sábado, 20 de junho de 2015

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 340 - Por Luiz Domingues


Aceito o convite, sabíamos que seria uma oportunidade de mega exposição televisiva, portanto muito bom para nós, mas não houve nenhuma euforia de nossa parte por conta disso, mesmo por que, teríamos a inglória missão de ser "abertura" de uma atração internacional de péssima qualidade artística, e pior ainda, suprema humilhação, nos rebaixaríamos ao seu patamar, pois nos apresentaríamos a dublar!

Para aqueles garotos hispânicos, criados em um laboratório de marketing, era a absoluta normalidade se apresentar nessas condições vergonhosas, mas para nós, haveria de ser muito constrangedor não tocar e cantar ao vivo. Enfim, sem poder contestar, a solução foi amargar essa vergonhosa forma de se apresentar ao vivo, e pensar na exposição a um público televisivo inteiramente diferente do que estávamos acostumados.

Quando chego o dia para de participarmos da gravação do programa, nos dirigimos ao Palácio das Convenções do Anhembi, e logo ao avistarmos, vimos uma multidão aglomerada nas suas cercanias. Foi uma fila gigantesca e exótica, no sentido de que era exclusivamente feminina. Tratou-se de adolescentes a aparentar algo entre doze e vinte anos de idade, na média, e em estado de euforia, a dançar e cantar, portar cartazes, com posters de seus ídolos pré-fabricados etc.

Estacionamos e fizemos um pequeno percurso a pé, rumo à entrada de serviço, por onde artistas e técnicos entrariam, e constatamos que nos bastidores havia também uma multidão (muito provavelmente formada por meninas que não tinham ingressos para assistir a "apresentação", e sua intenção ali foi ao menos ver os seus ídolos a se aproximar do local), e a polícia fazia um cordão de isolamento, mediante grades de proteção.


Havia centenas de garotas presentes, e obviamente que a motivação de 100 % daquelas meninas não seriam as atrações secundárias, as bandas de Rock nacionais convidadas a participar, pois o foco foi naturalmente, os chicos saltitantes.

Quando nos aproximamos, claro que as ensandecidas adolescentes se manifestaram, mas de forma debochada e jocosa. Nenhum de nós manteve a ilusão de que seríamos ovacionados (a não ser por uma eventual manifestação de arremesso de ovos), e nem mesmo reconhecidos por aquele público em específico. Pelo contrário, sabíamos de antemão que éramos desconhecidos por parte daquelas meninas. Porém, a saraivada de impropérios e deboche nos surpreendeu. 


Ouvimos várias provocações por conta da nossa aparência, principalmente pelas longas cabeleiras setentistas, e que causavam espécie no ambiente oitentista. Algumas mais abusadas debocharam de nós, a gritar frases feitas e vazias, tais como: -"Beatles acabou", -"Led Zeppelin já era", -"John Lennon morreu", e outras frases de mau gosto, com o intuito de nos ofender, e a estigmatizar-nos como "coisas do passado".

Todavia, o que realmente essas adolescentes cultuavam foi um embuste. Uma banda de mentira, formada através de um balão de ensaio da parte de marketeiros e sob a égide do absoluto mau gosto de uma música brega e latinizada (no pior sentido do termo, deixo claro, pois latinidade não é exatamente sinônimo de arte baixo nível em essência, mas há esse lado em certas manifestações, exatamente como existe no samba, que banalizado em forma de "pagode romântico", assume tal vestimenta).

Portanto, pela força da formação de opinião, essas meninas cultuavam um pseudo artista pré-fabricado, que raramente se apresentavam a cantar ao vivo, não compunham, não tocavam, não escreviam as letras de suas canções, enfim. Esteticamente, faziam uma música pop latina da pior qualidade etc. 


A história tratou por varrer para o ralo um excremento daqueles, e hoje em dia, aquelas meninas vociferantes e imbecilizadas por uma ação viral de superestimação absurda de uma artista fake, como foi o Menudo, são senhoras de meia idade hoje em dia (2015), e dada a aceleração do processo de perpetuação da espécie que observamos nos dias atuais, não duvido que algumas já sejam vovós... 

Nos resignamos com as provocações, mas o Beto Cruz se desconcentrou por um momento, quando estávamos quase no fim desse corredor polonês pleno de provocações. Ele parou e a fitar uma adolescente histérica que berrava algo como: -"O sonho já acabou", lhe falou de forma dura: -"Eu gosto mesmo dos Beatles, porque eles compunham, tocavam e cantavam as suas músicas, muito ao contrário desses chicanos que vocês curtem"...

Foi uma verdade absoluta, e essa menina teve que engolir...
Enfim, o fato de gostarem daquele lixo subcultural, foi uma mera ação publicitária viral e perpetrada por mafiosos que manipulam a música mainstream, e no fundo, foram vítimas, ao serem usadas como idiotas úteis para que esses crápulas ganhassem dinheiro. 


Os membros da "banda" em si também não tinham culpa. Se eu fosse Porto-Riquenho, tivesse habilidade como dançarino, e quinze anos de idade, talvez me motivasse a fazer um teste para fazer parte de um embuste desses, e assim vir a tornar-me um "artista" famoso da noite para o dia e a ganhar fama, dinheiro, e meninas lindas a se descabelar por minha causa...(brincadeirinha...com quinze anos de idade, eu queria ser Rocker genuinamente, ao me esforçar para aprender a tocar um instrumento, e cultuar a nata do Rock).

Ou seja, os rapazes desse grupo, estavam isentos, e ninguém poderia criticá-los por fazer parte disso, pelo menos até a "página 2" do manual de ética e moral, digamos assim. Bem, nada como o tempo para restabelecer a justiça... pois eis que vinte e nove anos depois (escrevi este trecho em 2014, mas o publico "agora", em 2015), o Led Zeppelin continua lá no panteão dos grandes artistas do século XX, como The Beatles, mas e o Menudo, o que representa na história da música, exatamente?
Continua...

Nenhum comentário:

Postar um comentário