sábado, 5 de abril de 2014

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 111 - Por Luiz Domingues


Antes de eu seguir a falar sobre os preparativos do show de lançamento do nosso compacto, no Teatro Lira Paulistana, tenho uma história incrível para contar, e esta contém muitos detalhes. Com a projeção que alcançáramos através do programa : "A Fábrica do Som", da TV Cultura, criamos um divisor de águas.

Da primeira aparição em diante, sob um movimento de crescimento acentuado, solidificamos a nossa posição como uma banda emergente e postulante ao mainstream, com todos os elementos inerentes a quem alcança esse status. E dessa forma, foi natural que oportunidades acontecessem. Pois eis que uma pessoa ao mostrar-se muito solícita, abordou-nos em meados de junho para dar-nos uma ótima nova : queria saber se aceitaríamos realizar um show em uma enorme danceteria recém inaugurada em São Paulo, envolta em uma enorme badalação.

Claro que aceitamos e com grande euforia, evidentemente, pois foram muitos fatores positivos em jogo, tais como :

1) A oportunidade para tocar em um lugar badalado; 

2) Com um público enorme, pois o local era gigantesco; 

3) Com equipamento de som e luz de peso, e qualidade; 

4) A certeza de haver cobertura na mídia mainstream impressa; 

5) E o melhor de todos os benefícios : um cachet robusto... muito acima dos nossos padrões... 

Enfim, foram muitos elementos sensacionais e que justificaram a nossa euforia. Aceitamos, é claro, e essa moça tomou a dianteira das negociações com a casa, para fechar o show. Quando ela revelou-nos o valor do cachet, quase capotamos... foi muito maior do que havíamos imaginado, pelo status presumível da casa. Eu não saberia mensurar hoje em dia, após tantas mudanças monetárias no Brasil, mas digamos que estávamos acostumados a ganhar no máximo, quinhentos mil cruzeiros, quando o cachet era considerado excelente, e ela propôs-nos o valor de quatro milhões...  ficamos eufóricos e já a estabelecer planos de divisão, investimentos na banda etc. Como comissão, ela cobrou-nos 20% sobre o valor, o que foi justo, naturalmente, e batia com a praxe do mundo empresarial. Outro fator benéfico, foi que o show foi marcado para uma data onde eu já estaria desligado do Língua de Trapo, portanto, foi o primeiro show d'A Chave do Sol, que eu  marquei nesse período pós-Língua, onde não tive que constranger-me com as duas bandas, e com o empresário do Língua, Jerome Vonk. A despeito de estarmos focados com os preparativos do show de lançamento do compacto, sabíamos que esse show da danceteria também mereceria uma atenção especial, por tudo o que mencionei.
Então, preparamos um repertório mesclado, porque sabíamos que lidaríamos com um público não acostumado às nossas elucubrações instrumentais, setentismos e que tais.

Enfrentaríamos uma juventude burguesa, seguidora do BR-Rock oitentista, não por gostar realmente, e ser aficionada de tal estética, mas simplesmente por ser a crista da onda, pelo óbvio motivo em ser era massacrada nas emissoras de rádios e TV, daquele instante de 1984. Mas, claro, não apelaríamos ao ponto de executar covers do Culture Club ou Duran Duran. A nossa aposta foi em Rock cinquentista, via "Blue Suede Shoes" e "Johnny B.Goode", além de Jimi Hendrix, onde o Rubens sempre poderia chamar a atenção com os seus malabarismos com a guitarra.

Da nossa porção instrumental, só tocaríamos a canção : "18 horas" por ser música do disco que estávamos a lançar, e mesmo assim, se eu pudesse voltar ao passado, a cortaria sumariamente do repertório. Realmente, tocar uma música instrumental enorme, com solos longos; convenções complexas inspiradas em Jazz-Rock, em um embalo burguês daqueles, foi uma insanidade. Claro que tocamos "Luz", também, por ser a música mais palatável do compacto, e possuir uma inspiração cinquentista.

Tirante essa burilada no repertório, pensamos em caprichar no visual e lembro-me que o Rubens chegou a alugar uma vestimenta, especialmente para tal ocasião. Tratou-se de um casaco ao estilo medieval, que o deixou muito parecido com um príncipe de histórias infantis dos irmãos Grimm, ou Hans Christian Andersen... mas não estou a ironizar. Ficou bem vistoso, e lembrou Rockers sessentistas da Swinging London. O Brian Jones certamente amaria essa peça.


Continua...  
     

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