O imaginário
popular criou o paradigma de que uma repartição pública é um ambiente de
trabalho absolutamente entediante para os seus funcionários, dada a sua
constituição baseada na burocracia massacrante.
Faz sentido pensar assim, pois
se houvesse menos entraves, o dinamismo do serviço público em geral, seria muito
mais eficaz e saltaria aos olhos do cidadão comum que só o enxerga como algo
inútil e antipático, no sentido de que geralmente trabalha na contramão, para atrapalhar o progresso.
Faz sentido, igualmente, em
linhas gerais. No entanto,
é um erro achar que toda repartição é desse jeito, e sim, existem as suas
exceções, aliás, a realidade mostra que a lenda urbana maledicente exagera e a proporção é inversamente proporcional a pender para o lado bom.
E ao exaltarmos o lado bom, existem as muitas que se empenham em
trabalhar com dinamismo, a cumprir metas e assim apresentar bons resultados.
Foi o caso
de uma repartição em específico, que cuidava de maquinários da prefeitura de uma cidade de
grande envergadura e portava-se com uma obstinação impressionante.
E entre os seus
líderes, havia um sujeito chamado: Sinval, que também era conhecido
informalmente como, “Sinval das Máquinas”, por ser chefe de tal departamento e
por sinal, muito competente.
Ele era idolatrado pelos funcionários da
repartição, exatamente pela sua capacidade e poder de liderança, mediante um
temperamento forte, a demonstrar determinação, mas esse seu lado poderoso de
sua personalidade também trazia no bojo o lado obscuro, ao apresentar o seu gênio
irascível, em que demonstrava o tempo todo que não suportava ser contrariado sobre as suas ordens, ao passar do ponto, muitas vezes, quando não continha a sua fúria desmedida.
Certa vez,
conta-se que alguém quis brincar com ele e inocentemente o chamou como: “Simbad,
o marujo”. Ser chamado de “Sinval das Máquinas” não
o incomodava, pois ele se sentia de fato o líder daquela repartição, mas a outra
alcunha a fazer menção a um personagem da literatura e do cinema, ele não suportou e assim, na posse de uma chave de fenda bem grande que detinha em
mãos, foi para cima do autor do gracejo e assim foi difícil para a chamada “turma do
deixa disso”, contê-lo.
Tempos depois, eis que um funcionário novo entrou na repartição e logo foi
avisado por alguns veteranos de que Sinval era um funcionário exemplar, mas
não era de bom alvitre forçar nenhuma brincadeira com ele. Com o dito “pavio
curto” como característica pessoal, Sinval era um rapaz com quem seria possível se
conviver bem, desde que certos cuidados fossem observados no cotidiano, pois
ele sempre tendia a mostrar-se contrariado e/ou ofendido facilmente e nessa
circunstância, partiria sem pestanejar para as vias de fato.
Mesmo
ao evitar ter muito contato com ele, já alertado sobre o gênio do chefe, eis que um dia
um fato ocorreu e por azar, esse tal funcionário novo fora o sujeito errado, na
hora errada a encontrar-se com Sinval, no corredor central da repartição.
Ao parecer estar apreensivo, Sinval estava com uma caminhonete parada na porta, lotada
com materiais a serem descarregados e o pátio não comportava mais nenhuma viatura,
portanto, a ideia foi descarregar tudo rápido, a fim de dispensar a viatura
que era de outro departamento e precisava voltar imediatamente à sua base.
De pronto, Sinval olhou para o novo funcionário e o intimou a ajudar nessa tarefa. Até aí tudo bem, não era a sua função ali, mas o rapazinho foi junto a Sinval, sem nenhum sinal de contrariedade, dentro do melhor espírito cooperativo.
De pronto, Sinval olhou para o novo funcionário e o intimou a ajudar nessa tarefa. Até aí tudo bem, não era a sua função ali, mas o rapazinho foi junto a Sinval, sem nenhum sinal de contrariedade, dentro do melhor espírito cooperativo.
Contudo, assim
que ambos chegaram à calçada, Sinval irritou-se com a suposta lentidão do rapaz para
apanhar os materiais, quando na verdade este estava mais lento por ser zeloso, ao segurar os
objetos com cuidado, para não danificar nada. Mas Sinval estava tomado pela
irritabilidade gerada pela pressa da situação ali instaurada e nervoso, passou
a gritar, ao exigir maior rapidez.
Ao sentir-se pressionado, o rapaz retrucou que
se o chefe desejava a pressa na execução da tarefa, Sinval deveria ajudar igualmente e não
ficar ali a portar-se como um alucinado sargentão de pelotão militar a exortar
os soldados a cumprirem tarefas mediante seus berros ensandecidos. Ora, ora... ele foi
falar assim justamente com o temperamental, Sinval?
Enfurecido, o irascível Sinval viu o seu subordinado enfrentá-lo como a maioria nunca teve a coragem de fazê-lo, e assim com a verborragia a ficar exaltada na calçada, mas desta vez ele percebera que apesar de jovem e novato ali, o rapaz continha um gênio parecido e não abaixara a cabeça ao temer por represálias, tampouco a ameaça física pura e simples.
Enfurecido, o irascível Sinval viu o seu subordinado enfrentá-lo como a maioria nunca teve a coragem de fazê-lo, e assim com a verborragia a ficar exaltada na calçada, mas desta vez ele percebera que apesar de jovem e novato ali, o rapaz continha um gênio parecido e não abaixara a cabeça ao temer por represálias, tampouco a ameaça física pura e simples.
O clima ficou pesado, mas Sinval não levou adiante, como geralmente o
fazia com os demais. Tal atitude de ambos, causou dessa forma, até uma certa estupefação generalizada entre os
veteranos.
Naquela
mesma noite, uma máquina mais nova emperrou e tratava-se justamente de uma em que o
novato era especialista, exatamente por haver se formado com louvor em sua escola técnica, por
demonstrar conheça-la, integralmente.
Somente ele poderia abri-la e consertá-la
naquele departamento inteiro. Sinval de pronto o convocou para tal tarefa, mas
ao olhar no relógio, já passara dez minutos de seu horário, e o rapazinho disse simplesmente que já esgotara o seu expediente e que o faria somente no início da manhã
seguinte, dentro de seu horário regular de trabalho.
Sinval esboçou apresentar uma outra
de suas explosões nervosas, mas em seguida ele teve uma reação inesperada, ao dar a
ordem para que outros funcionários tentassem suprir o trabalho interrompido com
as máquinas mais velhas, mesmo, e que na manhã seguinte dar-se-ia uma solução
para a máquina nova, assim que o novo funcionário chegasse.
Sinval trancou-se em seu gabinete e pela janela,
viu o rapazinho a caminhar apressado pela calçada em direção à estação do metrô.
Foi quando sorriu com certo ar de resignação. Demorou, mas enfim ele percebera que
uma personalidade parecida com a dele havia chegado para ocupar espaço na
repartição e mais que isso, vislumbrou ali, que achara o seu sucessor.
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