sábado, 16 de março de 2024

Autobiografia na música - Boca do Céu - Capítulo 124 - Por Luiz Domingues

Com as bênçãos do Uriah Heep sob a sua formação mais famosa retratada na parede, eis o Boca do Céu no camarim do Instituto Cultural Bolívia Rock, em 17 de fevereiro de 2024. Click, acervo e cortesia: Moacir Barbosa de Lima ("Moah")

Eis que chegara o grande dia. Sentimento vivo entre os quatro membros originais do Boca do Céu presentes na formação pós-2020 e devidamente reforçado pelo Carlinhos Machado, que entrara na banda nesta fase moderna do século XXI, porém, sendo contemporâneo nosso dos anos setenta, entendia perfeitamente essa mesma sensação, ocorreu que nesse dia, 17 de fevereiro de 2024, nós finalmente voltamos a colocar essa banda sob um palco, algo que não fazíamos desde o longínquo ano de 1978.

Quando nos reencontramos para uma mera reunião de confraternização em fevereiro de 2020, não passara na imaginação de nenhum de nós envolvidos nesse projeto de resgate, que uma sobrevida poder-se-ia precipitar doravante e foi exatamente o que ocorreu, com pandemia mundial no meio do caminho, problemas pessoais de cada um mediante doenças pontuais e questões familiares a se resolver, muitos ensaios em meio aos protocolos sanitários exigidos e sobretudo, a exercermos um esforço de memória hercúleo para relembrar músicas cuja lembrança só tínhamos na maioria dos casos, de forma precariamente fragmentada.

Conseguimos enfim colocar a banda em um estúdio profissional, para gravar uma das nossas canções com o brilhantismo musical que era inatingível para nós nos anos setenta, gerar repercussão midiática muito além do esperado e agora, neste momento de 2024, colocar a banda no palco para tocar em uma casa noturna com ambientação de Rock e a cumprir tal tarefa com propriedade. 

Eu (Luiz Domingues), em meio a um ensaio do Boca do Céu no estúdio Lumen de São Paulo em 4 de fevereiro de 2024. Click, acervo e cortesia: Moacir Barbosa de Lima ("Moah")

A pensar exclusivamente no meu caso particular, eu já houvera atingido um pico de carreira muito além do que sonhara, no sentido de que atuara como membro de muitas bandas, a gravar mais de duas dezenas de discos ao longo de quase quarenta e oito anos de carreira. Nesta altura, estava a exibir um portfólio gigantesco, portanto, chegara nessa idade cronológica de sessenta e três anos de idade (a enxergar a marca de sessenta e quatro para ser cumprida em breve), plenamente satisfeito. 

Durante a minha trajetória, pude ajudar a criar uma banda que cresceu e ficou lendária, entrei para a formação de duas bandas que já eram lendárias e pude construir a minha participação com presença marcante na história delas. Tive também banda que teve apelo midiático, outras duas que alcançaram um enorme respeito artístico. Exerci a psicodelia sessentista mais louca a bordo da banda de um artista que a enxergava como eu, e pude construir uma banda inteiramente da estaca zero a pensar em todos os detalhes para exercer o que eu sempre sonhei fazer. Além disso, tive duas bandas "cover" que foram além da mera execução mecânica a conter muitos atributos irrefutáveis, fora que participara de dezenas de trabalhos avulsos com outros artistas.

Portanto, essa boa surpresa de poder prover sobrevida à minha primeira banda, que tivera uma trajetória tão singela e importante como fator impulsionador da minha carreira, mas que poucos resultados palpáveis amealhara durante a sua jornada no decorrer da década de setenta, eu pude encarar como um presente que os Deuses do Rock me ofertaram para que eu pudesse encerrar a carreira e a vida, com direito a retornar ao ponto inicial de tudo nesse aspecto da minha trajetória artística e desta feita, para deixar um legado com este trabalho em específico.

Diferente do meu primeiro show de Rock da vida, cumprido em fevereiro de 1977, com esse mesmo "Boca do Céu", eu acordei no dia 17 de fevereiro de 2024, sem aquela apreensão, o chamado "frio na barriga", que artistas principiantes sentem e que alguns nem conseguem superar, mesmo com a experiência adquirida. 

No entanto, toda essa reflexão que eu expus nos parágrafos acima, passou pela minha mente nesse instante e eu me senti muito feliz por esse dia ter chegado. 

Faríamos um show de abertura da minha própria banda, Os Kurandeiros e seria curto, no padrão de um show de choque, mas embora breve na duração e na condição de "open act" ou show de abertura (na terminologia em português), de uma outra banda, que significado especial teria para todos nós!

Continua...

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