E o outro lançamento d'Os Kurandeiros, ocorrido em julho de 2018, foi mais um álbum com material ao vivo, chamado: "Rádio Pirata" e a conter o subtítulo, "Rock ao Vivo". Foi o mesmo caso do outro álbum sobre o qual eu comentei anteriormente e cujo lançamento foi simultâneo, ou seja, o termo usado: "Rock ao Vivo", segundo o Kim, foi um adendo em torno de uma motivação de ordem publicitária e não é o nome do disco, oficialmente.
A despeito dessa questão, o que importou foi que Os Kurandeiros estavam a lançar dois discos ao vivo, simultâneos e neste último, eu estou presente em várias faixas, portanto, a rigor, constituiu-se do meu quarto registro fonográfico com tal banda e vigésimo primeiro da carreira em geral.
Qual foi o mote? Eis que o Kim Kehl compilou uma série de apresentações feitas pela banda, ao vivo, em alguns programas de rádio e televisão, entre 2009 e 2017, portanto, tirante as faixas gravadas por uma formação anterior à minha, de 2009, nas demais, eu estou presente. Excelente ideia, eis aí tipo de material que valeu a pena preservar por anos a fio, para finalmente ser lançado em um álbum. Toda a produção desse trabalho, foi um esforço da parte do Kim Kehl, com apoio de Lara Pap.
Sobre o material, foi compilado conforme as seguintes fontes:
1) Programa "Barlada"/Rede NGT de TV - 2009
2) Programa "Ao Vivo" - Brasil 2000 FM - março de 2015
3) Programa "Live on the Rocks" - Webradio Saty Rock Brazil - outubro de 2015
4) Programa "Toca Mais Uma" - Rede BCC/TV de Internet - outubro de 2017
Na formação de 2009, Kim Kehl e Nelson Ferraresso tiveram como companhia as presenças de: Fabio Scatone, na bateria e Renato de Carvalho, no baixo. Nas demais faixas a compreender gravações de 2015 a 2017: Carlinhos Machado à bateria e voz e eu, Luiz Domingues, no baixo, além de Kim e Nelson, presentes igualmente.
Em relação à capa, a concepção foi simples, com uma foto do Power-Trio básico formado por Kim Kehl, Carlinhos Machado e eu, Luiz Domingues, a tocarmos no pequeno estúdio da emissora BCC Television, de São Paulo, por ocasião em que participamos do programa: "Toca Mais Uma".
Mas a foto foi trabalhada com um filtro bem exagerado, portanto, as cores ficaram berrantes e os traços das pessoas, instrumentos e equipamentos, assemelham-se à uma pintura. O Chroma Key do fundo, existente nesse referido estúdio, foi verde na realidade, no entanto, na finalização dessa foto, modificou-se sob um vermelho vivo, cor de sangue, e o piso, preto.
Na contracapa, há uma foto do palco de um show realizado anteriormente, sem a banda, mas só a mostrar instrumentos e equipamento backline, igualmente modificada, mas sem muito exagero, no entanto. Pelo enquadramento, o meu baixo não ficou registrado, dá para ver apenas duas guitarras do Kim e a bateria, além dos amplificadores.
Sobre as canções, pelo fato de ser uma compilação com gravações ocorridas em épocas e circunstâncias diferentes, mas sobretudo por nenhuma gravação ter tido um grande requinte técnico em sua captura inicial, não é possível exigir-se um maior apuro no tocante aos timbres dos instrumentos e vozes e assim, é para ser entendido mesmo como um disco sob o padrão de um "bootleg".
E nem mesmo pode-se esperar uma execução perfeita, pois todas as canções foram gravadas ao vivo e sem chance para haverem tomadas suplementares a determinar uma escolha, mas simplesmente, são únicas em sua atribuição, ou seja, pequenos erros musicais são observados ao longo da execução, da parte de todos os instrumentistas e cantores envolvidos.
Entretanto, visto pelo lado romântico da música profissional, são autênticas tais interpretações, justamente por isso. No geral, o áudio preservado revela-se bom e mediante um processo depurativo em estúdio, com mixagem e masterização, o resultado final é satisfatório, com a devida ressalva de considerar-se dentro do padrão de um "bootleg", logicamente. Para a memória da banda e individual de cada componente, assim como para os fãs do trabalho, trata-se de um disco a conter um tesouro e que só enriquece a trajetória desse grupo, em todos os sentidos.
Outra boa novidade que o Kim introduziu neste álbum, há uma série de vinhetas a simular o ruído da estática, oriunda da audição de velhos aparelhos de rádio. Dessa forma, no início e entre algumas faixas, foi acrescida vinhetas que receberam o nome genérico como: "Rádio Pirata", para demarcá-las.
Tal recurso lembrou-me o álbum, "The Who Sell Out", do The Who, lançado em 1967, que usou de um dispositivo semelhante ao simular ser a programação de uma emissora de rádio. Neste caso, o The Who investiu mais e de fato, existem vinhetas criadas especialmente para o disco, a simular locuções radiofônicas e até intervalos comerciais a imitar propagandas comerciais a se oferecer produtos, porém, mesmo que em nosso caso tal intervenção mostre-se mais simples, devo salientar que a produção do Kim foi bem interessante nesse aspecto.
A respeito das faixas em que participo, cabe uma análise mais pormenorizada.
"A Noite Inteira"
Versão muito vigorosa e de certa maneira, muito surpreendente, pelo quesito áudio, pois a captura dessa faixa, foi feita de uma forma muito precária, através de ambientação "overall", sem separação dos instrumentos e tampouco por haver microfones para as peças da bateria, portanto, com tal instrumento a soar in natura.
Usei um baixo da então luthieria, Tajima, réplica de um Fender Precision e ele soa pesado, no limite de uma quase distorção e lembra vagamente o som do John Wetton em seus tempos de King Crimson.
Acho bem interessante o efeito percussivo que eu sempre fazia ao vivo, mediante o uso da palhetada nas cordas presas e apesar de não ter havido nenhuma mandada do som do baixo na mesa da mixagem, a captura natural do amplificador, soou bem. O som da bateria mostra-se seco, apesar da reverberação natural do estúdio de TV onde tocamos ao vivo e o som da guitarra ficou muito interessante, pois o Kim usou uma guitarra Fender Telecaster, nesse dia, e aquela ardência típica desse modelo de guitarra, revelou-se muitíssimo agradável.
A voz do Carlinhos no Backing vocals foi prejudicada, no entanto, pois ficou abaixo da voz principal, além da conta, mas dá para ouvir a sua participação, assim mesmo. Ressalto a energia dessa performance, que foi ótima.
"Pro Raul"
Esta versão de "Pro Raul" tem uma captura mais categorizada e já dá para perceber tal detalhe, antes mesmo da música iniciar-se, vide a voz do Kim ao anunciar a canção com a sua voz já bem processada. Aqui todos os instrumentos tem os seus respectivos timbres melhor cuidados e a performance é boa, com pequeninos erros pontuais, imperceptíveis.
Mostra-se bastante animada a versão e a presença do tecladista, Nelson Ferraresso, a tocar piano elétrico Fender Rhodes e naturalmente que assim abrilhantou o faixa. Toquei com outro baixo feito por um Luthier e igualmente a revelar-se uma cópia de um clássico, Fender Precision, desta feita ele soou com um registro mais grave e a minha performance pessoal foi correta, mas um tanto quanto comedida, pois lembro-me bem, optei por fazer uma linha sem maiores improvisos, a otimizar o tempo no estúdio e assim evitar a repetição de muitas tomadas e de fato, foi uma tentativa apenas, disponibilizada e que foi ao ar no programa de rádio.
"Maria Fumaça"
Versão com bastante balanço e com múltiplos coloridos, a destacar-se a ótima atuação do Kim ao slide guitar e a condução ótima do Nelson Ferraresso, ao órgão Hammond, pois não apenas encorpou, como desenhou muito bem durante a música.
Nessa performance, eu soltei-me mais e permiti-me alguns improvisos e fui feliz em minhas escolhas ao acaso, com um único vacilo, que foi motivado por uma interpretação errônea sobre o mapa harmônico da música, ou seja, achei que mudaria a chave, mas não fora a hora correta e dessa forma, mandei uma nota errada, mas corrigi em uma fração de segundos.
Usei o mesmo Precision genérico da faixa anterior e ele soa encorpado, sem muito brilho, é verdade, mas com um timbre bom. Acho que o som do bumbo ficou obscurecido na mixagem da bateria e talvez a explicação tenha sido o fato do baixo ter ficado com um grave um pouco além da conta, por isso a caixa e o chimbau, sobressaem-se.
"Sou Duro"
Essa versão de "Sou Duro", tem um andamento levemente mais lento do que estávamos acostumados a executar ao vivo, e por isso, soa praticamente mais como um R'n'B do que Rock'n' Roll e assim, agrada-me de certa forma, pois produz mais balanço do que o normal.
O tecladista, Nelson Ferraresso, novamente fez uso do órgão Hammond com um timbre clássico, bem ao estilo do Jimmy Smith e fez um solo duplo, muito bom. Usei o mesmo baixo da faixa anterior. A minha condução foi tradicional, sem muito voo, a privilegiar abrir espaço para a guitarra, que pontuou bastante e os teclados, idem.
"A Galera Quer Rock"
Nesta faixa, assim como na sequência iniciada desde a canção, "Pro Raul", há aquela carência do som do bumbo mais presente. A carga com grave ofertada pela presença do baixo, de certa forma não deixa uma lacuna na música, mas isso não supre a ausência do bumbo, sem dúvida.
Há a incidência de dois vacilos generalizados da parte da banda, e um deles, parece ter sido sincronizado e assim, para o ouvinte que não conhece tais meandros da música, passa como se fosse um "arranjo" premeditado.
O bumbo só aparece em momento solo, quando os demais param de tocar e aí dá para ver que a sua timbragem não foi feliz, pois está sem peso algum, quase a parecer um bumbo "trigado", com mais "kick" do que pelo corpo da nota emitida.
Acho que o baixo ficou um pouco mais baixo nessa mixagem e aí, é difícil distinguir as suas frases com maior nitidez. Independente dessas questões mais técnicas, trata-se de uma versão com energia.
"Maria Maluca"
Versão com bastante vigor e a mesma observação sobre timbres e mixagem das anteriores, desde "Pro Raul". A destacar-se o sonoro palavrão que o Kim aqui registrou e que às vezes usava ao vivo, durante os shows como alternativa para gerar graça, em detrimento da palavra correta da letra, que está cantada na versão oficial, gravada no álbum de estúdio. O certo é cantar "no bolso", mas aqui, o Kim cantarolou algo mais incisivo, digamos assim...
"Anjo" ("Eu vi um Anjo")
Essa versão é muito boa, pela emoção que ficou impregnada na performance. Soou como deve ser, isto é, uma canção gospel (sem conotação religiosa, no entanto), como um blues emocional.
Sob outro padrão de gravação, com maior capricho, aqui, tudo soa melhor, inclusive as vozes e sim, a do Carlinhos, está bem proeminente e bem timbrada. Uma performance excelente e que retrata como essa canção costumava soar naqueles tempos.
"Os Brutos Também Amam"
Boa versão desse Blues, embora eu tenha cometido alguns equívocos, corrigidos prontamente, mas mesmo assim, perceptíveis e também por insegurança em torno do mapa da música. Tirante os meus pecados pessoais cometidos, foi uma boa performance geral da canção e com o mesmo padrão da gravação comentada sobre a faixa anterior, no tocante aos timbres e padrão de mixagem. Gosto do pontilhado do órgão Hammond, outra vez bem ao estilo clássico dos blues, e que lembra o som do Booker T.
As demais faixas ("Beber Até Cair", "Deixe Tudo", "Dead Flowers" e "Can't Be Satisfied"), foram gravadas por uma formação anterior e assim, eu não participei. São versões com um padrão de áudio e performance sob qualidade, perpetrada por aquela formação, em linhas gerais.
Bem, no cômputo geral, trata-se de um lançamento que enriqueceu bastante a discografia da banda e a minha em particular, e eu fiquei muito feliz por chegar ao vigésimo disco da minha carreira e com a certeza de que esse número aumentará.
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