quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Autobiografia na Música - Boca do Céu - Capítulo 39 - Por Luiz Domingues


Não víamos os jurados. Eles ficavam em uma bancada, bem longe da balburdia, e analisavam os concorrentes pelos monitores da TV Bandeirantes, que estava a gravar a eliminatória do Festival. Acredito que até dessem-se ao luxo de assistir o replay, disponibilizado pelos técnicos da TV. Não lembro-me de nunca mais ter tido receio em subir ao palco depois disso. E a rigor, fora somente meu quinto show na vida... 

Bem, a sensação que tive, foi um misto de preocupação pela responsabilidade pela apresentação, com alegria em estar sob uma situação de grande porte, ao menos na minha percepção daquela época. Havia uma boa dose de receio pela hostilidade inevitável daquela horda formada por vândalos imberbes, também. Mas sinceramente, a sensação em estar sobre um palco grande, alimentado por um sistema profissional de P.A. e luz; equipamentos de bom nível e cinco mil pessoas a olhar-te, fora as câmeras de TV, foi de uma grande realização pessoal. O Laert usou um piano elétrico, Fender Rhodes 88; o Fran tocou em uma bateria, Ludwig perolada, igual à do Ian Paice; e eu; Osvaldo, e Wilton, usamos amplificadores, Duo Vox. Foi muita coisa para uma banda formada por garotos inexperientes e com pouco técnica, com exceção do Wilton que estava alguns passos adiante de nós na musicalidade, e do Laert que era tão inexperiente quanto qualquer um de nós, mas tinha a genialidade nata a seu favor. 
E chegou a segunda eliminatória. Iríamos defender nessa segunda participação, a música "O Mundo de Hoje". Tratava-se de um blues, e curiosamente fora uma ideia dos primórdios da banda, anterior à entrada do Laert, portanto de uma época em que só o Osvaldo Vicino sabia tocar alguma coisa. É bem verdade que o Laert deu uma melhorada na letra, e também na melodia original, para ficar então com crédito como autor, também. Estávamos bem confiantes e de certa forma vacinados contra a selvageria juvenil dos vândalos do FICO. Na segunda eliminatória, defenderíamos uma música um pouco mais adequada à execução perante um grande e bem ruidoso público, naturalmente. Mas não foi o ideal, igualmente, pois tratava-se de um blues tradicional com estrutura harmônica convencional, e sem nenhum grande atrativo, mais impactante. "Revirada", nossa música mais forte, nem classificara-se.Talvez tenha sido desaprovada pelos jurados na filtragem geral, pelo teor da sua letra. Sendo o Fico um festival com maior envergadura, e transmitido pela TV, não convinha deixar alguém expressar-se mais contundentemente, em um momento político muito difícil. Nunca é demais lembrar que naquela época a repressão da ditadura atacara violentamente os estudantes, em uma invasão ao campus da PUC de São Paulo. Tocamos e não fomos mal. Sem ter que tocar piano, Laert movimentou-se mais como vocalista e frontman, mas a música não ajudava, no sentido de ser um blues. Não classificamo-nos, novamente, mas ficou a sensação do dever cumprido, e a animação por sentir que a banda crescia. Agora, tínhamos a expectativa em ver a filmagem passar na TV. Seria a primeira vez que estaria a aparecer na TV, a tocar, e claro que foi um marco. Naquela noite, o show de um artista consagrado para entreter naquela segunda eliminatória, foi duplo. O trio vocal brega, "Harmony Cats" (formado por Gretchen; Sula Miranda e uma outra irmã das duas cantoras citadas), e a seguir : "As Frenéticas", que estavam a explodir na mídia mainstream, naquele momento.
A banda das Frenéticas, continha alguns componentes d’O Peso, uma banda setentista do Rock brasileiro, muito boa, o que conferiu ao show, elementos rockers na execução, para atenuar a "Disco Music", delas. 



Continua...

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