segunda-feira, 22 de junho de 2015

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 360 - Por Luiz Domingues


O ano de 1986 começou na verdade para nós, em outubro de 1985.
Com a saída do ex-vocalista Fran Alves, não perdemos apenas um ótimo vocalista, mas também uma identidade forjada em torno de uma estratégia errônea, que precisava ser mudada rapidamente.
Claro que o Fran não teve culpa alguma nesse processo errôneo,  absolutamente, não! No entanto, a sua voz potente e rouca, ficou estigmatizada no trabalho da banda, justamente em um momento em que fizéramos uma aposta, que na prática, em poucos meses revelou-se equivocada.

Com sua saída, já tínhamos em mente que não só precisávamos encontrar um substituto para a sua vaga, mas empreender uma terceira, e de certa forma dramática, nova mudança em toda a estrutura sonora da banda.

Nesse contexto, tivemos a sorte de encontrar rapidamente o Beto Cruz, que trazia exatamente em sua mente, a mesma ideia a ser adotada doravante pela nossa banda.

Portanto, com sua chegada à Chave do Sol, mergulhamos fundo na tarefa de renovar inteiramente o repertório, e nesse caso, ele teve uma participação decisiva e criativa, pois por ser também guitarrista e compositor, culminou em se tornar o dínamo da banda, nessa remodelação. 

Os primeiros meses de 1986 foram marcados por um curioso hiato de shows, no entanto. Fato raro na história da banda, pois desde os seus primórdios, havíamos estabelecido uma agenda boa de apresentações, e logicamente que de 1984 para frente, ainda mais, por conta do crescimento do nosso grupo, motivada cada vez mais pela sua proeminência na mídia. 

No entanto, a partir da metade de março em diante, uma verdadeira avalanche de oportunidades começou a surgir e nesse momento promissor, aproveitamos cada gota que pingou sobre nós.

Nesses termos, foram muitos shows, diversas entrevistas para a mídia escrita, convites para filmarmos dois vídeoclips, aparições na TV, entrevistas de Rádio, a nossas presença através de um poster vendido nas bancas, a gravação de uma demo-tape com seis músicas inéditas, para o primeiro semestre.

Depois adveio: a concretização de um dos clips, enfim, tocar no Rio de Janeiro e desmaiar no palco, abordar e ser elogiado por Rita Lee...

E ao parecer ser o ápice dessa fase boa em que entramos, o convite para sermos contratados por um escritório formado por um triunvirato de empresários, com supostamente, muito poder de fogo em mãos. 
Mais uma avalanche de pedidos de entrevistas, ser ajudado por Charles Gavin e pelos membros do grupo, Os Inocentes, ser convidado para tocar no Nordeste, tocar em teatros superlotados, estabelecer recordes de lotação, abrir o infame Menudo no Anhembi em São Paulo...

Gravar mais uma demo-tape, com mais duas músicas inéditas, abordar gravadora major com chance real de ingresso no elenco de contratados dessa companhia.

Portanto, a análise final de 1986, mostra que a banda atingira o seu pico de popularidade, e aliado a isso, houvera considerado estar enfim, com um plano de carreira em vias de fazer com que subíssemos ao degrau da primeira divisão da música.

A presença de tal escritório, no qual depositamos concretas esperanças de que promoveriam tal gerenciamento seguro, foi baseada não apenas na suposta competência profissional quer teria no meio artístico, e nem mesmo sobre os seus contatos de bastidores, mas também pelo nosso momento próprio, que demonstrara ser excepcional, fruto de quatro anos de trabalho duro de nossa parte, ao abrirmos caminhos na selva que representa o mundo da música profissional, com nossas próprias mãos e assim criarmos trilhas, algumas até surpreendentes, em meio à mata fechada, ao se considerar estarmos sozinhos nessa aventura, sem ajuda alguma (ao referir-me à presença de empresários, pois claro que tivemos apoio de muita gente, incluso Luiz Calanca).

Portanto, a nossa percepção nesse instante, foi construída sob uma aura de absoluta euforia, baseada na quase certeza de que nessa seguinte somatória: entre o nosso pico natural de popularidade + novo trabalho melhor coadunado com os parâmetros Pop + a ação desse escritório de empresários e seus atributos, seria uma alavanca natural para alcançarmos o sucesso em larga escala.

E assim, o segundo semestre seguiu-se, com um crescente de euforia, expectativa e epifanias.

Todavia, quase no fim do semestre, um golpe deu-nos um revés, a diminuir muito essa euforia. Não seria o caso de provocar arrefecer tão violentamente o nosso ânimo, pois uma porta fechada não significaria necessariamente o fim das tentativas e pelo contrário, a luta continuaria, e todos os sinais positivos ainda existiram com força.

Porém, algo inexplicável minou-nos de certa forma, pois a confiança no tal escritório começou a gerar questionamentos sobre a sua real eficácia e pior que isso, um pensamento subliminar de que sob um vacilo, nós estaríamos a arriscar perder o nosso "momentum natural", pelo simples fato do escritório não ter tido a capacidade de segurá-lo com as duas mãos. E nesse caso, quantas vezes uma porta abre para um artista em sua carreira?

Momento de dúvidas a parte, não estávamos a encerrar o ano de 1986 do jeito que poucos dias antes, acreditávamos que seria. Portanto, a luta continuaria, mas no virar para 1987, um pouco da energia volumosa que acumulamos ao longo de 1986, houvera sido desperdiçada por conta de uma derrapagem, que nos obrigara a perder algumas posições na corrida rumo aos nossos objetivos maiores.
Continua...  

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