segunda-feira, 8 de junho de 2015

Autobiografia na Música - Pitbulls on Crack - Capítulo 84 - Por Luiz Domingues

Concomitante a essa atividade de montagem do conteúdo das latas promocionais, a gravadora teve um gesto positivo ao ajudar-nos também na produção do show de lançamento do CD. 

Convenhamos, não era uma praxe das gravadoras envolver-se em tais produções. Pelo contrário, lembro-me de ter tido contato com gravadoras nos anos oitenta, e as conversas de seus executivos convergiam na direção contrária.

Por exemplo, era comum ao receber material de alguma banda emergente, preocuparem-se em saber se os seus membros detinham condição sócio-econômica avantajada, e se possuíam um bom empresário com contatos, em detrimento de sua música ser boa ou não. Por isso, foi promissor para nós, que o esforço da gravadora nesse sentido fosse concreto, ao dar-nos suporte para fazer um lançamento com barulho, e que de certa forma, justificasse todo a aparato da lata etc.

Claro, foram muitas as conversas para dar formato. Não seria um show tradicional a realizar-se em uma casa noturna ou teatro, e fim de conversa. Com todo a aparato da lata e do livro, o Alexandre Madeira, marqueteiro da gravadora, vislumbrou fazer algo maior, e que aproveitasse essa onda toda criada. Ele teve razão, pois seria um barulho e tanto na mídia, se fizéssemos algo maior, a evocar essa atmosfera toda.

Marina Yoshie, minha aluna, e que comandou todo o projeto gráfico do CD, seu aparato, e apoio para o show de lançamento.

Então, nas primeiras reuniões de criação com a banda e a presença da Web Designer, Marina Yoshie, falaram-se muitas coisas, mas já houve uma certeza: não seria possível realizar algo pretensioso desse nível, em uma casa noturna de pequeno ou médio porte. Deveria ser em um teatro, ou casa de show de grande porte.
 

Foi então que o marqueteiro, Alexandre Madeira, teve uma ideia que poderia lograr êxito: segundo ele, houve uma produtora de amigos seus que era especializada em realizar mega-festas em chácaras; sítios, fazendas, e afins. Estavam acostumados a providenciar a organização de festas com até quinze mil pessoas presentes, tendo diversos motes temáticos, inclusive "raves" de música eletrônica. Ótimo, poderia funcionar, mas desde que adequassem-se ao espírito dos anos sessenta, a ver com o aparato todo, pensei eu. E claro que seria difícil passar esse conceito para pessoas sem a menor familiaridade com o assunto.

No entanto, antes de qualquer julgamento prévio, claro que aceitamos fazer uma observação de campo, a convite do Alexandre Madeira. Sendo assim, eu e o Deca fomos juntos, em uma noite de sexta-feira de outubro de 1996, a uma dessas festas organizadas pelos amigos dele. Tal evento aconteceu em um sítio muito grande, localizado na cidade de Cotia, que vem a ser uma das trinta e nove cidades que ficam anexas literalmente em São Paulo, a formar a Grande São Paulo. Se tratou de uma festa a esmo, sem um mote específico, mas inacreditavelmente, havia ali, milhares de pessoas, e em sua maioria absoluta, jovens de origem socioeconômica avantajada. Apesar disso, pareciam divertir-se em um ambiente rústico, com poucas atrações, a não ser um ambiente fechado de música eletrônica, e um palco ao ar livre, em um campo de futebol, onde uma banda tocaria ao vivo.

The Central Scrutinizer Band, uma banda especializada em reproduzir o som de Frank Zappa and The Mothers of Invention

Com um P.A. razoável, mas com iluminação muito insuficiente, surpreendi-me ao tomar conhecimento da banda que tocaria como atração dessa noite: foi então a "Central Scrutinizer", uma banda cover do "Frank Zappa & Mothers of Invention". Ora, se vivo, seria bizarro ver um show do Frank Zappa para uma plateia formada por playboys, imagine uma banda cover...

Sem preconceito, mas sendo muito realista, tornou-se óbvio que seria no mínimo interessante como uma atração musical desse quilate (diga-se de passagem, essa banda era (é) impressionantemente boa, apesar de usar seu talento para "covers", ainda que a reproduzir o som de um gênio, como Frank Zappa), seria digerida por doze mil playboys, sem identidade Rocker alguma. 

Ficamos um pouco no ambiente a assistir e de fato, no campo de futebol devia haver cerca de mil pessoas presentes, e a apreciar muito a performance Zappeana dos rapazes. Eu também gostei da perfeição com a qual executavam diversos temas complexos do mestre. 

Independente dessa revelação surpreendente, é claro que a imensa maioria dos presentes na festa, estavam a circular pelo sítio e alheios ao som ao vivo. certo, não era nosso problema, e certamente que não esperaríamos que uma multidão concentrasse-se no campo de futebol para ver o nosso show, se o nosso lançamento fosse ser realizado ali, eventualmente. Por outro lado, eu e Deca gostamos de observar outros aspectos.

A organização como um todo pareceu-nos eficiente. Vários pontos que observamos, se mostraram satisfatórios. Houve a presença de muitas barracas a oferecer comidas e bebidas, a segurança pareceu estar sob controle, com vários profissionais espalhados pelo sítio, e não notamos brigas ou confusões, com as pessoas aparentemente felizes por estar ali a aproveitar a festa. Eu e Deca, a representarmos a nossa banda, concedemos o nosso aval e as negociações começaram para viabilizar o nosso lançamento nesse mesmo sítio, e sob a administração desse pessoal. Mas antes de ter essa confirmação de negócio fechado, tivemos um bom compromisso, anteriormente. 

Não tocávamos desde fevereiro daquele ano de 1996, pois passamos por meses, dedicados à gravação do CD. Mas esse convite foi bastante salutar, pois envolveria várias questões. Fomos convidados a abrir o show da banda: "Velhas Virgens", que lançaria o seu novo CD no Olympia, casa de shows mais famosa naquela época em São Paulo, e o CD deles, fora um lançamento da nossa gravadora, também. Portanto, seria uma ação boa para todos os envolvidos.
Continua...

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