Sou para ela, ago assim como um zero
a esquerda, um rato
de esgoto.
Um ensaio de fracasso, um subtítulo de
poesia panamenha.
Fico parado olhando a boca da noite que chega, e os
automóveis passam como se me vaiassem.
Ela não sente por mim, que lhe
tenho afeto, nem
compaixão.
Seu espírito
privilegiado nunca me encontrou em
encarnação alguma, diz-me como se eu
fosse um inseto de
lixão.
Senti-me desamparado da minha humanidade.
Deu
vontade de dizer-lhe que o budismo tibetano diz que
temos e tivemos
tantas vidas, que todas as criaturas foram
nossas mães.
Mas isso ia
demandar tempo, e Lady Distraída
estava inflexível, sem querer facilitar nenhuma migalhinha de
afeto.
Esses espíritos evoluídos sempre me surpreendem.
Sempre
que bebo essas desilusões humanas, tenho
saudade do meu Labrador Buda,
que deve estar
percorrendo os imensos desertos do paraíso.
Aliás, peguei
uma neurose esquisita, mais uma, ao ficar
imaginando se esta ou aquela
pessoa iria para o paraíso.
Meu Deus, dai-me no céu apenas uma chácara
solitária.
Fico apavorado, fora uma meia dúzia de gente que me ama,
de
encontrar gente no paraíso.
Não consigo conceber os Anjos deixando
passar noventa e
cinco por cento das pessoas desse mundo.
Lady Distraída nem deixou eu argumentar que eu tenho um
Lady Distraída nem deixou eu argumentar que eu tenho um
futuro brilhante na
literatura e que a academia sueca me
dará o Nobel, daqui a algumas
dezenas de anos.
Eu não brilho para ela.
Para Lady Distraída, eu sou uma
mala, e para alguns outros,
mala e para milhões, talvez bilhões nada.
E
dizem que Jesus morreu por mim. Misericórdia!
Apavora-me pensar as
multidões infinitas que habitarão o
inferno!
Lady Distraída poderia ao
menos dispensar-me com
elegância, dizendo que sou um bom rapaz e depois
mandava o pé na bunda, com classe.
Eu ainda ficaria agradecido, como o
Cornélio da TV do
Ceará, que a mulher vende marmita para fora e ele
elogia
sua atenção aos fregueses, o cândido Córnélio.
Sim, eu vejo nas
Garras da Patrulha.
Lady Distraída jogou o meu resto de ego no esgoto.
Literalmente, surfando na merda.
Só me resta ouvir Guilherme Arantes e tomar um cafezinho.
Só me resta ouvir Guilherme Arantes e tomar um cafezinho.
Fracassar para
mim não é novidade nenhuma. É quase um
mantra.
Uma religião.
Medito
constantemente sobre o tema. E tenho um talento
robusto que se dispensa
provas.
A surpresa vai ser quando descobrirem por acaso, que sou
A surpresa vai ser quando descobrirem por acaso, que sou
apenas um gênio
incompreendido.
Quanto a Lady, Distraída, só me resta fazer dela, por
enquanto, um personagem de comédia.
E pedir a Deus que a livre das
chamas eternas, por fazer
um poeta passar essa cena de filme B, com a
frase:
“Não tenho nenhuma ligação contigo”.
“Não tenho nenhuma ligação contigo”.
Marcelino Rodriguez é colunista esporádico do Blog Luiz Domingues 2. Escritor de vasta e consagrada obra, aqui nos apresenta a continuação de uma crônica muito divertida, sobre uma certa dama, que insiste em manter-se alheia aos sinais que a vida lhe apresenta...
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