terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Autobiografia na Música - Pitbulls on Crack - Capítulo 51 - Por Luiz Domingues

O próximo passo após o show do Olympia, foi bem menos glamoroso. Ainda a aproveitar a exposição na mídia de uma forma contundente, mediante shows grandes; rádio & TV a executar-nos diariamente, o próximo compromisso foi uma apresentação modesta no Bar "Pill 100 Bar". Lá, dividimos a noite com os donos do estabelecimento, a banda, "The Pills", gerida pelo empresário, Jefferson, e uma outra, chamada : "Rose Avalanche". O Rose Avalanche era bem influenciado pelo Guns'n Roses, é claro (por conta do seu nome, certamente), e o The Pills fazia um Pop Rock, a apresentar elementos do indie Rock britânico então moderno, noventista. Por ser localizado próximo à represa de Guarapiranga, um endereço longínquo, no extremo da zona sul de São Paulo, tivemos público fraco com apenas cinquenta pessoas, e contingente esse formado pelos amigos dos membros do The Pills, e habitues da casa. Isso ocorreu no dia 19 de agosto de 1994.

No dia 30 de setembro, o empresário, Jefferson havia marcado uma apresentação nossa em um salão da cidade de Osasco, localizada na Grande São Paulo. Quando perguntei a um aluno meu que residia naquela cidade, se ele conhecia aquela casa em específico, ele fez uma expressão facial de espanto, e disse-me achar impossível acontecer shows de Rock naquele lugar ! Segundo ele, tratava-se de um obscuro salão em um bairro de periferia, onde só apresentavam-se artistas do underground da música brega. Ele achou inacreditável acontecer um show de Rock naquela espelunca. Mas foi verdade... e no dia marcado, ao chegarmos no local, ficamos desolados ao verificarmos as suas instalações precárias. No entanto, como o Pitbulls on Crack era uma banda onde todos brincavam o tempo todo, tornou-se a piada pronta para o resto da noite, certamente. Iríamos dividir a noite com a banda : "Pandhora", do meu aluno, Marcos Martines, que também atuava como roadie do Pitbulls on Crack, vez por outra. O equipamento era tão pavoroso, tão precário, que na impossibilidade em podermos realizar um som minimamente decente, resolvemos cancelar a nossa participação. 

O empresário negociou e os proprietários da pocilga alegaram que todos os artistas que ali apresentavam-se, não costumavam reclamar daquelas condições apresentadas etc e tal. Claro, eu posso imaginar o naipe dos artistas que ali apareciam, normalmente...

Então tocamos, para um reduzido e atônito público com cerca de trinta pessoas, todas habitues, com exceção de meu aluno, Edil Postól e a sua esposa, Marilu, que gentilmente foram prestigiar-nos, naquele lugar insalubre. Voltaríamos contudo àquele estabelecimento medonho, pois o Jefferson fechou uma outra data, e desta vez a garantir-nos que o dono da casa melhoraria o equipamento. Ora, nem se colocasse um super P.A. e com a iluminação do Pink Floyd, adiantaria alguma coisa. Mas como estávamos a dar votos de confiança a ele, julgamos que o sacrifício valeria a pena, para assim visarmos dias melhores em termos de shows. Ao pensar com o distanciamento histórico, hoje eu penso que não havia nenhum cabimento em continuarmos com um empresário que detinha tais contatos completamente fora da nossa realidade. Estávamos com uma música a explodir na principal rádio Rock da cidade; dois clips na MTV; shows realizados no Ginásio do Ibirapuera & Olympia, portanto, que sentido fazia ir tocar no "Evidências Dancing" ?
Depois dessa experiência bizarra, o próximo show não teve nada a ver com o empresário, Jefferson. Foi um convite do locutor da 89 FM, Tatola, para que participássemos do show de lançamento do novo CD do "Não Religião", a sua banda.

Ocorreu no Aeroanta, dia 7 de outubro de 1994, com a presença do Pitbulls on Crack e do Neanderthal, entre as bandas convidadas, com o encerramento logicamente feito pelo Não Religião. Época ainda marcada por bom movimento para casas que só abrigavam bandas autorais, pois trezentas e cinquenta pessoas entraram no recinto, catraca adentro. Contudo, a seguir tivemos que cumprir então o show extra que o empresário fechou no horrendo, "Evidências Dancing". Para tentar melhorar a situação, o empresário convidou o "Não Religião", que lançava novo CD na ocasião e claro, por deter mais "status" que nós, tal banda ganhou destaque na filipeta.

Com o perdão do trocadilho infame, era "evidente" que seria uma outra grande noite perdida, naquela espelunca desoladora...
E foi mesmo, "evidentemente", mas aconteceu um fato insólito que salvou a noite de tanto que divertiu-nos. Quando chegamos ao local (além de dividirmos a noite com o "Não Religião", teríamos novamente a presença do "Phandora"), havia na plateia, um homem negro a usar um terno todo branco, e com um exemplar da Bíblia debaixo do braço.

Pensamos ser um fundamentalista com o intuito em fazer uma pregação para as pessoas que tencionavam assistir o show, ou coisa do gênero. O rapaz entrou e procurou-nos no camarim. Ao dizer-se adepto da religião Mórmon, não parava de falar que vivera em Salt Lake City / Utah, e que lá, apesar de ser Mórmon, apaixonara-se pelo Punk-Rock. Estava portanto ali no "Evidências", para ver o Pitbulls on Crack, e o "Não Religião", e em nosso caso, motivado pelo fato do Chris Skepis ser ex-membro do grupo Punk britânico, Cock Sparrer. E pasmem, quando o som mecânico da casa começou a tocar, esse rapaz correu para a pista, e passou a dançar violentamente, para chamar a atenção das pessoas que estavam a aguardar pelos shows. Foi bizarro vê-lo a dançar como punk, com aquele visual que ele tinha a denotar a sua religiosidade, munido pela Bíblia na mão etc. E como se não bastasse tudo isso, ainda houve o mais insólito : pois ao afirmar ser homossexual, disse estar interessado em nosso baterista ! Trancamo-nos no camarim, depois de saber disso, pois o rapaz insistia em voltar para lá, e aí seria uma confusão vermos o religioso / punk  /gay, por ali a importunar-nos mais, e pior ainda seria para o nosso baterista, eu posso imaginar...
Isso ocorreu no dia 14 de outubro de 1994, e como os membros do Pitbulls eram humoristas por natureza, tornou-se assunto para uma semana aquela figura insólita a perturbar-nos. E quanto ao show, foi obviamente medonho com aquele equipamento disponibilizado. É claro que o dono do infame salão não colocou no palco um equipamento melhor, conforme prometera anteriormente. Dessa forma, fizemos um show de choque, e partimos dali, o mais rápido possível...



Continua...

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