na contrapartida.
Claro que ele
fingiu empenhar-se, ao passar uma vassoura fortuitamente pelo auditório, mas
isso revelou-se risível, pelo serviço ridículo que empreendia, que mal conseguia disfarçar de tão
embusteiro que ele era. Então, nós enfatizamos que ele deveria esmerar-se em limpar bem
não apenas o auditório e a entrada do estabelecimento, mas sobretudo os banheiros
que serviam a parte concernente ao auditório e que seria usado pelo público, que
esperávamos.
E como havia uma quantidade deprimente de baratas mortas ali nos
banheiros, reforçamos a ordem para ele cuidar disso. Infelizmente, ele não fez
nada e quando demos conta disso, ficamos chateados, mas certamente que instaurou-se
a determinação para não pagarmos absolutamente nada ao elemento.
Não dava tempo para
tomarmos providências em outro sentido, porque a montagem do equipamento e preparação da
gravação do show consumiu-nos horas e assim, envergonhados parcialmente,
assumimos a ideia de que o público teria banheiros sujos à sua disposição, com
baratas mortas pelo piso, mas por outro lado, se a produção do show fora nossa,
é bem verdade, a casa estava em más condições e supostamente cobrara uma taxa
para tal providência ser tomada e ao não cumpri-la, eximira-nos totalmente de
culpa perante o público e principalmente da obrigação de pagar por algo que não
fora feito, como um serviço prometido.
Pois bem, fizemos o show no sábado e na segunda-feira
posterior, quando o sujeito veio cobrar-nos, ele foi conduzido por um membro da
nossa banda a uma inspeção nos banheiros e ao mostrar-lhe as baratas mortas na
mesma posição em que ele as vira na sexta-feira, o embusteiro percebeu que a nossa recusa para pagá-lo, não oferecer-lhe-ia a chance de nenhuma contra-argumentação em contrário.
Ainda bem que nenhum
usuário do recinto, oriundo do público, teve a ideia de “chutar” os corpos
inertes dos blatídeos, a destruir assim
a nossa prova cabal contra o nosso golpista “barato”...
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