segunda-feira, 22 de junho de 2015

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 357 - Por Luiz Domingues


Mais ou menos na metade de novembro, finalmente uma secretaria de André Midani ligou no escritório e deu o veredicto: estávamos rejeitados pela Warner. Uma resposta padrão, amena, dera conta de que Midani "adorara o material", mas o som que fazíamos, não representava o que estavam a procurar naquele momento. Um ano depois, o Ultraje a Rigor mudou completamente a sua orientação estética e sonora, quando passou a posar como uma ao estilo de uma banda Hard-Rock oitentista, inclusive no visual, com os seus componentes a ostentar enormes cabeleiras, e a usar figurinos iguais à de bandas desse mundo em voga tais como o Ratt, Motley Crüe, Van Halen, Poison etc...

Cáspite, nas outras vezes em que fomos desprezados por essa gravadora, não sentimos tanto o impacto, e não foi para menos.  Nas outras ocasiões, fora muito previsível que não nos aprovassem, por uma somatória de questões, e que inclusive já foram amplamente descritas e analisadas nesta autobiobiografia. Mas desta vez, em nossa avaliação, houvéramos pensado em detalhes que foram além da parte musical apenas. Contudo, novas falhas saíram de nosso controle.

Tínhamos muita esperança no poder de persuasão do Miguel, mas na hora decisiva, percebemos que ele não o usara, suficientemente. Talvez por excesso de confiança de sua parte, ainda a se basear nos seus anos de sucesso nessa indústria, e sobretudo, por não considerar que neste ponto dos anos oitenta estaria possivelmente defasado do mercado. Outros fatores pesaram, e claro que o principal, pelo aspecto da estética, foi que ainda estávamos na contramão do que os mandatários do show business pensavam, por mais que houvéssemos simplificado o nosso som, principalmente nas letras.

O apelo Pop que achávamos evidente em nossa avaliação, muito provavelmente estava fora do padrão para eles. Por mais que a cozinha d'A Chave do Sol tivesse simplificado as suas criações, ainda assim se mostrava "complicada" demais para o padrão deles, que ainda reagiam sob os parâmetros paupérrimos da escola Pós-Punk. O excesso de solos de guitarra, em moldes tradicionalistas, certamente ainda os incomodava, também.

Por outro lado, músicas como: "Solange", "Saudade", "Desilusões" e "Trago você em meu Coração", não lhes despertara o sentimento de soarem Pop ao extremo? E como justificar o fato de que bandas como Rádio Táxi povoavam as emissoras de AM e FM com canções semelhantes, há anos? Não teriam as quatro canções citadas, potencial para fazer parte de trilhas de novelas globais?
Outro fator: naturalmente que na hora de as regravarmos oficialmente, elas sofreriam muitas modificações da parte dos produtores e nesse caso, nem assim vislumbrava-se que a cortar os excessos que julgassem indevidos, poderiam moldá-las, a "pasteurizá-las?" Até mudanças de andamento e tonalidade poderiam ser feitas, e certamente que insistiriam para que o Beto, cantasse em tons mais baixos. Neste caso, seria deixar de inspirar-se no Robert Plant e adotar a postura dos vocalistas do BR-Rock 80's, que em sua maioria cantavam para baixo. Não é preciso um grande esforço para citar alguns exemplos: Renato Russo, Bruno Gouveia (Biquini Cavadão), Herbert Vianna, até mesmo o Cazuza.

Enfim, ficamos chocados em termos sido rejeitados mais uma vez por esses fatores que citei e outros.

Vida que seguiu, pensamos que uma rejeição não inviabilizaria novas tentativas em outras companhias. O discurso do escritório fora claro no início da nossa relação: -"temos contato e amizades em todas, escolham uma". Portanto, se a primeira tentativa não logrou êxito, iríamos com tudo para o plano B, certo? Mas não foi o que aconteceu, infelizmente. 

Na época, não ficou nada claro, no entanto. Ninguém nos esclareceu sobre alguma mudança de planos na estratégia, e convenhamos, haviam prometido o céu como limite, mas não haviam nos proporcionado nada maior ou melhor do que nós já tínhamos conquistado com o nosso próprio suor, e pior que isso, amealhavam 40% do cachet de shows que nós mesmo fechávamos.
Essa equação não estava a bater e nesse instante, para piorar a situação, pareceu que logo na primeira tentativa que não logrou êxito, esmoreceram tão facilmente?  Aonde estariam os contatos, as favas contadas?


A nossa maior comunicação sempre foi com Sonia e Toninho, mas agora, ambos estavam a trabalhar quase em regime de exclusividade com o comediante já citado, e o Miguel não se deixava pressionar, a impor uma distância regulamentar que lhe permitia só falar conosco em reuniões formais, e convocadas por ele, ou seja, apenas quando ele desejava.

Foi nesse ínterim que um outro elemento começou a interagir mais conosco. Esse rapaz chamava-se: Arnaldo Trindade, e a sua formação era como publicitário. Ele foi contratado para orientar os negócios da empresa, sob a estratégia do marketing.

Ao contrário da histriônica Sonia e do aristocrático Miguel, Arnaldo era um sujeito "zen", ponderado, sensato e talvez fosse a pessoa ideal para começar a lidar mais conosco naquele momento em que sinais ainda subliminares, indicaram uma queda na avalanche de boas novas que vínhamos a receber e pelo contrário, pequenos revés estavam a bater no casco do nosso frágil barco. 


Através dessas conversas preliminares que tivemos, Arnaldo nos falou bastante sobre estratégias de marketing, e tratou de acalmar os nossos ânimos que começaram a exaltar-se, com a falta de empenho do escritório em mostrar mais serviço, principalmente no quesito da marcação de shows, visto que a rejeição da gravadora Warner para conosco, não poderia ser creditada à eles como culpa, ao menos sob uma análise superficial. Ou melhor, será que não?

Pois ao analisar hoje em dia (2015), eu questiono muito a abordagem feita pelo casal Sonia e Toninho ao André Midani.

Talvez eles tivessem boa desenvoltura para vender atores para formação de elenco de novelas, para abordar diretores de TV, mas será que foi acertado que eles nos representassem em uma uma reunião com Midani? O mundo da música era completamente diferente e a falta de traquejo de ambos para lidar com tal situação devia ser total! Especificamente a falar sobre Rock, então, ainda piorara mais o abismo cultural entre as partes, para uma discussão de alto nível, ao não usar a mesma linguagem.

Portanto, o ideal ao meu ver, teria sido o Miguel, em pessoa, ter ido ao Rio. O dinheiro que o escritório gastou para bancar seis pessoas hospedadas em um apart-hotel de luxo, mais restaurantes bons da zona sul do Rio, muito provavelmente teria sobrado pela metade, se ele tivesse feito uma viagem de "bate e volta" mediante ponte aérea até o Rio, e tivesse falado diretamente com Midani.

Mesmo defasado do mercado, ainda assim, Miguel conhecia os meandros da indústria musical, mil vezes mais que o casal somado, e poderia tirar da manga, argumentos fortes que teriam influenciado Midani, e quem sabe com essa afeição, este não houvesse bancado a contratação, mesmo que os seus produtores rezassem por outra cartilha antagônica? Para a minha visão de hoje em dia (2015), isso teria sido muito plausível. Enfim, mais erros cometidos, da parte de todos, incluso o Miguel, o mais experiente dessa equipe toda.

Continua...

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