sexta-feira, 19 de junho de 2015

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 325 - Por Luiz Domingues


Um pouco antes de selarmos o acordo com o estúdio V, havíamos sido abordados pelo jornalista, Leopoldo Rey, que nos convidara para uma entrevista para uma revista nova que estava para entrar no mercado, como "spin off" de uma outra publicação já consagrada, no caso, a revista Bizz.  A ideia em questão, foi lançar uma versão da Bizz, focada para o mundo do Rock pesado oitentista, e tal meta deu-se por dois motivos básicos, quero crer:

1) A Bizz era uma publicação acintosamente fechada com o conceito do Pós-Punk, e dentro dessa diretriz, não escondia de ninguém que rezava pela cartilha niilista de 1977. Muito, mas muito mesmo a contragosto, as raras menções à artistas das décadas de 1960 e 1970, objeto do ódio desses xiitas, foram feitas com o apoio de poucos jornalistas não comprometidos com essa mentalidade, e que muito suaram para convencer a cúpula de sua redação, ao ceder poucas linhas sazonais para tais intervenções. Um desses raros abnegados foi justamente o jornalista, Leopoldo Rey.

2) O mundo oitentista teve três vertentes básicas:
A) Pós-Punk e os seus muitos derivados;
B) Pop, geralmente comprometido com a estética Pós-Punk, também e;
C) Hard-Rock/Heavy Metal.

Portanto, mesmo ao desprezar geralmente a opção C, por uma questão de mercado, estavam na prática a perder dinheiro por tentar ignorar tal vertente que não se coadunava com os seus princípios, e nesse quesito, a sua concorrente mais direta, a Revista Roll, abrira um razoável espaço para tais manifestações, e ainda em 1984, lançara uma revista derivada e especializada no mundo pesado, chamada: "Metal".

Ao considerar que a revista Rock Brigade (que privilegiava a cena do Hard-Heavy Metal oitentista), houvera crescido muito, entretanto, para o mundo editorial mainstream, ainda foi considerada um fanzine; a Som Três se mostrava híbrida e parecia não se importar em continuar a proceder assim, e revistas como: Rock Star e Rock Show detinham alcance muito inferior no mercado. Diante desse quadro editorial, Leopoldo finalmente deve ter convencido a redação da Bizz, de que a revista "Metal" estava a lhes roubar uma fatia do mercado, e gostar ou não daquela estética, não vinha ao caso quando o assunto era dinheiro...

Dessa forma, a editora Abril Cultural tratou por lançar a "Bizz Heavy", a evitar de propósito a palavra: "Metal", para não dar armas à concorrente e ainda bem para os marqueteiros de plantão, que tal vertente teve esse nome duplo em sua constituição...

Então, Leopoldo nos abordou com a proposta da nova revista, e uma entrevista, e convenhamos, naquele "momentum" sensacional em que nos encontrávamos, é claro que aceitamos de pronto, pois seria mais uma plataforma de exposição importante, e nessa somatória incrível, estávamos a subir de uma forma pela qual pareceu irreversível a nossa chegada ao mainstream.

No entanto, algo ocorreu no meio do caminho, especificamente a relembrar os bastidores dessa entrevista. Não por culpa do Leopoldo, que sempre foi um profissional íntegro ao extremo, mas por algum problema de pauta, a nossa entrevista foi adiada para a segunda edição, e não na primeira, como fora ventilado inicialmente. Tudo bem para nós, esperar um mês não causar-nos-ia nenhum prejuízo nesse sentido.

Nesse ínterim, nós recebemos a proposta de trabalharmos com o Studio V, e a perspectiva de conceder entrevista no ambiente do escritório de nossos empresários, deu-nos uma sensação ainda ainda melhor para nós.

No trato pessoal com o Leopoldo, assim como houvera sido com Tony Monteiro, não mudaria nada para nós, pois isso não nos deslumbraria, e ele era simpático conosco desde 1984, em situações bem mais modestas, portanto não havia chance dele achar que estávamos diferentes. Contudo, a situação sinalizara mudanças, e assim como o Tony Monteiro, ambos anteciparam a banda estava naquele processo excepcional de estar "a acontecer", o que aliás, é um ponto perigosíssimo para qualquer artista.

Então, recebemos o Leopoldo e fizemos uma longa entrevista, acompanhada pela Sonia, que não escondia a sua euforia, pois foi a segunda entrevista que concedíamos para uma outra revista importante no setor, e era absolutamente espontâneo, sem que o escritório tivesse movido uma palha para nos ajudar.

Todavia, Leopoldo nos falou ao final que um problema de última hora na redação, fez com que a nossa entrevista fosse deslocada para a terceira edição, já que um fato novo fez com que mudassem a pauta e a segunda edição teria uma entrevista com uma banda de Heavy-Metal extremo, que estava a começar a ser incensada internacionalmente, e essa novidade deveria ser capitalizada antes que a as revistas concorrentes, Metal e a Rock Brigade percebessem o fenômeno e o "furo".  Lembro-me até hoje do Leopoldo a nos pedir desculpas por mais essa postergação, mas que a pressão na redação pela mudança fora grande etc. e tal...
Dizia-nos então que lamentava, mas um grupo formado por garotos muito barulhentos, vindos de Minas Gerais, sairiam então no número dois da revista. O nome dessa banda: "Sepultura"...
Claro, sem problemas, pensamos. Estávamos a viver um momento tão bom, que poderia até ser benéfico sairmos publicados no número três, quiçá com o Studio V já a nos levar a algum lugar ainda mais alto e tal matéria saísse com um sabor a mais para nós.
Só que o número dois saiu com o grupo, Sepultura, e logo a seguir, a Bizz cancelou a sua versão pesada e portanto, a nossa entrevista foi para o ralo, nunca tendo sido publicada...        

A má vontade da cúpula da Bizz, prevaleceu por conta de comprometimento com a estética antagônica, a atropelar até o corporativismo da empresa que a sustentava, pois a concorrência continuou firme e forte por um bom tempo. 

A "Metal" ainda durou bastante nas bancas, e a Rock Brigade cresceu, para vir a se tornar posteriormente como o grande baluarte desse tipo de publicação especializada em Heavy-Metal, por muitos anos, inclusive a abrir caminho para o surgimento de outras publicações, que aliás, estas concorrentes existem até os dias atuais (2015), a provar que esse nicho detinha fôlego comercial sustentável, e assim comprovar a tese de que a extinção da revista "Bizz Heavy", fora por outras razões que não as comerciais, prioritariamente. Bem, em nosso caso, perdemos uma publicação, mas a euforia pelo "momentum" só se multiplicara...

Tínhamos mais propostas para shows e aparições na mídia e agora, esquentara o nosso relacionamento com o Studio V, e cabem muitas reflexões sobre esses dias de reuniões e euforia vividas dentro do casarão da Avenida Eusébio Matoso...

Continua...

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