quarta-feira, 27 de junho de 2018

Crônicas da Autobiografia - Fila para Comprar o Sgtº Peppers e Eclipse - Por Luiz Domingues

             Eu (Luiz Domingues) em 1967, aos sete anos de idade

Aconteceu em 1967, no tempo em que eu nem sonhava em querer tocar, mas o Rock já estava a fisgar-me, sutilmente...

A minha lembrança sobre os Beatles remonta ao ano de 1963, quando o radinho que ficava em cima da geladeira da minha residência, tocava muitas de suas músicas, diariamente, enquanto a minha mãe preparava o almoço da família. E posso afirmar, tocava muito e com variedade de canções, não uma só. 
 
Continuei a ouvir nos anos seguintes com a mesma profusão, pelas ondas sonoras do rádio e isso somou-se ao bombardeio visual mediante fotos em jornais e revistas e a seguir, através dos ditos “promos” (vídeos “promocionais”, daí o prefixo “promo”, a se constituir da pré-história do vídeoclip), além do lançamento dos “Beatles Cartoons” na TV e obviamente por estar no pleno usufruto da infância naquele instante, isso só reforçou a minha simpatia pela banda, ao assistir os seus desenhos animados e obviamente, sempre a conter as suas canções.

O sensacional, "Rubber Soul", um dos dois LP's que os Beatles lançaram em 1966

No entanto, o primeiro álbum dos Beatles que eu ouvi na íntegra, assim que saiu, foi o “Rubber Soul”, em 1966 e foi mediante uma situação para lá de prosaica. Nesse ano, eu morava no bairro da Vila Pompeia, na zona oeste de São Paulo e bem próximo de uma praça chamada: “Cornélia”, com uma de suas faces para a Rua Clélia.
 
Nessa praça e naquela época, o bucolismo era enorme, ao parecer-se com uma pracinha interiorana. Aos domingos, famílias reuniam-se ali e o padre da paróquia São João Maria Vianney, mandou instalar um serviço de alto-falantes espalhados pelas árvores da praça e assim, sob um clima de quermesse, tocava-se música o dia inteiro. 
 
Predominava a MPB na maior parte do tempo, mas também bastante artistas dito jovens do movimento da “Jovem Guarda” e do Rock internacional (pasmem!), e foi por conta dessa fortuita oportunidade que eu ouvi os dois lados do LP “Rubber Soul”, muitas vezes, a denotar que o padre delegara a função da escolha e controle dessa discotecagem para algum jovem “antenado”, pois só tocavam-se coisas boas ali, a grosso modo.
Ainda a morar no mesmo endereço, em 1967, lembro-me que em uma certa manhã desse ano, o radinho estava ali em cima da geladeira, a todo vapor a embalar as tarefas domésticas de casa, quando subitamente o céu começou a escurecer. 
 
Não fora, no entanto, algum sinal de uma tempestade a aproximar-se, mas um eclipse, um fenômeno astronômico que no alto de meus quase sete anos de idade naquele dia, eu já entendia o que significava, mas nunca havia visto, ao menos nessa proporção tão impressionante, pois ainda que rápido, o céu do meio dia tornou-se igual ao da meia noite, praticamente. 
 
Pelo rádio, o locutor falava em tom solene (e naquela época, todo mundo falava com esse tom grandiloquente no rádio e na TV), ao emitir o boletim sobre o eclipse e as suas consequências como por exemplo, a rede pública de iluminação que fora ligada para dar suporte, entre outras providências. 
 
Mas o locutor também falou de um fenômeno paralelo que estava a ocorrer em diversas lojas de discos, ao menos nas mais badaladas e modernas da cidade, na ocasião. Chamara a atenção da imprensa o fato de que filas kilométricas de clientes foram formadas em tais lojas, pois tais estabelecimentos estavam com o estoque pronto para a venda, do novo álbum dos Beatles que chegara às suas prateleiras. Tratara-se de um álbum com um nome comprido e inusitado, mas nessa altura, todo mundo só esperava loucuras vindas dos Beatles, convenhamos...

E não foi apenas do mais novo álbum dos Beatles que fez com que os fãs enfrentassem uma fila na porta das lojas, em 1967, mas simplesmente, uma obra-prima, que tornou-se um marco do século XX, sem exagero algum...    

E foi assim então, em um dia atípico, com escuridão ao meio dia, que o rádio anunciou eclipse e filas formadas por ansiosos fãs dos Beatles na porta de lojas paulistanas de discos. 

Ao pensar agora como adulto, eu gostaria de haver tido alguns anos a mais em 1967 e não apenas sete anos de idade nessa ocasião, para poder ter aproveitado a década de sessenta com maior intensidade, sem dúvida, mas não posso reclamar, pois mesmo criança e sem acesso total ao que ocorria no mundo e sobretudo pela falta de um poder de assimilação mais maduro, ainda assim, sinto-me privilegiado por ter vivido aquela década e possuir tais lembranças comigo. 

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