Pelo caminho, ficamos bastante admirados por ver que na encosta da estrada haviam muitas propriedades rurais cuja atividade principal era a suinocultura e quase todas, para não dizer todas, ostentavam placas explicativas a dar conta que sua produção destinava-se a fornecer para indústrias frigoríficas renomadas nacionalmente, e situadas na região de Chapecó. Realmente era (é) a base da pujança daquela cidade do oeste catarinense e de toda a região.
Quando chegamos na cidade, fomos direto ao pavilhão onde realizar-se-ia o Festival Sonora 2004, em que aliás, éramos uma das atrações. Seríamos o sub "Headliner" da noite, com a presença de uma banda "estourada" no mainstream e que era muitíssimo antagônica aos nossos ideais, princípios & estética.Tratava-se dos skatistas do Charlie Brown Junior, e o seu conceito deturpado do que era o Rock.
Enfim, essa era a dura realidade de se conviver com uma difusão cultural equivocada, caso do Brasil, e para nós Rockers outsiders dentro do que se habituou a chamar de "Rock" desde os anos oitenta, foi bem desconfortável conviver com tais distorções históricas e inversão total de valores.
Não tenho e nunca tive nada contra os componentes da banda citada e não haveria motivo algum para falar mal dos rapazes na época, e muito menos agora, tantos anos depois, e com dois de seus integrantes já a morarem em outra dimensão, contudo, o choque estético foi institucional, naturalmente.
Chegamos ao local do show, verificamos que haviam dois palcos, e ao conversarmos com membros da produção local, soubemos que a montagem do segundo palco fora exigência da produção da banda dos skatistas, pois estes recusavam-se a usar o mesmo palco das demais atrações e sobretudo, o mesmo PA. Isento tal soberba da parte dos rapazes em si, e creio ter sido uma ação da sua equipe, no afã de valorizar seu o produto ao máximo e para conferir-lhe uma exclusividade, com o uso de seu equipamento próprio etc. e tal.
Acostumados a lidar com tal tipo de estrelismo, relevamos e nos concentramos na nossa órbita, ao fazermos o soundcheck e neste caso, o equipamento do palco menor, era de extrema qualidade, com uma pressão para suportar mega festival de estádio de futebol, portanto, não tivemos queixas.
Já com nosso backline no palco e ao ouvirmos o técnico a fazer os primeiros testes preliminares de bateria, lembro-me de estarmos dentro do ônibus e o som do bumbo fez a nosso carro trepidar. Foi uma pressão sonora impressionante e por alguns segundos, achamos que quebraria todas as vidraças do nosso carro.
Feito o soundcheck, fomos levados para o hotel e após o jantar, tivemos uma atividade ligada ao festival, antes do nosso show. Um entrevista ao vivo promovida pelos organizadores que queriam que eu e Junior participássemos. Fiquei impressionado com a reverência com a qual fomos tratados, ao entrarmos em um galpão de grande proporção e ao vermos uma quantidade grande de pessoas, visto que foi uma entrevista aberta ao público em geral.
Havia um mediador a fazer as vezes de um assessor de imprensa e muitos jornalistas da imprensa da cidade e de localidades vizinhas ali presentes.
Quando entramos no galpão, muitos gritos irromperam da parte do público, o que nos surpreendeu muito, pois esperávamos uma entrevista comedida para três ou quatro jornalistas e sem presença de público. Por tal cenário, tivemos que nos comunicar com microfones, a fazermos uso de um pequeno PA disponibilizado para a coletiva.
Bem, as perguntas não surpreenderam e ficaram dentro do trivial sobre a carreira da banda e o panorama do show business. Só achei um pouco demasiado quando insistiram para que falássemos "mal" da banda dos skatistas, que fecharia o festival naquela noite, e de fato, havia uma revolta na cidade, conforme verificamos assim que olhamos o jornal local no hotel, que dava conta em uma reportagem de que havia uma denúncia de super faturamento dos custos do Festival, perpetrados por um político local, provavelmente alguém ligado à secretaria de cultura da prefeitura, e parecia que um vereador também estava envolvido na falcatrua.
Segundo a reportagem do jornal e pelas conversas das pessoas na entrevista, a banda dos skatistas fazia parte da falcatrua, ao apresentar um cachê declarado de um valor e na realidade, por baixo do pano fora um outro montante e sob um patamar milionário. Queriam que nós entrássemos nesse mérito a emitir opinião, mas como isso seria possível?
Sem provas concretas, sem evidências... e além do mais, mesmo que fosse verdade, duvido que os componentes da banda tivessem ciência do imbróglio, portanto, qualquer declaração nossa nesse sentido, seria no mínimo, leviana.
Claro que não falamos mal dos rapazes por conta disso, mas pessoas da plateia ficaram bem alteradas e se manifestaram contra os skatistas, no entanto, nada poderíamos fazer para conter tais ânimos acirrados. Foi a hora de ir para o show, a última banda local ainda tocava quando fomos conduzidos ao camarim improvisado, próximo ao palco.
Continua...
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