sábado, 1 de dezembro de 2012

Autobiografia na Música - Boca do Céu - Capítulo 31 - Por Luiz Domingues


E chegou a grande hora...
Sem impedimentos, tocamos as nossas duas músicas separadamente, a intercalar com os outros concorrentes. Estávamos muito mais seguros agora, e eufóricos. Portanto, a performance da banda nas duas músicas, foi muito superior. "Serena" não atingiu nenhuma classificação, mas "Revirada" ficou em segundo lugar no resultado final do Festival. Sinceramente, a despeito de nossa deficiência técnica, creio que merecíamos ter ganhado o festival, pois fomos os mais aplaudidos. A música vencedora era pobre. Foi defendida por três garotas a cantá-la em uníssono, acompanhadas de um violonista. Era uma canção fraca, brega e romântica, cujo refrão dizia: "Por quê te amo, e não quero te esquecer..."



Mas era compreensível que vencesse, pois o júri despreparado, formado por professores de matérias sem relação com arte e música em específico, não daria a vitória à uma banda de cabeludos, a tocar Rock, e com uma letra a contestar a ditadura...

Para compensar, convidaram-nos a fazer um show exclusivo,  dois sábados adiante, quando os cinco primeiros colocados tocariam novamente. Isso para nós, foi mais importante do que ganhar o festival. Além de tocarmos "Revirada" novamente, poderíamos fazer um show com trinta minutos. Ficamos eufóricos ! Foi uma grande vitória para uma banda absolutamente iniciante e com quase todos os componentes em fase de aprendizagem musical, ainda muito preliminar. Como prêmio, ganhamos um troféu, que guardo até hoje na minha memorabilia. Nessa final do “Femoc”, o público foi muito bom. Aproximadamente quinhentas pessoas compareceram ao ginásio de esportes do Colégio Estadual de Segundo Grau Oswaldo Catalano. E no sábado, 27 de agosto de 1977, fizemos o show da festa de entrega dos troféus, para um público formado por aproximadamente duzentas pessoas. Antes de tocarmos, houve um minuto de silêncio em condolência pela morte de Elvis Presley...



Tocamos as cançõs : "Mina de Escola"; "Tudo Band"; "O Mundo de Hoje"; "Ah se você soubesse"...; "Consenso Geral", e uma versão livre (e pobre...) de "Meus Caros Amigos", do Chico Buarque. E claro, "Revirada", a celebrar o nosso segundo lugar. Foi uma vitória e tanto para quem engatinhava na música. Recebemos vários convites para shows de Rock, que nunca realizaram-se, mas adoramos chamar a atenção dessa forma ! Em relação ao fato de não termos vencido o festival, mas chamado tanto a atenção, mesmo dessa forma, sim, foi a tal questão da proporcionalidade.

Muitas vezes, aquele elogio simplório da professorinha primária pode ter mais impacto na vida de uma pessoa, que uma grande realização obtida na vida adulta. Essa comparação cabe aqui, pois a alegria que sentimos por termos sido aplaudidos, termos ganhado o segundo lugar, e convidados a fazer o show de encerramento, duas semanas depois, foi enorme, em detrimento de coisas realmente maiores que obtive já como adulto e músico profissional.



Foi normal para os padrões de um festival amador, e mal organizado, que privilegiassem uma música "careta" para vencer o festival. Que perdoem-me aquelas garotas, que inclusive eu nem conhecia, e não eram da minha classe na escola, mas a música, e a performance delas, foram insípidas. Nem acredito realmente que a questão da ditadura reinante à época fosse o motivo dessa decisão para não conceder-nos o primeiro lugar. A questão ali fora o despreparo do corpo de jurados, composto por professores do colégio. O único professor mais progressista da escola, era o professor de português, "seu" Murilo, e ele não esteve nesse júri. Dos outros, não poderíamos esperar outra atitude. Surgiu-nos dois ou três convites para tocarmos, posteriormente. Um deles veio através do pessoal da banda de bailes, "A Gota", que alugou o equipamento para o festival. Mas tudo foi apenas o discurso de ocasião, no calor da emoção. Depois, esses contatos murcharam e nada aconteceu. Para nossa sorte, independente desses convites, tínhamos uma esperança boa para o mês de outubro. E logo mais contarei em detalhes, esse que seria (e o foi, na verdade), o ápice da carreira do Boca do Céu, sem dúvida. Não recordo-me de "briga" por causa do troféu. Lembro-me do Laert ter ficado com ele por uns tempos, e depois ele ter ficado definitivamente comigo. Está na minha memorabilia. Acredito até que os jurados deram-nos o segundo lugar para não contrariar o público, que aplaudiu-nos bastante, apesar das inevitáveis torcidas para as outras concorrentes. Sem querer ser chato, mas sendo realista, a música que venceu o festival, era fraca. Pobre na sua estrutura harmônica; cafona; com uma letra romântica, brega, e com interpretação muito sonsa. Nós não éramos bons como gostaríamos de ser, mas pelo menos tínhamos muita força de vontade, ao contrário daquelas meninas caretas, a cantar em uníssono, como se estivessem na sala de estar de sua casa, na noite de natal, com o objetivo de encantar os seus avós... e tem mais : não tinha comparação a letra do Laert, com a música delas. Seria como comparar Gilberto Gil em relação a um compositor popularesco qualquer, daqueles que faziam sucesso no programa de TV : “Clube do Bolinha”. E sobre a questão do troféu, este poderia ficar com o Laert ou Wilton. Seria justo, sendo eles os compositores da canção premiada, "Revirada".



O troféu que ganhamos, graças ao prêmio como agraciado com  o segundo lugar de "Revirada", no Festival I Femoc de 1977, acima em duas fotos



Continua...

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