Vivia-se uma
época difícil no país, com recessão acentuada e declarada. Dessa forma, o
efeito psicológico coletivo que sempre advém da penúria generalizada, trata sempre por manter a impressão (para cada cidadão comum e muitas vezes, de forma proposital para quem obtém algum lucro com a crise), sobre a situação real da economia,
estar muito pior do que realmente se apresenta, se fosse analisada por economistas
isentos.
E um dos
sinais psicológicos que ajuda a piorar a percepção desse caos social, é a
existência acima do normal de imóveis vazios, residenciais e comerciais, a
ostentarem placas com os dizeres: “aluga-se” e/ou “vende-se”, por semanas, meses
e até anos a fio.
E não para por aí, pois os sinais análogos e inerentes tratam
de piorar ainda mais os índices. A sujeira acumulada nas casas inabitadas, atrai
a bandidagem e a mendicância, as pichações multiplicam-se e tudo isso somado, gera
também o desestímulo para possíveis interessados em alugar ou comprar imóveis, a postergar o clima desolador.
Mas há o
lado positivo mesmo nesse cenário caótico, por incrível que pareça. Pois é
nessa hora sob carência, sufoco & escassez de recursos, que o fator da esperança,
move as pessoas de encontro ao sentimento de reação e quando reagem,
efetivamente movimentam a economia, primeiro em uma escala microscópica, mas que
tem o poder de uma pequenina pedrinha que bate no rio e inicia uma
movimentação, que demora, mas pode representar uma virada macro, no futuro.
Bem,
economia e motivação humana a parte, o fato foi que nesse cenário todo que
descrevi, a crise gerara o aumento de placas a anunciarem a disponibilidade de
imóveis em geral, da parte dos corretores.
E naquela perspectiva única de se poder sonhar, que
seria a única medida que as pessoas poderiam contar naquele instante mais agudo da
situação, um casal a aparentar estar na meia-idade, passou a ocupar o seu tempo
a visitar imóveis do bairro onde moravam.
Em cada quarteirão havia pelo menos
duas ofertas com casas nessas condições e em muitos deles, havia um funcionário de
imobiliária disponível para atender as visitas de clientes, possivelmente
interessados. Empolgados com essa oferta, marido e mulher passaram a fazer
dessas visitas, uma ocupação diária, como se estivessem a frequentar museus.
Todavia,
mais que um lazer, as visitas representavam sonhos. O bem estar que sentiam ao
caminharem pelos cômodos das residências vazias e bonitas, foi imenso e eles não
furtavam-se a comentarem em voz alta os seus planos para decorá-la, ao projetarem-se
como futuros proprietários.
Geralmente os funcionários esboçavam estreitar a
relação, quando sentiam um real interesse dessas pessoas e dessa forma, insistiam em
pedir-lhes os dados pessoais, a convidá-las a preencherem ficha cadastral etc. e tal... mas o fato,
foi que eles só tinham o sonho e a vontade para adquirirem tais imóveis, pois em realidade,
não possuíam nem um centavo sequer para pleitear nada, concretamente a falar.
Mesmo assim,
eles continuaram o seu périplo diário, a seguir o mesmo padrão em cada imóvel que
visitavam. Infelizmente, a atitude sintomática da parte deles gerou uma fama indevida
entre os corretores de imóveis e talvez desconfiados, a deduzirem que as intenções
do casal, seriam malévolas, estabeleceram um pacto entre imobiliárias, a proibir-lhes a
visitação, veladamente.
A ordem que os funcionários receberam foi para exigirem
que tais pessoas visadas registrassem-se mediante uma ficha cadastral bem mais detalhada e invasiva, com certificação documental em anexo, para
poderem adentrar tais imóveis. Não tratou-se de uma medida ilegal, mas certamente antipática, ao
ser adotada doravante. Assim, ao sentirem-se oprimidos, eles encerraram as suas
costumeiras visitações.
Portanto, se nem sonhar foi mais possível, a
estagnação foi decretada e como consequência direta, as placas continuaram a anunciar imóveis
vazios por muito mais tempo, sob um efeito sintomático.
Nenhum comentário:
Postar um comentário