sexta-feira, 19 de junho de 2015

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 332 - Por Luiz Domingues

Finalmente, o Stúdio V sinalizou serviço, ao agendar uma entrevista em um programa de Rádio diferente do nosso mundo habitual. Abertos e sempre a mirar na expansão, claro que aceitamos e fomos participar de um programa de uma então jovem jornalista na Rádio Tupi AM, que não era muito famosa na época, mas hoje em dia, o é bastante: Sonia Abrão.
                     Sonia Abrão em foto bem mais atual

Contato da "nossa" Sonia, foi o típico programa centrado em fofocas de artistas do mundo popularesco, notadamente centrado em atores e atrizes de novelas, mas também a conter artistas musicais do mesmo espectro popularesco.

Não posso me queixar no entanto, pois Sonia Abrão foi muito simpática para conosco, pois executou a canção: "Sun City", proveniente da demo-tape que graváramos em abril daquele ano, nos deu abertura para falar de agenda, planos etc. De nossa parte, não nos maculou em nada ter participado de um programa supostamente fora de nosso nicho habitual, e pelo contrário, queríamos mesmo angariar público que nunca havia ouvido falar ao nosso respeito.
E achamos muito bom vermos um primeiro esforço do "Studio V" lograr êxito, enfim. De certa forma, não nos incomodava que não acrescentassem nada nos meios onde já éramos conhecidos, e solicitados espontaneamente, e assim, essa primeira demonstração de esforço extra e agregado aos nossos esforços naturais, agradou-nos, mesmo não sendo nada muito marcante.

O próximo compromisso em termos de apresentação, não seria dos mais glamorosos, entretanto havíamos aceitado participar por que seria uma festa de um programa de Rádio, que desde 1985, nos dera força, e para sermos simpáticos, nesse caso, não seria possível deixar de participarmos de um evento da parte de quem nos ajudara com entrevistas, e execução de músicas.

O programa em questão foi o "Riff Raff", que era transmitido pela 97 FM de Santo André, e que era a melhor emissora Rock de São Paulo naquela época, embora não estivesse exatamente na capital, mas na simpática cidade vizinha.
O seu apresentador era um garotão expansivo e histriônico, chamado, Richard, que falava pelos cotovelos e tinha uma orientação bem puxada para o Hard-Rock e sobretudo o Heavy-Metal dos anos oitenta, e onde invariavelmente mais éramos saudados e enxergados como componentes da cena.

O local desse show foi exótico ao extremo, mas ao mesmo tempo tornou-se como algo surpreendente, foi muito engraçado fazer um show nesse lugar, embora no decorrer da noite, tivéssemos problemas, e que foram muito preocupantes.

Bem, o local se chamava: "Ácido Plástico", e ficava localizado a duas quadras da penitenciária do Carandiru. Até aí, sem problemas, mas o exótico nisso foi o fato do local ser uma "ex-igreja" evangélica, ou seja, foi muito surreal que uma igreja tenha deixado as suas instalações para que um novo dono a usasse, sem modificações arquitetônicas básicas, para empreender atividades seculares, ainda mais shows de Rock, quando geralmente vemos o contrário, com ex-salas de cinema e teatros sendo transformados em templos.

Não saberia dizer a que denominação evangélica pertencera a instalação, mas seguramente fora uma igreja oriunda do protestantismo clássico, e não uma pentecostal, pois a sua arquitetura básica assemelhava-se à das igrejas católicas, nas partes externa e interna.
Portanto, o palco disponível ali, se apresentou com estrutura de púlpito, a tornar aquilo muito exótico. Na hora em que entrei no local, pensei naquela cena do filme: "Tommy", com o The Who e Eric Clapton, a interagir juntos, e onde a Divindade a ser cultuada, foi uma estátua enorme da saudosa atriz, Marilyn Monroe...

No caso do "Ácido Plástico", claro que não havia esse glamour louquíssimo de um filme de Ken Russell, e fora a rudeza da ambientação de uma ex-igreja, e equipamento bem modesto de som e iluminação, ali aconteceria um show de Heavy-Metal, com várias bandas do gênero, A Chave do Sol, incluso, como a mais leve da noite, ainda que na percepção daquelas pessoas, fôssemos uma banda oriunda da mesma cena, fator não correspondente à verdade, mas tudo bem, estávamos acostumados com essa visão errônea das pessoas ao nosso respeito.

Além de nós, tocaria também a banda,  "Destroyer", cujos membros eram boas pessoas, e com as quais, nós tínhamos um bom relacionamento de amizade. Claro que o som deles era o metal pesado, mas não seria problema para nós, pois estávamos acostumados a fazer shows coletivos com bandas pesadas. No entanto, um fato curioso e perigoso ocorreu quando da realização do soundcheck.
Eu estava em pé a observar os preparativos do Destroyer para iniciar o seu soundcheck, quando resolvi sentar-me em um canto do salão. O som dos rapazes era peso-pesado e como de costume entre bandas desse gênero musical, não faziam dinâmica alguma, a tocar de forma "reta", como se diz no jargão musical.

Com a agravante do fato do salão estar vazio, somente com a presença dos músicos e técnicos ali presentes, além da constatação daquela acústica ter sido concebida para cultos religiosos e não shows de Rock, claro que com os rapazes a tocar naquele volume ensurdecedor, com tal volúpia, fazia com que tudo vibrasse, inclusive os vitrais das janelas.
Foi quando sob uma fração de segundos, eis que eu senti uma punhado de farelos brancos a cair sobre a minha cabeça e ombros e nem deu tempo para raciocinar, pois logo a seguir, eu senti um forte impacto na cabeça, seguido de gritos, e a banda a parar de tocar no palco. Sem entender direito o que ocorria, tornei-me o centro das atenções! O que ocorreu?

Por azar absoluto, eu estava sentado em um canto, bem abaixo do aparelho de ar condicionado do estabelecimento. Talvez não muito bem fixado na parede e certamente a estimulado peça trepidação que o som estava a causar, este tratou por despencar.
A minha sorte, foi que o impacto foi causado pela tela protetora, bem mais leve do que o sólido aparelho em si. Este também caiu, mas nessa altura, naquela fração de segundos, atingido pela tela, o meu reflexo de defesa funcionou, e eu dei um salto da cadeira, pois a carcaça mais pesada cairia a seguir, para espatifar-se no chão sob forte estrondo, a assustar a todos.

Eu fui prontamente socorrido por todos os presentes, mas o ferimento causado mostrou-se mínimo, com um leve arranhão na parte lateral da testa, a sangrar-me pouco e como consequência, a produzir um hematoma discreto como lembrança imediata.
Nada pior ocorreu, portanto, mas foi uma sorte incrível não ter ocorrido algo muito pior. Se tivesse me atingido em cheio, receio que poderia ter me ferido gravemente, quiçá, letalmente, e assim, o fato é que eu talvez não estaria aqui, anos depois, a escrever esta história.

A seguir, refeito do susto, firmei posição de prosseguir com a programação,  sem modificações no cronograma, apesar dos apelos dos amigos para que eu fosse de imediato a um Pronto- Socorro buscar uma avaliação médica mais apurada.

No entanto, a noite proporcionar-nos-ia uma outra surpresa, tão desagradável quanto...

Continua...

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