sábado, 27 de junho de 2015

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 368 - Por Luiz Domingues


Chegamos ao primeiro dia da temporada, bastante confiantes de que ela seria boa, pois o local era nobre, com a sua localização privilegiada na cidade de São Paulo, acoplada a uma estação de Metrô, e muito perto de ruas e avenidas que dão acesso a várias vias que levam aos quatro cantos da cidade, caso da Avenida 23 de maio, por exemplo.

Sempre foi um prazer tocar ali, pela qualidade das suas instalações, equipamento de bom nível disponibilizado e a badalação que detinha à época, como um dos mais fortes palcos da cidade, com apresentações de artistas consagrados de diversas vertentes da música.
O jornalista que redigiu essa mini matéria, só copiou o release que enviamos, mas tratou por criar um primeiro parágrafo de sua autoria, e assim, não resistiu à tentação de alfinetar-nos, por destilar o seu veneno oitentista... pois que o leitor tire a sua conclusão! 

Fora isso, o prazer de estar em cartaz por cinco dias consecutivos, foi total. Na minha concepção, esse sempre foi o ideal como músico e artista, ou seja, estar em cartaz em um teatro e no curso de uma temporada. Se dependesse de minha exclusiva vontade, eu faria só isso, eternamente... sete shows por semana: de quarta a domingo às 21 horas + "sessão maldita" no sábado, à meia-noite + matinê no domingo, às 17 Horas.

 

O soundcheck foi tranquilo, sem atropelos. Trabalhamos com os técnicos da casa e não tivemos problemas. No caso da iluminação, para não deixar passar batido, acho que o iluminador foi um pouco preguiçoso, mas isso é quase uma constante quando se trata de iluminadores que não conhecem o trabalho do artista e portanto, estão a trabalhar sem o apoio de um bom mapa de luz, bem definido. O ideal é sempre contar com o iluminador próprio do grupo, que sabe valorizar ao máximo o trabalho de uma banda, a estabelecer as devidas nuances que casam-se exatamente com os momentos emocionantes do show, para traduzir, portanto, em cores, as notas musicais que tocamos.

E assim, foram cinco dias muito bons que tivemos ali no Centro Cultural São Paulo.


Pudemos nos dar ao luxo de promover pequenas mudanças no set list de cada apresentação, e dessa forma, quem pagou para ver um show apenas, teve um espetáculo único, diferente dos outros. E quem viu mais de um, foi presenteado com músicas diferentes em cada apresentação, naturalmente.

Uma lembrança engraçada, foi quando Sonia e Toninho nos disseram que o comediante, Agildo Ribeiro estava presente na plateia, durante o show da sexta-feira. Ao saber dessa informação, eu mesmo fiz uma saudação ao ator/comediante ao microfone, mas na empolgação, culminei em exagerar e assim, o meu discurso foi bem além da conta... 


Eu exaltei as suas qualidades como comediante e o exagero se deu quando mencionei que o fato de que a Rede Globo supostamente o injustiçara, e por ser assim, hoje me arrependo por ter exagerado na dose do elogio, e principalmente ao entrar nesse mérito, que certamente não convinha para aquele contexto.

No camarim, a Sonia agradeceu-me pela longa citação ao Agildo, mas contou-me que bem na hora em que eu falei ao microfone, ele já havia se retirado do ambiente... 


Certamente que o famoso ator não aguentara assistir um show de Rock e saiu para preservar os seus ouvidos, talvez até tenha ido procurar o seu amigo, Topo Gigio, para lhe dizer boa noite...

Portanto, foi uma gafe dupla que eu cometi, e assim, tive o meu momento prolixo e inconveniente ao microfone.

Fora dessa ocorrência, não me recordo de nenhum acontecimento marcante para ser relatado em específico.

A minha lembrança dos shows, é que todos foram muito bons, com o público a responder animadamente à nossa performance e também em relação às solicitações de interatividade propostas pelo Beto, principalmente.

Por falar em Beto, ele tocou guitarra nos shows, claro, foi uma tendência que solidificara-se doravante.

A se destacar, o visual do Rubens para esses cinco shows, pois por conta de uma ação perpetrada pela sua namorada na ocasião, chamada: Claudia, que deu-lhe uma incrementada em seu visual, ao agir como uma "personal styler", e dessa forma, o adequou ao visual do Hard-Rock oitentista e norte-americano, sobretudo. Particularmente, eu achei exagerado e de gosto duvidoso, mas admito que a tentativa foi válida, e aos olhos dos fãs, agradou, pois a imensa maioria que nos acompanhava na ocasião, eram adeptos dessa estética em voga, no mundo do Rock pesado oitentista. Portanto, se analisado por tal prisma mais realista, creio que a despeito da minha opinião pessoal adversa, foi uma decisão acertada pela adequação conveniente à estética em voga.
Devo destacar que nessa época, 1987, o Centro Cultural São Paulo mantinha elevado o palco, mediante uma estrutura de ferro a lhe dar o sustentáculo. Logo foi descartada essa tendência, no entanto, com o palco a voltar ao piso normal. As fotos acima, demonstram como ficou tal elevação. 

De fato, isso nos deixara um pouco mais próximos de quem assistia através do mezanino, mas prejudicava bastante a visão de quem pagava para assistir no pavimento de baixo, onde entre outros fatores, a acústica é melhor para se aproveitar um show. 
 



O público foi bom, mas poderia ter sido melhor, eu acredito. Dois fatores devem ter colaborado para tal resultado mais tímido aos nossos padrões de então:
1) A divulgação feita às pressas e;
2) A diluição em muitos dias, ao provocar que o público perdesse o foco, ao se dar ao luxo de escolher as suas próprias conveniências, ao pensar individualmente, é claro. Eis os resultados dessa temporada :

Dia 11 de fevereiro de 1987 - Quarta-Feira - cento e cinquenta pessoas
Dia 12 de fevereiro de 1987 - Quinta-Feira - cento e trinta e cinco pessoas
Dia 13 de fevereiro de 1987 - Sexta-Feira - duzentas e oitenta pessoas
Dia 14 de fevereiro de 1987 - Sábado - quatrocentas e vinte pessoas
Dia 15 de fevereiro de 1987 - Domingo - quinhentas pessoas

Portanto, quase mil e quinhentas pessoas presentes, na soma dos cinco shows, foi significativo, sem dúvida.
Acima, um dos pontos de explosão, prontos para serem usados como pirotecnia do show. Como dá para notar na foto, Zé Luiz o sofisticara...

E tais números se refletiram na bilheteria, de forma contundente, ao fazer com que lamentássemos muito o contrato que tínhamos com o Studio V, por tudo o que já comentei amplamente em capítulos anteriores, e que agora só me resta relembrar: 40 % desse montante, foi para a mão desses empresários... definitivamente, não queríamos mais essa sangria para a nossa vida, e tal situação precisava ser solucionada e rapidamente.

Lembro-me que a bilheteria fora tão robusta, que nós pagamos todas as despesas (e nesse show arriscáramos bastante com ações de divulgação caras), demos os 40% para o escritório, pagamos os roadies e o que sobrou de cachê para nós foi um montante bastante significativo. Nunca me esqueço, por conta da hiperinflação no Brasil naquele período, entre 1986 e 1991, tudo o que eu ganhava, eu costumava trocar em dólares, como uma única forma de preservar a liquidez monetária, razoavelmente. 

Na segunda-feira após o encerramento dessa temporada, fui à casa de câmbio que eu frequentava na época e o meu cachê tornou-se algo um pouco além dos U$ 400, ou seja, se não tivéssemos mais a âncora desses empresários a nos segurar, teríamos ganho quase o dobro, com o mesmo desempenho, e nada a depender da força de trabalho deles.
Todas a fotos que eu postei neste capítulo, são clicks de Maurício Abões, com exceção das duas acima, de Rhadas Camporato. 

Portanto, romper foi preciso, no entanto, não foi tão fácil nos livrar-nos desse escritório, ao demandar um pouco mais de paciência e tempo. E assim foi a nossa mini temporada no Centro Cultural São Paulo, em fevereiro de 1987. 
 
Continua... 

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