Um
equívoco do jornalista que redigiu essa nota para o Guia do "Estadão", o
show estava marcado para o teatro e não para o "espaço de vidro", um salão
anexo da galeria... por que não prestam atenção nos releases que recebem?
O famoso
produtor musical e fonográfico, Luiz Carlos Calanca, dono da loja/gravadora, Baratos Afins, foi
curador de um espaço na Galeria Olido, no centro da cidade de São Paulo, ao lado das
Grandes Galerias, onde funcionava a Galeria do Rock.
Ali,
ele costumava promover shows triplos, uma vez por mês através de um espaço anexo
chamado: "Galeria de Vidro", um espaço no andar térreo do complexo, todo
envidraçado e que havia comunicação com a rua, no caso a esquina da
Avenida São João, com a Rua Dom José de Barros.
No entanto, a notícia que o Luiz deu-nos foi melhor ainda, pois ele havia conseguido a liberação do espaço maior, que consistia no teatro super bem conceituado e que outrora no mesmo espaço funcionara por muito tempo, o cinema Olido, clássico do centro da cidade de São Paulo em décadas remotas e passadas.
Ficamos
animados logicamente, por que o teatro possibilitava fazermos uma produção
muito mais caprichada, com som e iluminação de qualidade e sem a famigerada
aura de "balada" das casas noturnas, pois tocar em teatros foi o nosso ideal,
a nossa meta.
Contudo, nada foi perfeito e o Luiz foi logo a avisar-nos que a Secretaria Municipal de Cultura oferecia tudo, menos cachêt... seria portanto um típico "show de investimento de carreira".
Que decepcionante, eu ali perto de completar quarenta e nove anos de idade e a ter que ouvir e suportar essa balela, nessa idade... foi mesmo rir para não chorar, mas por outro lado, como veio da parte do Luiz Calanca, que não teve culpa alguma nessa dinâmica e tratava-se de um amigo de longa data, eu compreendi com tranquilidade.
Além do
mais, baseado em experiência próxima pregressa, tocar de graça, mas com
uma estrutura toda favorável, foi muito mais vantajoso para o Pedra do
que ir até Palmas, voar em quatro aeronaves em uma aventura tresloucada a se cumprir quase quatro mil Km's em dois dias e para apresentarmos um show de choque de meia hora, convenhamos...
Outro aspecto foi o de atrair público e mídia, portanto, fora a contumaz mania de se imaginar que o artista não precisa ganhar dinheiro, mas que deve agradecer por oportunidades para tocar (experimente falar para um técnico de som, que ele deve trabalhar a operar o áudio de um show, mas não vai ganhar cachê e a sua eventual recompensa será que as pessoas "reconheçam" o seu valor profissional e "um dia", vão te contratar, a pagar...).
Bem, o fato é que aceitamos fazer e fomos informados a posteriori que duas bandas tocariam também a compartilharem o espaço. Seriam estas: "Carro Bomba" e "Cavalo a Vapor". Conhecíamos as duas, o "Cavalo a Vapor" foi uma veterana banda de Hard-Rock egressa dos anos oitenta e que estava a voltar às atividades.
Sobre o Carro Bomba, esta mantinha uma história de proximidade conosco por conta da nossa ligação pessoal com Marcello Schevano e também pelo fato de termos interagido bastante em 2006, a compartilhar shows, conforme eu já relatei.
Tudo certo, fomos para o show e este espetáculo seria parte das festividades do "Dia Mundial do Rock". Particularmente acho isso mais uma bobagem inventada pelo comércio para alavancar vendas, tipo, "Dias das Mães", "Dia da Criança", "Natal", mas sem reclamações, se esse foi o mote, fomos em frente.
Chegamos
ao teatro no horário combinado e além dos nossos roadies, só teríamos
apoio do nosso iluminador, Wagner Molina, pois os nossos técnicos de som,
os dois Renatos, Carneiro e Sprada não poderiam auxiliar-nos nesse dia. O
jeito foi confiar no técnico da casa e mesmo ele sendo bom e
solícito, por não conhecer o trabalho da banda, claro que não foi o mesmo resultado de se poder contar com os nossos técnicos que conheciam bem o
trabalho.
Na porta do teatro, houve a presença de uma equipe de reportagem da Rede TV. Estavam a gravarem uma matéria na Galeria do Rock ao lado, com o mote do "Dia do Rock" e o próprio Calanca avisara-os que haveria um show de Rock no Teatro Olido.
Porém, os funcionários do teatro não haviam nem chegado para abri-lo e quando a equipe da TV percebeu que o processo para montar o palco e a ter condições de se filmar uma banda a tocar, demoraria pelo menos duas horas, desistiram. Infelizmente o repórter em questão fez um comentário bastante deselegante e desnecessário ao dirigir-se à sua equipe formada pelo cinegrafista e o iluminador, ao lhes falar: -"vamos embora, não vale a pena esperar tanto para filmar essas bandinhas"...
Ora, de
fato, as três bandas que apresentar-se-iam ali eram formadas por artistas alojados no patamar do
underground da música profissional, longe da badalação do mainstream e se ao menos uma fosse
minimamente conhecida nesse mundo maior, ele teria tido outra postura.
Tudo bem... não aparecíamos em programas populares, mas também não ficamos
chateados em não aparecer de forma anônima em um programa jornalístico e provavelmente com uma abordagem
desdenhosa e jocosa, a tratar-nos como retardados Rockeiros a fazer
"malocchio", caretas idiotas e constrangedoras para o vídeo e situação essa que para qualquer Ser Humano
que já ultrapassou a faixa etária dos dez anos de idade. se mostraria inadequada.
Um
lounge na ala dos camarins do Teatro Olido. Da esquerda para a direita:
Ivan Scartezini, Marcião Gonçalves, Luiz Domingues e Diogo Oliveira.
Foto de Grace Lagôa
Os
camarins do teatro eram amplos, mas bastante bagunçados, pois ali nos
dias úteis costumava ser usado para ensaios de diversas orquestras,
entre as quais a Jazz Sinfônica e a Orquestra Municipal de São Paulo,
além de diversos grupos de Ballet patrocinados pela Secretaria municipal de cultura.
Portanto, apesar de serem amplos e muitos em profusão, estavam abarrotados com instrumentos e peças de figurino desses artistas que ali ensaiavam costumeiramente.
O Luiz Calanca chegou ao ambiente e deu-nos a notícia de que o show não poderia passar das vinte horas, de forma alguma. Ora, como seria possível, se começaria às 18 horas e seria dividido entre três bandas, além do tempo perdido entre as três a fazerem as inevitáveis trocas de set up?
Ficou inviável, logicamente, mas nós combinamos sobre enxugarmos os respectivos set list das três
bandas, mas mesmo assim, uma catástrofe estrutural trataria de arruinar
toda essa boa vontade de todos nós ali reunidos. E eu logo comento sobre isso.
O clima no camarim foi ultra amistoso entre o Pedra e o Carro Bomba, fora a presença dos amigos em comum das duas bandas, que ali estiveram conosco, casos de Diogo Oliveira e Marcião Gonçalves.
Conhecíamos o guitarrista do Cavalo a Vapor, Luiz
Sacoman, muito gentil, mas os demais componentes da banda eram da sua
nova formação e não os conhecíamos.
Feito o soundcheck, achamos o som disperso pelo fato de haver pouca estrutura de monitoração e o palco ser enorme. De fato, ali ensaiavam e apresentavam-se orquestras sinfônicas. Contaram-nos que Jon Lord e Rick Wakeman usaram o palco desse teatro para ensaiarem as suas respectivas apresentações em edições recentes da Virada Cultural de São Paulo. O Jon Lord, foi uma questão de poucas semanas antes.
Rodrigo Hid em ação no Teatro Olido, em julho de 2009. Acervo de Fabiano Cruz
Sobre a
iluminação, apesar do Wagner Molina eatr ali pronto a comandá-la, não deu para esperar por sua costumeira
criatividade, pois ele não recebeu a devida cooperação da parte do técnico do teatro e de seus
assistentes para afinar os spots.
Pelo contrário, o rapaz colocou-se em uma posição infantil e amadora ao ficar melindrado pela presença do Molina, o que foi bastante surpreendente, pois muitos artistas chegam aos teatros para apresentarem-se (ou quaisquer outros espaços) e costumam trazerem consigo as suas respectivas equipes técnicas.
É praxe entre técnicos de som e iluminação,
que cooperem com colegas que trabalham de forma fixa com artistas, mesmo
por que, ninguém sabe operar melhor o som e a iluminação de um artista do que os
técnicos que trabalham exclusivamente com eles.
Enfim,
mesmo sendo tal tipo de atitude bastante amadorística da parte do rapaz,
acostumado a lidar com isso, Molina relevou a grosseria e fez o que pôde
para dar-nos uma iluminação boa, mesmo sendo longe do que ele normalmente
produzia como um grande e criativo profissional.
Pedra em ação no Teatro Olido em 2009. Acervo de Fabiano Cruz
Todavia, eu
antecipei-me, pois antes dos shows acontecerem, havíamos combinado uma
ordem de apresentação de comum acordo com todos, incluso o curador do
evento, Luiz Calanca.
Entretanto, um fato novo ocorreu e o pessoal do Cavalo Vapor pediu para tocar antes, a propor mudar-se a ordem. Tudo bem, não haveria por atrapalhar em tese, desde que não houvessem atrasos, pois o tempo estava milimétrico e qualquer vacilo de uma banda, prejudicaria as demais.
Então, ficou acertado que essa banda abriria, mas a faltarem poucos minutos o Luiz Sacoman disse-nos que o baixista da sua banda estava com um problema de atraso e demoraria alguns minutos para chegar ao teatro.
Naquele impasse, chegamos a cogitar mudar a ordem novamente e isso deveria ter sido feito efetivamente, mas ele insistiu que o rapaz estava a chegar e não haveria prejuízo às demais.
O Luiz era (é) um colega sério, de ótima índole e jamais pensaríamos que estaria a prejudicar o andamento do cronograma para tirar vantagem para a sua banda, de forma alguma. Contudo, na prática, já estava conturbado todo o planejamento.
Chegou-se em um ponto insuportável, com quase vinte minutos além das 18 horas e o rapaz da banda que faltava ainda não havia chegado. Já se tornara inviável trocar o set up para uma outra banda entrar e assim, sugerimos ao Luiz que a sua banda começasse imediatamente sem a presença do baixo na sua formação.
Foi uma medida horrível de se pedir para qualquer artista, entrar sem sua formação completa, mas não houve outra alternativa diante da perda de tempo.
O Cavalo a Vapor entrou e os seus membros estavam chateados com a pressão que o Luiz Calanca fez e admito, nós também exercemos, mas não foi nada pessoal, tampouco para atrapalhar a apresentação dessa banda. Infelizmente o tempo urgia e se houve um culpado nessa história, se bem que isso é muito relativo também, seria o baixista do Cavalo a Vapor, por atrasar em um compromisso de sua banda e se falar claramente, todos estavam ali na hora combinada do soundcheck, ou seja, muitas horas antes do espetáculo ter que começar.
Nós por exemplo, mobilizáramo-nos para estarmos ali por volta das doze horas. Contrariados, começaram a tocar sem o seu baixista. Este chegou lá pela terceira ou quarta música em que estavam tocar, e veio a correr pela plateia e com o seu baixo no "bag" às costas.
Com a banda a tocar, ele arrumou-se e assim que foi possível, passou a tocar junto. Fica o benefício da dúvida para o rapaz, pois pode ter tido problemas de locomoção, ou estava a vir de um compromisso, curso ou outra coisa qualquer, mas... que culpa tivemos sobre essa desorganização interna dessa banda em específico? E mais um dado, se nós ou o Carro Bomba tivéssemos tocado antes, nada disso teria ocorrido, teria sido tudo muito simples.
Quando encerrou-se o seu show, os rapazes entregaram-nos o palco com o tempo muito comprometido. Fizemos o possível para fazer a troca de set up a toque de caixa e cortamos algumas músicas do nosso set list.
O som
estava disperso como eu já comentei, mas ao assistir nos vídeos, a mixagem do
PA foi razoável para o público e deve ter existido uma boa pressão sonora.
Eu, Luiz Domingues a atuar com o Pedra no Teatro Olido, em julho de 2009. Acervo de Fabiano Cruz
Tocamos uma seleção de canções a misturar o material dos nossos dois discos e algumas músicas novas que já estávamos a incorporar aos shows.
Em dado
instante, vimos o pessoal do Carro Bomba na coxia e o Luiz Calanca
a sinalizar-nos para encerrarmos imediatamente.
O Xando viu a sinalização e anunciou que
faríamos a última música, a cortar ainda mais, mas nesse ínterim, eu vi o
vocalista do Carro Bomba, Rogério Fernandes a chamar-me perto do
meu amplificador. Fui até ali, e ele disse-me para fazermos o nosso show até o
fim, que eles já haviam desistido de tocar...
De fato, até trocarmos o set up, eles seriam forçados a fazer um show de dez minutos, abaixo do padrão de um show de choque.
"O Dito Popular", com menção a "Papa Was A Rolling Stone", no Teatro Olido em 11 de julho de 2009
https://www.youtube.com/watch?v=VJ8kxB45BWA
Lastimável a situação, eu fiquei muito envergonhado ali naquele momento, embora a culpa não fosse minha ou da minha banda, diretamente.
"Rock'n Não" no Teatro Olido em 11 de julho de 2009
Eis o Link para assistir no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=oWai3hydrEs
Eu comuniquei então para
o Xando que nós deviríamos tocar o show para frente e então, sob uma atitude simpática, ele, Xando,
chamou Rogério Fernandes e Marcello Schevano no palco para tocarmos
juntos em um
improviso e ali explicou-se ao público que o tempo havia estourado e o
show do Carro Bomba estava cancelado.
Alguns fãs específicos do Carro Bomba, que estavam na plateia, aborreceram-se, reclamaram acintosamente e é claro que eles tiveram razão para contrariarem-se.
Então, o Luiz Calanca surgiu no palco e a pedir desculpas pelo ocorrido, prometeu que em uma nova edição desse show mensal, o Carro Bomba tocaria isoladamente, sem compartilhar o palco com outras bandas e assim a recuperar o seu prejuízo dessa noite.
De fato, eu soube que isso ocorreu mesmo, tempos depois e não
surpreendi-me, pois conheço o caráter do Calanca, um amigo do bem, e ele ficara muito chateado pelo ocorrido, por ser o curador do evento.
Em suma, três bandas a atuarem em um tempo exíguo não foi viável. E dali em diante o Calanca passou a marcar somente duas bandas em seu evento mensal, ou seja, um pouco melhor.
Se eu fosse o curador desse
teatro, marcaria uma apenas, para reduzir a zero a possibilidade de
constranger o artista no palco com pedidos para se reduzir o show,
a atormentá-los com sinalizações vindas da coxia!
Leia uma resenha desse show escrita pelo jornalista Fabiano Cruz, para o Blog Alquimia Rock Club:
http://www.alquimiarockclub.com.br/resenhas/570/
Apesar dos
pesares, a pensar no Pedra, acho que foi um bom show e se levar em
consideração o famigerado argumento falacioso do "investimento de
carreira", claro que nada mudou na nossa vida doravante, a não ser
o acréscimo de alguns vídeos postados no YouTube, em que aparecemos mediante um palco imponente retrata-nos
com uma dignidade artística assegurada.
Pedra no Teatro Olido em julho de 2009.Foto : Grace Lagôa
Aconteceu no dia 11 de julho de 2009, um sábado, no Teatro da Galeria Olido, na avenida São João, centro de São Paulo.
A lamentar-se a baixa frequência de público. Em um sábado a tarde, com ingresso gratuito, por que apenas cem pessoas dignaram-se a comparecerem ao Teatro Olido para ver três shows, em plena Avenida São João, com duas estações de metrô muito próximas, ônibus para todos os lados e tempo bom?
Depois ficam com lamúrias nas Redes Sociais, a reclamarem que as bandas acabam. E por acaso esses que reclamam, prestigiam-nas para que isso não ocorra?
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