quinta-feira, 28 de março de 2019

Crônicas da Autobiografia - A Noite em que Eu Tocava um Blues, Quando Vi o Meu Carro Quase Ser Furtado - Por Luiz Domingues

      Aconteceu no tempo da Magnólia Blues Band, em 2014 

As atividades da Magnólia Blues Band foram intensas enquanto tal banda existiu, mas houve uma curiosidade sui generis ao seu respeito. Por ter sido criada para ser uma banda fixa da casa de espetáculos (Magnólia Villa Bar), a banda nunca apresentou-se em outro espaço. Todos os cento e poucos shows que a banda cumpriu em sua trajetória, foram realizados no palco dessa citada casa noturna, localizada no bairro da Lapa, na zona oeste de São Paulo.

A casa ficava localizada em um ponto nobre do bairro, exatamente na esquina das Ruas Aurélia e Marco Aurélio e para quem conhece bem aquele quadrante do simpático bairro da Lapa, sabe bem que haviam poucas casas noturnas e mesmo comerciais de atuação diurna ali, pois trata-se de uma área completamente residencial. 
 
Então, era costumeiro tocarmos a olharmos o movimento da rua e se dentro do estabelecimento, o clima era quente com a presença de um animado público e com o Blues e o Rock a contaminar o ambiente com energia, nas ruas, o panorama era semelhante a um deserto, com os moradores recolhidos em suas residências. 
 
Nesse aspecto, era comum vermos senhores idosos a saírem esporadicamente de suas residências, para na calçada depositarem o lixo doméstico, trajados com pijamas, o que chegava a ser engraçado.
Mas o movimento do bar atraia muitas pessoas à cata de estacionamento nas redondezas e assim, as ruas ficavam desertas em termos de pessoas, mas lotadas com carros estacionados naquele entorno. 
 
Infelizmente, tal profusão de automóveis chamara a atenção de malfeitores e houve relatos de ações de furtos nos carros, com o roubo de objetos do seu interior e algumas vezes, até de pneus.
Pois foi em uma dessas noites de quarta em que apresentávamo-nos que eu presenciei uma cena bizarra. Estava a tocar e olhar vez por outra o movimento da rua, pelas muitas janelas que a casa possuía, quando avistei quatro jovens aparentemente embriagados a caminharem pelo meio da rua. 
 
Logo que os avistei, não suspeitei de nada, pois os três rapazes e um moça, componentes desse grupinho de transeuntes, não tiveram nenhuma atitude suspeita em princípio, a não ser o sinal de embriaguez em comum para todos. 
 
Talvez fossem jovens universitários a voltarem para a casa, pois apresentavam boa aparência, no uso de boas vestimentas em ordem, e teoricamente não havia nada que chamasse a atenção em demasia em seu comportamento. 
 
Foi quando eu percebi que eles pararam bem perto de meu carro. No início, não preocupei-me exatamente, mas logo vi que passaram a olhar para todos os lados e a confabularem entre si. Tal atitude pareceu-me suspeita e tudo confirmou-se negativamente, quando vi que um dos rapazes forçou a maçaneta da porta do motorista, enquanto um outro correu para forçar as maçanetas do lado oposto. A moça parecia vigiar, ao olhar freneticamente para todos os lados e o outro rapaz foi tentar arrombar o porta-malas.

Foi ainda mais surreal tal cena, pois a banda tocava a todo vapor e eu não parei e abandonei o palco para esboçar alguma reação, pois naquela fração de segundos, percebi que o porteiro da casa já havia flagrado a situação e sinalizara ao segurança do posto de gasolina do outro lado da calçada, que não funcionava no período noturno, mas esse funcionário costumava ficar ali atento, durante a noite inteira. 

Eles mantinham um combinado entre si, para vigiarem mutuamente a esquina e assim, rapidamente ambos marcaram presença e o quarteto do mal saiu a correr. 

Provavelmente não eram bandidos propriamente ditos e nem armados deviam estar. Talvez fossem apenas usuários de drogas e vislumbraram um furto tranquilo para obter algum objeto de valor, tanto que não possuíam ferramentas para arrombar o carro e apenas testaram as portas no intuito de contarem com a sorte para descobrir alguma porta destrancada. 

Talvez até quebrassem um vidro com um tijolo, se não houvessem sido surpreendidos, o que prova que tratavam-se mesmo de ladrões de ocasião, pois bastaria andar mais um quarteirão para que achassem muitos outros carros estacionados e aí estariam completamente fora do campo de visão de quem estava dentro da casa noturna em que tocávamos. 

Enfim, o importante foi que o meu carro não foi molestado naquela noite e eu pude tocar os meus Rocks e Blues e no caso dos Blues, apenas a ficar nos lamentos poéticos que tal escola musical traz em sua raiz primordial e não a lamentar um prejuízo desagradável.

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